Carro elétrico na vida real: o que você precisa saber antes de comprar um
Cuidados com bateria, rotina de recarga, reparabilidade, custos e manutenção mais barata; entenda os principais pontos
Mais e mais pessoas estão optando por um veículo elétrico atualmente, mas muitos ainda tem dúvidas sobre adentrar este universo automotivo. Pensando nisso, separamos alguns tópicos a respeito do mundo do carro movido a bateria, para ajudar aqueles interessados na primeira compra.
Consultamos especialistas de diversas áreas, entre temas que vão desde baterias, autonomia e até mesmo valor de revenda, seja para quem quer vender ou embarcar num modelo usado, por exemplo. Confira nosso guia abaixo.
Baterias
Um dos principais motivos de preocupação, e para alguns até um temor (se tratando de um usado, por exemplo) é a bateria. Modelos elétricos puros (BEV) são movidos inteiramente por elas, então dependem de peças que podem perder eficiência com o tempo. Na opinião de Clemente Gauer, Diretor e membro do conselho da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), ter a bateria como um "inimigo" é coisa do passado.
"O maior medo de todos, a bateria, deixou de ser um problema. Sua longevidade costuma superar uma década de uso intenso, superando motores e transmissões dos a combustão. As montadoras oferecem, no mínimo, 8 anos ou 160 mil km de garantia contra degradação e defeitos — um evidente sinal de que a vida útil real vai além; estudos de Stanford e relatos de proprietários (inclusive dos primeiros Teslas) indicam até 20 anos", afirma.
Entretanto, "nem tudo são flores", diz o diretor. Quem busca por um modelo elétrico, algo que já é realidade, alguns cuidados são importantes. "Ao comprar um elétrico usado, verifique as revisões e peça um laudo de saúde da bateria (SoH) se o carro tiver mais de 8 anos ou cerca de 300 mil km", conclui.
Autonomia e pontos de recarga
Diretamente ligado à bateria e fatores como a própria maneira como se dirige, a autonomia de um carro elétrico é outro fator que pode assustar marinheiros de primeira viagem no mundo dos EVs. Segundo Carlos Augusto Serra Roma, Diretor do técnico da ABVE, considerar vantagens como a praticidade da recarga em casa (quando se tem um wallbox/eletroposto), o menor preço de reabastecimento e a chance nula de adulteração do "combustível", dificilmente se decide voltar para a combustão.
Contudo, nem tudo no universo elétrico é colorido. Para o futuro proprietário de um elétrico que more em um prédio, às vezes a obtenção de um wallbox pode ser um problema. Há casos, como em São Paulo, onde as exigências do Corpo de Bombeiros praticamente inviabilizam a instalação do aparelho de recarga, por exemplo.
Além disso, outra preocupação é a malha de recarga pública. Carlos Augusto comenta que, apesar da lenta melhora, a situação desse quesito está melhorando. "Hoje, o país conta com cerca de 16 mil pontos públicos e semipúblicos de recarga, distribuídos em quase 1.500 municípios. Desse total, a maioria ainda é de recarga lenta (AC), mas a boa notícia é que o número de carregadores rápidos (DC) vem aumentando rapidamente, e será justamente essa infraestrutura de alta potência nas rodovias que mais crescerá nos próximos anos, viabilizando viagens longas e conectando regiões do país", afirma.
Por fim, o diretor explica que há uma solução para aqueles que desejam algum nível de eletrificação, sem necessariamente viver a completa experiência elétrica. "Para quem ainda sente insegurança em dar o salto direto para o elétrico puro, os híbridos plug-in (PHEV) são uma excelente ponte: combinam os dois mundos, você pode rodar no modo 100% elétrico na cidade, e no modo híbrido se viajar para longe", conclui.
Valor de Revenda
Por serem novidade em um mercado ainda dominado por modelos a combustão, é normal desconhecer a respeito da receptividade dos elétricos na hora da revenda. Para Marcelo Barros, diretor-geral da Autorola, o receio do mercado com EVs tem se mostrado baixo.
