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Branco pode ter nome indígena?

Pessoas brancas devem aprender a escutar os povos indígenas, respeitar nossa cultura, entender que para a gente nome é algo sagrado

26 jul 2022 - 05h00
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Nome não é algo físico, ele traz consigo muita história, espíritos e significado
Nome não é algo físico, ele traz consigo muita história, espíritos e significado
Foto: Reprodução/Instagram

Essa é uma pergunta recorrente que não-indígenas fazem para indígenas e eu poderia responder falando sobre dados e estatísticas, poderia escrever de forma acadêmica e deixar uma resposta que travaria uma batalha na cultura de cancelamentos, mas escrevo aqui para além da academia. Eu coloco nessas linhas minha narrativa, observações e escutas, escrevo escutas com s, no plural, pois não existe um povo indígena e sim povos indígenas e isso já traz consigo muitas narrativas.

Mas vamos lá! Venha comigo para 1998.

Quando eu estava na escola era normal os nomes como Maria, José, Pedro e João, que sempre nos faziam lembrar da bíblia pois, a maioria dos alunos da sala de aula tinham pais evangélicos e católicos. O nome e sobrenome passava uma mensagem sobre crença e classe. Lembro até hoje de uma aluna nova que se chamava Gabriele (mais um nome bem difícil) e todos já falavam que ela era a "riquinha da escola".

E o ano 2000 chegou e eu conheci pessoas com nomes indígenas, Cauê, Cauã, Caíque e daí por diante... alguns diziam “nome de índio” e outros negavam e inventavam histórias estrangeiras para apagar até mesmo a origem do nome.

Brasileiros foram ensinados a ter vergonha de suas origens principalmente aqueles identificados como tendo “cara de índio”. O embranquecimento também chegou através dos nomes e sobrenomes, indígenas foram sequestrados e além de perderem sua liberdade, também tiravam seus nomes e os batizavam com nomes europeus.

Hoje ainda existe uma batalha para que indígenas tenham de volta seu nome, identidade e cultura respeitadas. Tudo que pertence aos povos indígenas sempre foi roubado, copiado ou vendido como algo exótico e selvagem, tirando nomes e humanidade.

Aprendi com o povo Guarani Mbya que nome é algo sagrado, eu fui batizada como Katu Mirim pelo povo Guarani Mbya e meu nome tem regido os meus caminhos e me feito nunca esquecer de quem eu sou. O povo Guarani Mbya também batiza pessoas que não são indígenas, porém, não é qualquer um, não é um drive-true onde você chega e recebe um nome, é um momento de união para quem respeita a cultura, os povos, a natureza, para quem é aliado da causa indígena, como Wera me disse uma vez: “Quem dá o nome é Nhanderu, ele escolhe e conhece o coração”.

Também conheci povos que não autorizam pessoas não indígenas a utilizar o nome, pois ele tem significado de acordo com a cosmo visão desse povo.

O nome não é algo físico, ele traz consigo muita história, espíritos e significados. O que as coisas significam é algo que a cultura ocidental parece não buscar. Aquilo que um branco diz ser bonito, acaba sendo regra. 

Valentina, Enzo, Gael, Zaion, Charles e Vitoria. Nomes da moda, onde muitos pais nem sabem o significado, apenas acharam bonito. Bonito? Falando em bonito... Muitos indígenas são vistos como estranhos e feios para os não indígenas esvaziando tudo o que ele significa, retirando a beleza dele pois o mesmo não está nos outdoors. Então, se me perguntam se brancos podem ter nome indígena eu respondo do meu lugar: Brancos devem aprender a escutar os povos indígenas, respeitar nossa cultura, entender que para a gente nome é algo sagrado. Se o branco quer colocar um nome originário no seu filho, não sou eu que vou impedir.

Só não se esqueçam que alguns nomes são curas e outros não.... na dúvida, pense bem sobre identidade, honra e respeito. Nós indígenas ainda estamos lutando por nossos nomes, alguns não podem ter o nome do seu povo no registro de nascimento, mas os brancos podem.

Fonte: Redação Nós
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