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Serginho: leia 9 depoimentos de pessoas que viram a tragédia

27 out 2014 - 08h33
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O dia era 27 de outubro de 2004. Fazia frio em uma quarta-feira à noite paulistana. No Morumbi, São Paulo e São Caetano se enfrentavam perante público regular no Morumbi, em duelo direto pelas primeiras posições do Campeonato Brasileiro. A história daquela partida, contudo, seria outra: aos 14min do segundo tempo, o zagueiro Serginho cairia no gramado com uma parada cardiorrespiratória e nunca mais levantaria. Passados 10 anos da tragédia, o Terra buscou testemunhos de pessoas que vivenciaram o drama e ficaram ligados ao momento.

Uma década inteira se passou desde aquele dia sombrio para o futebol brasileiro, mas a memória ainda está fresca em quem viu ou sofreu com a morte do zagueiro do São Caetano. No Morumbi ou fora dele, a morte de Serginho abalou amigos, jogadores, seja companheiros ou adversários, médicos, jornalistas e torcedores.

Confira 9 depoimentos de quem vivenciou a tragédia de Serginho:

“Fiquei noites sem dormir” - Cicinho, então lateral do São Paulo

Cicinho era um dos destaques do São Paulo em 2004
Cicinho era um dos destaques do São Paulo em 2004
Foto: Djalma Vassão / Gazeta Press

“As lembranças não são boas. Foi uma fatalidade, ele caiu perto da perna do Grafite e achamos que o cotovelo do Grafite tinha pegado nele. Daí, o Dininho (zagueiro do São Caetano) e o Silvio Luiz (goleiro do São Caetano) viram e começamos a gritar pedindo atendimento. Quando cheguei lá, ele já estava com os lábios brancos e não respirava mais. O doutor Sanchez (médico do São Paulo), quando chegou lá, falou que era uma parada cardíaca e que só um milagre poderia salvar o Serginho.

Foi um jogo que faltavam 30 minutos para acabar. Quando ele foi para a ambulância, todos nós fomos para o meio-de-campo, no grande círculo, e começamos a orar e pedir a intervenção divina. Eu fui para casa, morava no CT do São Paulo, e neste dia eu nem consegui dormir. Fiquei noites sem dormir. Tivemos na sequência uma palestra com o Abílio Diniz falando sobre acontecimentos e dificuldades que acontecem na vida da gente.

Foi a situação mais complicada, inusitada e trágica da minha carreira. Era um jogador que todos respeitavam, não falavam nada de mal, um exemplo, mas infelizmente aconteceu.

Jogar a partida remarcada lembro que foram 30 minutos, muitos gols (acabou 4 a 2 para o São Paulo), mas nada agradável. A gente ficava se perguntando no vestiário o que o Serginho estava fazendo antes do jogo quando ele faleceu, o que aconteceu no vestiário. Foi triste e lamentável”.

“Abalou todas as estruturas” – Fabrício Carvalho, então atacante do São Caetano

Fabrício Carvalho estava em campo no fatídico 27 de outubro
Fabrício Carvalho estava em campo no fatídico 27 de outubro
Foto: Djalma Vassão / Gazeta Press

“Lembro-me com muita tristeza, algo que nunca tinha presenciado e chocou todo mundo. O jogo estava sendo televisionado e é um caso que ficou em muita evidência na época da forma que foi e a gente, que vinha de um titulo inesquecível do São Caetano (Campeonato Paulista de 2004), de repente sofre um baque como esse. Aquilo abalou todas as estruturas, o São Caetano creio que abalou até hoje. A tragédia chocou nossa equipe, perdemos 24 pontos, Passou muito rápido, parece algo recente. Lembro com bastante tristeza, era uma pessoa exemplar, dedicada, uma pessoa muito boa.

Recebemos no ônibus a notícia que ele havia morrido, saindo do estádio. Um grupo que tinha feito história, o ambiente era formidável. Foi chocante para o grupo receber uma notícia dessa, foi difícil terminar o campeonato aquele ano. Também não foi fácil depois voltar ao estádio do São Caetano, lembrar que horas antes ele (Serginho) estava ali com a gente“.

