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20 anos de Silent Hill 2: o impacto do game 2 décadas depois

24 de setembro marca o aniversário de 20 anos do lendário Silent Hill 2; qual foi seu legado?

24 set 2021 - 17h42
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Foto: TheL0nelywolf, DeviantArt

Um espelho sujo e lascado reflete o olhar melancólico, quase ausente, de um homem nos seus quarenta e poucos anos. Seu cabelo loiro escuro, desbotado, faz o casamento perfeito com uma jaqueta esverdeada surrada, como uma armadura de esmeralda negligenciada. O mundo parece envolto numa névoa, mas será ela fruto da condensação da água evaporada ou das dúvidas angustiantes relatadas por aquele olhar abatido?

Foi dessa maneira, há 20 anos, que os primeiros jogadores de Silent Hill 2 entraram em contato com o protagonista misterioso do jogo, James Sunderland. Aos veteranos que se aventuraram com Harry Mason no primeiro jogo, o anseio era justamente continuar sua história; ora, quem era aquele homem esquisito e miserável na frente do espelho? Pouco depois, entretanto, ficou claro que essa personagem conquistaria seu espaço não só na franquia, mas também no coração de todos os jogadores do PlayStation 2.

E, sobre personagens, é importante mencionar uma das características fundamentais do título aniversariante: a atenção dada à profundidade de todos os que aparecem em Silent Hill 2. Já foi mencionado em outros textos, como naquele sobre a psicologia do jogo, mas vale ressaltar novamente que, além do círculo de personalidades encontrado pelo protagonista, a própria cidade é uma personagem, mais do que uma mera ambientação.

Isso é especialmente verdadeiro em Silent Hill 2, que apresenta um pouco da história da “metrópole” sombria. Inclusive, apesar do status de stand-alone do título, ou seja, da sua independência em relação à trama dos outros jogos, esse plano de fundo expande bastante as raízes daquela que se tornou um símbolo dos jogos de terror. E, justamente por causa disso, muitas pessoas buscaram entender mais sobre a franquia.

Silent Hill 2 envelheceu bem?

Foto: Reprodução

O jogo foi revolucionário no ramo dos survival horror lá no distante ano de 2002, mas será que, ao pegá-lo para jogar AGORA, 24 de setembro de 2021, 20 anos depois do lançamento, ele consegue prender a atenção do jogador? Difícil dizer, dado que ele ressoa de maneira diferente para cada um, mas uma coisa é certa: a jogabilidade é um ponto um pouco complexo de se analisar, dado que ela segue aquele modelo de câmera curioso que jogos do PlayStation 2 usavam como padrão, como Resident Evil, Parasite Eve etc.

Para audiências mais novas, isso significa não haver muita ação, e, ainda mais, até um pouco de tédio. Na época, isso foi tranquilamente sobreposto por uma atmosfera absurda e macabra, monstros grotescos e uma dificuldade de combate que acabou combinando muito bem com as limitações técnicas. Hoje, entretanto, é necessário pensar nesse tipo de interação com um pouco mais de cautela, dado que, como diz a expressão idiomática, não é para todo mundo. Se você está acostumado às explorações mais dinâmicas de, digamos, Control, não pense que essa mesma tática vai se aplicar a um jogo de 2001.

O ponto que continua forte desde então é a narrativa. Poucos jogos, mesmo hoje, são capazes de entregar uma jornada tão profunda e intimista quanto Silent Hill 2, seja do próprio James Sunderland ou de outras personagens que ele encontra na cidade. Uma pequena consideração, nesse caso, é que a cidade homônima toma formas diferentes conforme os traumas enfrentados por essas personagens, o que garante uma diversidade de sagacidade psicológica bem ampla, mesmo atualmente.

Temas e atualidade

Foto: Reprodução

Saúde mental sempre foi uma espécie de tabu na sociedade, seja essa sociedade oriental ou ocidental. As coisas melhoraram um pouco nos últimos anos, felizmente, mas ainda estamos muito distantes de um cenário ideal. Basta fazer uma visita ao pronto-socorro psiquiátrico mais próximo e qualquer um poderá ver um show de horrores, com pessoas, às vezes até os próprios médicos, tratando depressão como frescura e ansiedade como falta de trabalho. No universo gamer, então, nem se fala.

Silent Hill 2, já há 20 anos, buscou lidar com alguns desses problemas. Naturalmente, James vai descobrindo o que ele fez com sua esposa doente, lembrança tão traumática que foi necessário ir até à cidade sombria para que seu subconsciente o relembrasse. Suicídio é uma temática constante também, seja num dos finais, no futuro da personagem Angela ou mesmo na batalha contra o famigerado Pyramid Head. Nada disso é tratado de forma muito explícita — com exceção da já mencionada batalha —, cabendo ao jogador pegar as sutilezas apresentadas na narrativa por meio de diálogos e compreender o que, de fato, acontece com cada um.

A experiência já seria digna só por isso, certo? Ainda que tenha o problema dos controles datados, o resto do jogo colabora para que esse não seja um empecilho tão grande, quase como uma visão do futuro da série. Ora, sem novos jogos há anos, Silent Hill, infelizmente, precisa viver do seu passado. Mesmo assim, podemos agradecer pelo que já nos foi apresentado, dado que são experiências únicas e bastante significativas, que podem, inclusive, nos ajudar a ver um pouco de outras realidades. O que são alguns controles antigos perto disso?

Horror psicológico

Foto: Reprodução

A classificação não foi inventada com o jogo, mas ganhou uma relíquia bastante promissora. Horror psicológico já existia bem antes de Silent Hill 2, seja com filmes, séries ou livros — o gênero se adaptou ao longo dos séculos, podendo ser visto, por exemplo, nas narrativas góticas inglesas do final do século dezoito. Talvez o que o caracterize seja justamente o uso constante do receio do “outro”, do desconhecido.

Sob outro prisma, entretanto, podemos usar o clássico ensaio freudiano Das Unheimliche, ou, como é normalmente traduzido, O Inquietante. De modo breve e sem muitas enrolações acadêmicas, podemos dizer que essa concepção do inquietante deriva de uma suspeita, ou melhor, uma paranoia do próprio indivíduo acerca de algo que, ao mesmo tempo em que lhe é familiar, lhe causa ojeriza, repulsa. Essa sensação, ao escalar, pode causar o que conhecemos como terror e, em casos extremos, leva à insanidade e, eventualmente, à morte.

Freud também menciona que, muitas vezes, o que se compreende como o inquietante é o retorno do que foi reprimido, principalmente, mas não só, em nossa infância. Ora, um trauma completamente devastador, como matar a própria esposa doente de modo a poupá-la do sofrimento, paralelamente ao fato do assassino tentar se poupar do sofrimento de vê-la partir e definhar, é, no mínimo, digno de ser reprimido. Não à toa, James deseja, em seu subconsciente, ser punido — o que, na cidade de Silent Hill, é materializado na forma dos Pyramid Head.

Conclusão

Silent Hill 2 mostrou aos jogadores como a psicologia e a psicanálise pode ser empregada em jogos, mas, acima de tudo, mostrou como é possível humanizar personagens de tal modo que, 20 anos depois, muitos de nós ainda choramos ao ouvir a leitura da carta de Mary, esposa de James Sunderland em Silent Hill 2.

É uma pena que não tenhamos mais jogos da mesma franquia que consigam gerar o mesmo impacto ou, então, que analisem a psiquê humana tão bem. Quem sabe, um dia, a Konami decida nos tirar do sofrimento ininterrupto, não é? E, por falar em sofrimento, fica a leitura da dita carta para os curiosos logo abaixo.

Fonte: Game On
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