Pesquisa global revela que 64% das empresas dizem priorizar diversidade nos conselhos
Levantamento da consultoria Russell Reynolds aponta que, apesar de movimento contrário, maior parte das companhias ainda vê valor em buscar diferentes perspectivas
A diversidade nos conselhos de administração ainda é valorizada por boa parte das empresas em suas estratégias de governança corporativa. A conclusão é do estudo Tendências de Governança Corporativa da consultoria global de lideranças Russell Reynolds, no qual 64% das companhias ouvidas em todo o mundo afirmaram que levam a inclusão como um fator importante para decisões do tipo. A pesquisa ouviu 1,2 mil empresas de 17 países (leia lista mais abaixo), em 2024.
Nos últimos meses, a pauta de diversidade, equidade e inclusão (agrupada na sigla DEI) foi captada pela polarização política, sendo criticada por Donald Trump e outros membros do novo governo dos Estados Unidos. Também foi abandonada por grandes empresas norte-americanas, como Disney, Walmart e American Airlines.
No Brasil, o cenário é diferente dos Estados Unidos, com algumas leis que garantem reservas de vagas em empresas, universidades e concursos públicos para determinados grupos, como pessoas pretas e pardas ou com deficiência. Outra diferença é a postura da Suprema Corte de cada País — a dos Estados Unidos vem restringindo as políticas de diversidade em julgamentos recentes, enquanto a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no Brasil tem sido a favor.
Assim, o que é visto no Brasil é que as empresas que realmente levavam programas de diversidade a sério, os mantém. Lá fora, algumas companhias encerraram as medidas, mas caso atuem aqui, são obrigadas a se sujeitar a regulações brasileiras.
As que mantém os projetos afirmam enxergar os resultados no dia a dia. "Várias empresas entendem que diversidade não é só uma questão ética mas também um diferencial competitivo, para inovação e atrair talentos. A diversidade fortalece a empresa perante os consumidores e também perante os colaboradores", afirma Jacques Sarfatti, sócio-diretor da Russell Reynolds e líder da prática de Avaliação de Conselhos de Administração e CEOs.
No entanto, isso não significa que a pauta da diversidade já esteja consolidada e a pleno vapor no Brasil. Tendo começado com a reserva de vagas em universidades há 21 anos (a pioneira foi a Universidade Estadual do Rio de Janeiro, em 2004), ela avança devagar. "A gente vê uma evolução, mas é pequena, ela anda a passos lentos", comenta Valéria Café, diretora-geral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Nos EUA, por exemplo, o debate já acontece desde os anos 1960.
Mas, ao mesmo tempo, existem regulações que acabam trazendo uma necessidade das empresas serem mais transparentes. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), órgão do governo que regula o mercado de capitais, aprovou diretriz da B3 que determina que as empresas listadas incluam em seus conselhos pelo menos uma mulher e uma pessoa de outro grupo minorizado até 2025, sob a regra como conhecida como "pratique ou explique" — quem não cumprir, terá que divulgar as razões de não tê-lo feito.
"Do nosso lado precisamos de um trabalho de conscientização. Em conselhos, as estatísticas de diversidade são desesperadoras, e não tem como falar de diversidade se os grupos minorizados não estão representados em todos os níveis hierárquicos. Mas as organizações estão se movimentando, é uma pauta perene que precisa ser acelerada" comenta Guibson Torres, gerente executivo no Pacto de Promoção da Equidade Racial.
O conselho administrativo, no final, é responsável pra garantir que os temas que estão entrando nas agendas da empresa e do líder da companhia. A cobrança de stakeholders (partes interessadas), como acionistas, consumidores, clientes, fornecedores e trabalhadores das empresas também pode fazer a diferença.
"Existem stakeholders que estão olhando para como a empresa está atuando, e se ela é transparente. Mesmo que a empresa não tenha todas as informações naquele exato momento, pode mostrar ao longo dos anos o quanto ela vem evoluindo, e isso é muito positivo", cita Valéria Café, do IBGC.
Empresas familiares
O estudo destaca que a busca por diversidade e inovação chega também às empresas familiares brasileiras. Segundo o relatório, as companhias do tipo estão modernizando seus conselhos e, ao mesmo tempo, buscam alinhar suas práticas com as expectativas de investidores e públicos interessados globais. A inovação na governança, combinada com uma maior flexibilidade, é vista como uma tendência crescente no mercado.
Sarfatti, da Russell Reynolds, menciona um ponto fundamental para essas companhias: a transição entre gerações. "Vemos uma busca por processos de sucessão mais estruturados, com alinhamento com temas de ESG. Há uma visão entre os CEOs de garantir uma continuidade, um legado, que fortalece a perenidade da empresa", relata.
A governança desse processo é fundamental porque garante uma longevidade da organização. Conforme Valeria Café cita, o IBGC explica para as companhias familiares sobre a importância de se ter três governanças separadas: uma para a empresa, outra para a família e a última para o patrimônio.
A presença de conselheiros independentes pode ajudar por trazer visões diferentes às arraigadas na organização. "Acreditamos que esse conselheiro ou conselheira independente é muito importante para trazer novos conceitos, para trazer um olhar estratégico ou mesmo na diversidade da contratação dos executivos", diz Café.
Inovações
Outro ponto destacado no estudo é a necessidade de resposta rápida a diferentes desafios impostos pelo mundo, sejam tecnológicos, sejam geopolíticos. Por isso, a utilização de diferentes tecnologias e de uma boa comunicação interna é fundamental para não perder tempo, e, mais importante ainda, tomar as decisões corretas e bem informadas.
Assim, as inovações na governança surgem, como relata Valéria, do IBGC. "Você não tem mais só aquela empresa cabide, tem empresa que trabalha por squads, tem modelos de negócios diferentes, tem formas de gestão financeira diferenciadas", menciona.
Sarfatti, da Russell Reynolds, demonstra otimismo quanto ao cenário da governança no Brasil. "No final o importante é a comunicação, conversar quando houver algum problema. Há uma evolução na direção certa, vai trazer novos patamares alinhados com as melhores práticas de governança internacionais", prevê.
Países ouvidos pela pesquisa
- Alemanha
- Austrália
- Bélgica
- Brasil
- Cingapura
- Dinamarca
- Espanha
- Estados Unidos
- Finlândia
- França
- Hong Kong
- Índia
- Islândia
- México
- Noruega
- Reino Unido
- Suécia