“Lembro de cada detalhe” – Marco Aurélio Cunha, então diretor do São Paulo

Marco Aurélio Cunha conversa durante eleição do São Paulo
Marco Aurélio Cunha conversa durante eleição do São Paulo
Foto: Ricardo Matsukawa / Terra

“Eu lembro de cada detalhe do que ocorreu com o Serginho. Era uma noite muito fria, assisti ao primeiro tempo das cativas. Com o frio e o vento, desci para o vestiário do São Paulo, que fica no Morumbi praticamente ao lado do posto médico. Quando eu vi pela TV ele caindo, vi a forma que ocorreu, pelo close que a câmera deu, eu já vi que era grave e entendi até que era uma parada cardíaca.

Saí correndo, fui ao posto médico, alertei que deveria ter algo grave acontecendo. Entrei correndo pela beirada do campo, fui até a ambulância, bati no vidro, o motorista e o auxiliar ficavam fora dela porque a federação assim exigia, e fui até a beirada do campo quando ele já era trazido, tentando ser reanimado pelo massagista (Itamar) e pelo médico Paulo Forte (do São Caetano) e com o Dr. Sanchez (José Sanchez, médico do São Paulo) do lado dele para dar o apoio necessário.

O Serginho saiu do lado do campo, foi até a ambulância com a porta já aberta e lá se iniciou o atendimento. Ele foi levado até o ambulatório, lá tentou a reanimação, pelo que entendi ali tinha uma parada muito grave. Senti que ele não apresentava nenhuma reação. Então foi removido para o  Hospital São Luiz.

Eu creio que foi a situação mais complicada que eu já vivi no futebol porque morte súbita no campo de futebol talvez seja o caso mais triste e impotente que um médico possa ter. Às vezes a fratura, fratura exposta, lesão grave de um atleta, é muito dramática, mas ali o choque de você ver uma pessoa morrer é com certeza o maior”.

“Achei que era cera” – Adriano Guilherme, torcedor do São Paulo

Foto: Friedemann Vogel / Getty Images

“Era um jogo muito chato até então, estava 0 a 0. O São Paulo era freguês do São Caetano na época, se não me engano. Era Campeonato Brasileiro, em um meio de semana à noite.  Eu estava na arquibancada azul e o caso foi à esquerda, no gol da piscina, contrário ao portão principal. Estava rolando o jogo, o cara cai no gramado e eu achei que era cera porque o São Paulo precisava ganhar o jogo. Aí o Grafite sinaliza para alguém desesperado, aí o goleiro do São Caetano (Silvio Luiz) também começa a fazer vários gestos desesperados, mas até aí ninguém sabia o que aconteceu.

Eu estava sem rádio, não tinha celular com internet naquela época. A única forma de acompanhar era escutar no rádio e eu não tinha esse costume. Aí ninguém sabia de nada. Na arquibancada todo mundo ficava perguntando um para o outro o que aconteceu e todo mundo queria que o jogo voltasse. Que fosse substituído e a partida continuasse.

Aí via os jogadores saindo (de perto do Serginho), não dava para ver se chorando ou não e ficou meio que uma confusão. O pessoal (jogadores) olhava (para o Serginho) e voltava. Aí vimos que o negocia ia ser sério e todo mundo desencanou do jogo. Ficamos por uma meia hora, ninguém sabia se ia embora, se o jogo continuava. Aí depois que a ambulância foi embora, não lembro se teve aviso pelo alto-falante ou alguém falou que não ia ter jogo. Os próprios jogadores saíram de campo, aí o pessoal pegou e foi embora. Eu lembro da oração dos jogadores no gramado e aí se percebeu que alguma coisa bem séria tinha acontecido. 

Aí depois quando entrei no carro, liguei o rádio e aí você começa a ouvir que foi para o hospital, que teve uma parada cardíaca e aí você percebe o quão sério foi. O pessoal foi embora até meio que p...,porque estava no começo do segundo tempo, 0 a 0, o São Paulo precisava ganhar. A morte oficialmente já ouvi na televisão, depois que cheguei em casa. Fiquei vendo todos os canais de notícia que estavam transmitindo o jogo e aí deram. Neste momento falei 'caraca, era sério'. Lá você não sabe. Primeiro acha que é cera“.

