'Efeito Trump': aço brasileiro entra na mira da Mac Laren para atender Petrobras
Estaleiro venceu primeira licitação da Petrobras no atual governo; com taxação dos EUA, matéria-prima pode ficar mais barata e permitir o aumento de conteúdo local
RIO - Perto de completar 90 anos, o estaleiro Mac Laren está pronto para embarcar em mais uma tentativa de revitalização da indústria naval brasileira, um dos setores mais afetados pela Operação Lava Jato e que ficou estagnado pela falta de encomendas no governo Bolsonaro. Vencedor da primeira licitação da Petrobras no atual governo, para construção de quatro navios Handy, a empresa vai participar também da segunda licitação da estatal, de oito navios gaseiros. Ao Estadão/Broadcast, o vice-presidente da Mac Laren, Alexandre Kloh, afirmou que tem interesse em "tudo o que a nossa capacidade permitir". Segundo o executivo, após o "efeito Trump", talvez seja possível comprar no Brasil o aço que seria importado.
"Com essa taxação dos Estados Unidos no aço, o que vai acontecer é que o nosso aço pode baratear, e isso que vai ser bom, porque você aumenta conteúdo local, passa a comprar aqui o que vem de fora. Sem dúvida, a possibilidade de queda no preço do aço faz com a gente olhe aqui também, nosso desejo é esse. A gente ainda vai sentar com a indústria nacional para conversar, mas se a gente vai chegar no preço, é outra história", avaliou Kloh.
As negociações estão começando fortes agora, disse Kloh. Ao todo serão entre 23 mil a 24 mil toneladas de chapas de aço para a construção das quatro embarcações, que, no início da licitação, no ano passado, foram cotadas em países como China e Indonésia.
Para ganhar a licitação, o conteúdo nacional foi reduzido de 67% para 50,05%. "Isso incluía a chapa, naquele momento da cotação, o preço do importado era mais vantajoso do que a indústria nacional, mas, agora, a gente vai conversar com a indústria", informou.
Apesar de ter conseguido se manter vivo com outras atividades ao longo da estagnação da indústria naval, como a prestação de serviços portuários, entre outros, a Mac Laren viu seus quatro estaleiros reduzidos a dois, localizados em Niterói, no Rio de Janeiro, além de perder milhares de empregados qualificados. Em 10 anos, a empresa viu minguar seu quadro de 14 mil empregados, no auge das obras, para 300, o que agora terá que ser recomposto.
"O desafio é a requalificação deles. Como a indústria foi desmantelada, você tem uma requalificação, porque a mão de obra que naquele momento estava super qualificada, mas o que eles foram fazer? Uns foram para Uber, outros para outro segmento, parte para construção civil. Quantas vezes eu ia de Uber para o Centro do Rio e a pessoa falava que era soldador. Foram para outros caminhos, mas com o reaquecimento, esse pessoal já está voltando", disse o executivo, que no auge da construção dos navios tipo Handy prevê entre contratar entre 1.500 e 2 mil pessoas.
Ele observou que, para sustentar o crescimento da indústria naval no Brasil, é necessário que o apoio do governo vire uma política de Estado, para não ser intermitente. Para isso, é preciso que haja mais encomendas, de forma continuada. O Plano de Negócios da Petrobras até 2029 é uma grande locomotiva desse crescimento, mas ainda é cedo para afirmar se haverá uma retomada como ocorreu nos anos 2000, quando o setor chegou a mais de 90 mil empregos diretos, fora os indiretos, que, nas contas de Kloh, somavam juntos meio milhão de pessoas. "É uma indústria que tem capacidade de desenvolvimento muito forte", destacou.
Segundo ele, o estaleiro Rio Grande, onde serão feitos os cascos dos navios Handy, da parceira Ecovix na licitação, por exemplo, que continuará com capacidade ociosa após as encomendas. "A Ecovix pode fazer um casco deste por mês, de 5,4 mil toneladas, mas não funciona assim. Isso traz um otimismo para a indústria, mas não é suficiente para você manter aquela indústria na sua capacidade operacional, que é muito alta", explicou.
Fundado em 1938, o estaleiro Mac Laren construiu a primeira frota de apoio marítimo do Brasil, para a Petrobras, na década de 1970, e reconhece que, além da estatal, poucas petroleiras brasileiras trabalham com frota própria, o que reduz o volume de encomendas aos estaleiros brasileiros. E é da estatal que virá também outra aposta para a empresa: os trabalhos de revitalização de antigas plataformas e os descomissionamentos previstos para os próximos anos, que devem passar por licitação.
"A gente está conversando com a Petrobras. O Plano de Investimento da Petrobras para os próximos anos traz otimismo pra gente, e não só a parte de construção, mas de descomissionamento, de revamp (revitalização) das plataformas. A gente quando olha esse plano e consegue enxergar pelo menos cinco anos com os estaleiros alavancados", avaliou.