Por conta da alta demanda por modelos elétricos, o mercado de segunda mão tem sido mais considerado. Fatores como a acessibilidade da compra (considerando modelos até os R$ 150 mil), o baixo índice de manutenção e a baixa desvalorização frente a modelos a combustão movimenta o público, explica Barros.
Contudo, a "boa onda" da baixa desvalorização é reservada somente aos modelos de entrada, relembra o executivo da Autorola. "Se levarmos em conta modelos elétricos premium, o universo da desvalorização ainda é uma incógnita, e pode resultar em perdas significativas em um ano de uso, algo que não acontece com elétricos mais baratos", afirma. A alta rotatividade de elétricos de entrada no mercado de usados ajuda a explicar, por exemplo.
Custo de manutenção e reparabilidade
Quando se fala em custo de manutenção, o tema vira uma faca de dois gumes. Embora elétricos tenham a vantagem de possuírem menos partes móveis do que seu "rival" a combustão, o custo de peças e a falta de profissionais qualificados, ainda mais fora dos concessionários, podem ser problemas consideráveis.
"Os veículos 100% elétricos (BEV) costumam ter manutenção preventiva cerca de 15% mais barata do que os modelos a combustão (ICE), já que possuem menos componentes — não há troca de óleo, filtros ou velas, por exemplo. No entanto, apesar dessa economia, os elétricos ainda enfrentam desafios estruturais relevantes, como a dificuldade de encontrar peças e redes de atendimento na reposição independente. Em contrapartida, os motores a combustão contam com uma ampla rede de assistência, composta por mais de 101 mil oficinas mecânicas espalhadas pelo Brasil", explica Danilo Fraga, da Fraga Consultoria.
Entretanto, a coisa muda de figura quando se fala em manutenção corretiva, por exemplo. "Nesse ponto, os custos dos elétricos se tornam muito mais elevados: a bateria de alta voltagem pode custar entre R$ 23 mil e R$ 65 mil, com vida útil estimada em cerca de 15 anos. Já um motor a combustão pode ser retificado por valores entre R$ 2,5 mil e R$ 12 mil e tende a durar até 20 anos. Assim, embora o carro elétrico proporcione economia anual na manutenção preventiva, uma eventual troca da bateria pode anular rapidamente essa vantagem, representando um custo de reparo expressivo para o consumidor", conclui o consultor.
Acidentes
Assim como qualquer carro, seja elétrico ou gasolina, acidentes podem acontecer. Respondida a questão acerca da reparabilidade (acima), um medo ainda persiste na compra de um elétrico: incêndios. Não são incomuns os relatos mundo afora de EVs que pegam fogo, levando o público a acreditar que sejam mais suscetíveis a tal. Deveria o futuro proprietário de um elétrico levar isso em conta?
Wanderlei Marinho, do comitê de Veículos Elétricos e Híbridos da SAE Brasil afirma haver pouco com o que se preocupar. "Modelos elétricos tem poucas partes mecânicas em comum com modelos a combustão, resultando em uma manutenção mais simples. Além disso, são muito seguros, ao disporem de sistemas de segurança feitos para garantir a segurança da bateria em caso de acidentes", explica. "Além disso, os modelos mais novos geralmente são equipados com os demais sistemas de segurança, como ADAS, de modelos a combustão, colocando-os em pé de igualdade", conclui.
Experiência de condução
Nesta parte, entra a opinião do repórter que vos fala. Como usuário e avaliador de modelos a combustão, dirigir um elétrico é sempre uma experiência diferente, seja pela completa ausência do barulho do motor, ou da entrega do torque instantâneo, sempre a 0 rpm. No geral, a maior diferença é a condução tranquila, sem os sons e tremores de um motor comum.
Apesar de pacífica, o convívio com um elétrico requer atenção. Por conduzir um veículo que não emite sons além da rodagem dos pneus (considerando elétricos sem barulho de rodagem), pedestres e até outros carros podem não perceber sua presença, sendo necessário redobrar a atenção.
Além disso, algumas pessoas podem sentir-se nauseadas por conta da ausência de ruído enquanto o veículo se move, bem como a falta de costume com a força do torque instantâneo ou da freagem regenerativa, por exemplo.
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