“Desabei. Chorei demais” – Claudecir, então volante do Palmeiras e amigo de Serginho

Claudecir saiu do São Caetano para o Palmeiras em 2001
Claudecir saiu do São Caetano para o Palmeiras em 2001
Foto: Djalma Vassão / Gazeta Press

“Eu jogava no Palmeiras e estava assistindo ao jogo pela TV com o meu irmão. Naquele momento que aconteceu, a gente ficou muito triste, sempre pensando no pior depois que ele saiu desacordado. Até então eu nem sabia que ele tinha este tipo de problema do coração, eu desconhecia isso. Eu fiquei sabendo durante a entrevista do Silvio Luiz, no fim do jogo. 

A notícia da morte dele eu me lembro com se fosse hoje. Eu estava assistindo à TV e ao mesmo tempo liguei o rádio e o repórter falou assim, me lembro como se fosse hoje: ‘quero dar uma noticia aqui, chegou a informação, mas espero que eu esteja errado sobre isso. A noticia que a gente acabou de receber é que o Serginho acabou de falecer’. Me lembro como se fosse hoje, com essas palavras. Naquela hora, desabei. Chorei demais com o meu irmão e nisto ele falou para irmos ao hospital.

A gente morava em Perdizes, perto do Palmeiras, e naquele momento fomos para o Hospital São Luiz e a gente viu ele daquele jeito. Encontrei o Magrão, outros jogadores que estavam lá e a gente só chorando, lamentando pelo ocorrido. Foi uma lembrança bastante triste, uma pessoa que eu tive oportunidade de concentrar muitas vezes, era uma pessoa alegre, comprometida com o time. Ele não era o capitão, mas era o líder dentro de campo. A gente até hoje sente falta, saudade do ‘Serginho guerreiro’, amigo, pai de família.“

“O baque veio depois” - Eduardo Affonso, então repórter da Rádio Bandeirantes

Experiente repórter Eduardo Affonso viu tragédia de Serginho de perto
Experiente repórter Eduardo Affonso viu tragédia de Serginho de perto
Foto: Reprodução / Reprodução

“Eu trabalhava pela Rádio Bandeirantes e estava como repórter do São Caetano naquele jogo. O que eu lembro é que o jogo era normal, bem complicado para o São Paulo. O São Caetano tinha um baita time. Eu estava bem atrás do gol que aconteceu. No primeiro momento, eu tenho uma lembrança bem clara de que para mim era normal: ‘Serginho caiu, sentiu alguma coisa, está sendo atendido pelo Paulo Forte’. Mas logo depois um jogador chegou e fez um gesto desesperado com a cabeça, aí eu falei: ‘alguma coisa está acontecendo’. Isso é uma coisa que lembro claramente. Daí para frente ele saiu de ambulância e o pouco que ele lembro das entrevistas que eu fiz foi ver os jogadores do São Caetano arrasados, aí vi que era uma coisa muito grave.

Tinha uma pessoa na ambulância que levou ele, que chamava Ricardo Toledo e ele foi meu vizinho por muito tempo. Eu tentei falar com ele por telefone durante o trajeto e ele não me atendeu. Depois que deixou no hospital ele atendeu, mas não falou nada. Ele só passou que era grave, mas disse que não podia falar mais nada.

A rádio me mandou para o Hospital São Luiz e eu já fui pensando no pior. Lá ficamos três horas, o Dr. Paulo Forte (médico do São Caetano) vinha e voltava sem informações. O dirigente do São Caetano, Luiz de Paula, que foi assassinado recentemente, desceu uma hora, falou comigo e deu a entender para mim que o Serginho tinha morrido. Quando ele passou, eu perguntei como o Serginho estava, ele balançou a cabeça e meio que deu a entender que já era. Eu até pedi ao meu chefe para dar a informação, mas a chefia pediu para eu esperar porque não tinha a confirmação. Quinze minutos depois veio a noticia da morte dele.

