Clubes europeus viram 'brinquedo' de bilionários
Magnatas asiáticos, oligarcas russos, sheiks árabes ou empresários americanos: dez anos depois da compra do Chelsea por Roman Abramovitch, clubes do velho continente continuam sendo alvo de bilionários estrangeiros, que não necessariamente colocam o amor à camisa como prioridade.
Do time londrino, primeiro caso de destaque registrado, à Inter de Milão, comprada em outubro por Erick Thohir, dono de um império midiático na Indonésia, cerca de vinte clubes tradicionais da Europa pertencem hoje a pessoas ou entidades de fora do seu país de origem.
Na Inglaterra, mais da metade das equipes da Premier League (11 de 20) têm donos estrangeiros, atraídos por clubes cotados na bolsa de valores e por um sistema fiscal acolhedor.
Como o mercado britânico já começa a ficar congestionado, bilionários começam a mirar novos rumos, como a França, conhecida por ter clubes com gestão mais rigorosa.
A situação do futebol francês é mais favorável do que o da Espanha ou da Itália, com times mais competitivos, mas muito endividados.
A Alemanha também espanta os estrangeiros por conta de uma lei que proíbe investidores privados de possuírem mais de 49% das ações dos clubes.
O Paris Saint-Germain, comprado por um fundo de investimento do Emir do Catar Al Thani em 2011, e o Mônaco, aquisição recente do oligarca russo Dmitri Rybolovlev, seguem o exemplo do que fez o Chelsea dez anos antes, causando um desequilíbrio que ameaça a lógica esportiva das competições.
"A entrada maciça de dinheiro tem um efeito imediato sobre o mercado. A primeira coisa que os novos proprietário fazem é comprar os melhores jogadores por um preço muito alto. Isso cria uma inflação e às vezes um desequilíbrio esportivo em relação a outros clubes que não podem acompanhar esse ritmo de investimentos", analisa Didier Primault, co-diretor do Centro de Economia e de Direito do Esporte de Limoges, na França (CDES).
Autor de um relatório para a União Europeia que tem como objetivo regular as transferências de jogadores, o CDES registrou picos de inflação depois da compras do Chelsea por Abramovitch em 2003 e do Manchester City pelo Emir Zayed Al Nahyan de Abu Dhabi em 2008.
O mesmo aconteceu na última janela de transferências, com contratações astronômicas de Real Madrid (Gareth Bale por cerca de 91 milhões de euros), Barcelona (Neymar por 57 milhões), PSG (Edinson Cavani por 64 milhões) e Mônaco (Radamel Falcao García por 60 milhões).
O dinheiro investido, seja para contratar novos jogadores, seja para pagar dívidas dos clubes (Thohir desembolsou 200 milhões de euros para sanear as finanças da Inter) desafia qualquer lógica econômica.
O Mônaco, que voltou à elite do futebol francês nesta temporada, gastou por meio de Rybolovlev nada menos de 167 milhões de euros na última janela de transferências, mais de um terço do valor investido pelo Chelsea nos últimos dez anos.
Outro bilionário russo, Suleiman Kerimov, também desembolsou uma fortuna para trazer craques como Roberto Carlos, Willian ou o camaronês Samuel Eto´o ao Anzhi Makhatchkala em 2011, mas resolveu cortar drasticamente seu orçamento nesta temporada, vendendo seus principais jogadores.
Vincent Tan, dono malês do Cardiff City, também é conhecido pela excentricidade. Uma das suas primeiras decisões foi mudar as cores do uniforme e o escudo do clube fundado há mais de 110 anos (em 1899). O time galês trocou a tradicional camisa azul por uma vermelha e o dragão vermelho ganhou mais destaque que o pássaro azul que figurava no centro do escudo original.
"Há dois tipos de investidores", explicou Frédéric Bolotny, consultor de economia do esporte.
"Alguns buscam a rentabilidade indireta, seguindo uma estratégia política, como o Catar com o PSG. Quando Abramovitch ou Rybolovlev compram o Chelsea, eles buscam a respeitabilidade. Para muitos, a rentabilidade é o de menos", completou.
Poucos investidores realmente conseguem ganhar dinheiro com clubes de futebol. Uma das exceções é o americano Malcom Glazer, dono do Manchester United.
Thohir também sonha em fazer o mesmo com a Inter de Milão. Ele sabe que o futebol é hoje um mercado importante e lucrativo, explica um amigo próximo do empresário indonésio, Habil Marathi, ex-diretor de seleções do seu país. "Ele vai ganhar muito dinheiro a longo prazo. Há um mercado cativo, com a possibilidade de vender produtos do clube", analisou.
A nova regra do 'Fair Play' (jogo limpo) financeiro, que a UEFA tenta aplicar progressivamente para impedir que clubes gastem mais do que recebem, pode frear a inflação das contratações.