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Novo momento, novas aspirações

O mercado, as crises externas e rupturas de tendências são inevitáveis e merecem respeito

12 fev 2019 - 04h10
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Economistas têm fascínio por prospecções e elaboração de cenários futuros, pois lidam basicamente com incertezas. Buscam tirar alguma lógica futura de tendências captadas por indicadores. Mudanças de natureza institucional, política, social ou comportamental interferem na evolução da economia e muitos se dedicaram a analisar essas correlações e interferências.

Expectativas induzem poupança, investimento e crescimento, podendo delinear cenários pessimistas ou sinalizar otimismo. Em grande parte, os ciclos econômicos de crescimento e recessão estão ligados, de início, a mudanças de expectativas. Intervenções do governo podem atenuar crises ou estimular decisões. Mas "domesticar" o mercado por meio de planejamento centralizado e autoritário resulta em fracassos no longo prazo. O planejamento flexível, baseado em cenários possíveis e tentando minimizar efeitos de mudanças adversas, é o que tem dado bons resultados para grandes corporações e governos. O mercado, as crises externas e rupturas de tendências são inevitáveis e merecem respeito.

O problema dos tempos atuais é que inovações e mudanças tecnológicas são tão velozes que os cenários e o planejamento devem acompanhar e tirar partido das mudanças. Por outro lado, o processo de globalização passou a ter uma influência tão determinante na produção de bens e serviços que gerou novos modos de produzir, novas especializações regionais e a descentralização em escala mundial das cadeias produtivas antes restritas a um país ou região. Quando se analisam os efeitos transformadores e conjugados dos avanços tecnológicos e da globalização, é difícil de resistir ao devaneio de imaginar como se distribuirão o crescimento econômico e as transformações neste século 21.

Obviamente, convicções político-ideológicas, religiosas e comportamentais de cunho fundamentalista obliteram análises mais objetivas de cenários e tendências. Análises mais realistas indicam que, se não houver nenhuma ocorrência catastrófica, a liderança do mundo em termos econômicos, sociais, culturais e de costumes, tecnológicos e militares continuará a ser dos EUA, com ramificações no Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. A força das universidades, a ampla cultura, a pujança do mercado, a capacidade de inovação e a criatividade ainda serão fatores determinantes dessa liderança.

A China será uma segunda potência de respeito, porém com grandes dificuldades internas. O paradoxo da China é que, quanto mais cresce, maiores se tornam as exigências sociais e humanas. Conseguirão o "despotismo esclarecido" e as restrições de liberdade conter esses problemas? Por outro lado, a União Europeia (se permanecer unida, claro) continuará a ser importante matriz cultural, científica e tecnológica. A Índia, sem dúvida, com extraordinária capacidade de absorção e elaboração do conhecimento e a língua inglesa facilitando a sua pujança acadêmica, será relevante. Mas a grande população, os recursos naturais limitados, a pobreza difusa e a cultura de castas travam a capacidade de criar uma sociedade mais equânime. A Rússia, com suas eternas ambições expansionistas, ficará em sua dúvida histórica entre integrar-se à Europa ou manter-se no isolamento.

E o Brasil? O País absorve bem inovações e certa modernidade no consumo, de um lado, mas é muito impermeável à cultura, ao conhecimento e à mudança. Os níveis educacionais e culturais são baixíssimos, o que trava a capacidade de gerar inovações e elevar seus níveis de produtividade. No entanto, a grande extensão territorial, riquezas minerais, abundância de terras agriculturáveis e o agronegócio têm nos salvado do atraso. O momento é de ter a ambição de se integrar ao mundo desenvolvido e abandonar a tradição do terceiro-mundismo, que nos levou a ficar patinando na mediocridade.

Com o novo governo e novas esperanças, vale lembrar, homenageando o recém-falecido Amós Oz, que "os que estão dispostos a mudar sempre serão vistos como traidores pelos que não são capazes ou que não querem qualquer mudança".

*ECONOMISTA, CONSULTOR DE ENTIDADES PÚBLICAS E PRIVADAS, É COORDENADOR DO NÚCLEO DE ESTUDOS URBANOS DA ASSOCIAÇÃO COMERCIAL DE SÃO PAULO

Estadão
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