Essa (tragédia do Serginho) para mim, que foi a única morte que cobri em campo de futebol de jogador, foi bem complicada. Mas na hora da adrenalina, de dar a notícia, é até pecado falar isso, mas você fica meio frio em relação a tudo. O baque só surgiu depois, logo que eu cheguei em casa às 3h. Fiquei pensando que tinha entrevistado ele antes do jogo, que eu vi isso na minha frente, ai veio um baque como ser humano, não como jornalista. Na hora você fica em uma excitação mórbida, de dar a noticia. Lembro bem disso porque cheguei em casa, tomei banho, tinha duas horas para o carro da empresa me buscar para ir para São Caetano e nem dormi, fiquei pensando”.

“Na hora não tem adversários” – Dr. José Sánchez, médico do São Paulo

José Sanchez é médico do São Paulo e tentou reanimar Serginho
José Sanchez é médico do São Paulo e tentou reanimar Serginho
Foto: Fernando Dantas / Gazeta Press

“Estava no banco do São Paulo e nem vi que ele tinha caído porque a jogada continuou e eu fiquei acompanhando a jogada. Na verdade eu nem pensei em nada (quando viu o Serginho caído), vi um atleta cair e quando vimos a reação (dos outros jogadores) a gente já correu para ver o que poderia fazer para dar auxílio. Obviamente, a reação  dos colegas mostrou que era preocupante e corremos para ajudar, já achamos que era uma coisa séria.

Nesta hora, claro, não tem adversários. Isto é uma atitude que fazem frequentemente, quando é mais sério, o colega do nosso clube entra para ver se precisa de alguma ajuda. São momentos que a gente não espera passar no futebol. É um momento chato, desagradável."

“Da forma que caiu, de 1000 só escapa um” – Adãozinho, então meia do Palmeiras e amigo de Serginho

Adãozinho em treino do Palmeiras no início da década de 2000
Adãozinho em treino do Palmeiras no início da década de 2000
Foto: Djalma Vassão / Gazeta Press

“Eu estava assistindo ao jogo, estava no interior, em Bragança Paulista. Tinha treinado pelo Palmeiras mais cedo e vim embora para Bragança, aí vi o que aconteceu. Eu vi pela televisão o pessoal dizendo que ele tinha passado mal e foi socorrido de emergência. Aí resolvi ir para o hospital e quando cheguei lá já tinha falecido. Fui sozinho, de carro. Nós jogamos juntos no São Caetano, tínhamos uma amizade muito boa.

No hospital encontrei todo mundo, família, jogadores, pessoas que tinham jogado com ele em outros clubes. É um momento triste. A gente tentou conversar com a família, tentar confortar o coração de cada um, mas é difícil.

Eu já esperava o pior. Já esperava. Da forma que caiu ali, de cada 1000 que caem ali daquela forma, só escapa um. Ele já estava sem vida  e tentaram socorrer, mas não foi possível. O laço de amizade nosso era muito grande, a consideração que tinha era muito grande”.

“Tirei a chuteira e trouxe para o São Caetano” – Nairo Ferreira, presidente do São Caetano

Nairo Ferreira é o presidente do São Caetano
Nairo Ferreira é o presidente do São Caetano
Foto: São Caetano/Site oficial / Reprodução

“Foi um momento muito difícil esse 27 de outubro de 2004. Foi uma noite muito triste. A gente lembra todos os episódios que teve, a saída para o Morumbi para jogar contra o São Paulo, um jogo muito bom pela Copa Sul-Americana (na verdade, Campeonato Brasileiro). Foi um fim de noite muito triste pela morte do Sérgio. O que passa pela cabeça é comovente, o Morumbi todo calado, depois gritando ‘Serginho, Serginho’. O dia 27 de outubro de 2004 teve um fim muito triste.

Eu estava presente quando ele acabou falecendo naquela noite. Eu estava do lado e realmente minha preocupação foi muito triste, ele já estava morto. Ele estava com o uniforme do São Caetano porque foi levado para o hospital com o uniforme do São Caetano. Fui tirar a chuteira do pé dele, as roupas estavam rasgadas pelos médicos de tanta massagem e desfibrilador, abriram o peito dele. Eu simplesmente só tirei a chuteira e trouxe. Acabei ficando com ela no São Caetano até colocar em um quadro, na sala de troféus do São Caetano, como homenagem“.

A linha do tempo da morte do zagueiro Serginho A linha do tempo da morte do zagueiro Serginho

Fonte: Terra
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