'Desafio é como conviver com taxas de juros em patamares próximos a nossos pares', diz Galípolo
Presidente do Banco Central disse que será preciso uma série de medidas para normalizar a política monetária no Brasil
BRASÍLIA - O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, disse há pouco que será preciso uma série de medidas para normalizar a política monetária no Brasil e que algumas reformas extrapolam a área de atuação da autoridade monetária. Para ele, há uma questão, que é a de como conviver com juro em linha com pares e com inflação controlada, e também é preciso, conforme o banqueiro central, facilitar o acesso ao crédito pela população com o intuito de reduzir custo do crédito. As observações de Galípolo foram feitas durante audiência pública na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara dos Deputados.
"Um grande desafio é a discussão de como é que a gente pode conviver com taxas de juros em patamares que são mais próximos aos nossos pares", considerou, acrescentando, porém, que "ninguém quer baixar os juros para ter uma inflação lá em cima".
"Você quer conviver com uma taxa de juros que possa produzir o mesmo efeito do ponto de conviver com a inflação, porém em patamares que possam ser mais próximos aos nossos pares", explicou.
Para ele, está claro que o Brasil precisará de uma série de medidas. "Não vai ter uma bala de prata, não vai ter uma 'vitória por ippon', como eu já usei expressão antes". Por isso, de acordo com o presidente do BC, a ideia de dar acesso à população ao crédito de menor custo pode ter como consequência a redução da percepção de risco e isso reduz o custo daquele crédito também.
"Boa parte das famílias e indivíduos vem utilizando de maneira recorrente o crédito que a gente chama de rotativo, que é aquele crédito emergencial, o mais caro, porque ele é utilizado justamente sem qualquer tipo de garantia", citou, mencionando que se trata de uma linha de acesso rápido, o que facilita sua utilização.
Esse crédito, conforme o presidente do BC, deveria ser usado apenas em episódios "absolutamente emergenciais" e as demais formas de crédito deveriam ser utilizadas com algum tipo de planejamento. Ele também mencionou que, por outro lado, algumas isenções concedidas permitem que, muitas vezes, empresas captem recursos com juros mais baixos do que o Tesouro, que é livre de risco.
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Para Galípolo, pode ser observado um movimento de deturpação, ou ruído, na transmissão da Selic a algumas modalidades de crédito. Em alguns casos, de acordo com ele, quanto maior o valor absoluto do juro, mais barata fica a tomada de crédito. "É uma coisa estranha. Se você subir o juros, a vantagem relativa subiu. Do outro lado, para as famílias que, muitas vezes, estão endividadas num rotativo, vai pagar 200%, 300% da taxa de juros", comparou.
Por isso, de acordo com o banqueiro central, se a Selic for elevada em 100 ou 200 pontos-base, a sensibilidade ao ciclo da política monetária passa a ficar "relativamente baixa" para quem já trabalha com juros de 200 ou 300 pb. "(Os aumentos) acabam produzindo uma transmissão da política monetária que tende a ser menos fluida."
Juro restritivo
Galípolo repetiu que a autoridade monetária tem de colocar a taxa de juro em um nível restritivo o bastante para atingir meta no horizonte relevante, durante audiência pública na Câmara dos Deputados. Segundo ele, críticas sobre Selic a 15% ao ano, às vezes, estão associadas à ideia de que a autoridade monetária não está perseguindo a meta.
"Muitas vezes, o presidente do Banco Central e toda diretoria da política monetária tem de estar sujeito a críticas e tem que ouvir críticas", disse a deputados. Ele explicou que a meta de inflação de 3% não é uma sugestão do BC, mas que decorre de um decreto, e que sua banda serve para absorver choques. "Se você tiver algum choque de oferta, algum choque exógeno, você temporariamente absorve esse choque, mas a meta é de 3%", detalhou.
Galípolo salientou também que gostaria que a fortaleza institucional do BC se perpetuasse, independentemente de seus comandantes. Por isso, de acordo com ele, seria importante que os nomes dos membros do Comitê de Política Monetária (Copom) importem cada vez menos em análise sobre a função de reação da instituição.
"A ideia de que, a partir de que uma pessoa foi para lá, ela pode ser mais leniente, mais condescendente, não cumprir ou cumprir (a meta)", citou sobre algumas críticas antecipadas que já ocorreram.
O presidente da instituição salientou que sua atribuição também tem limites. "Não foi conferido a mim interpretar, flexibilizar qualquer tipo de comando legal", afirmou, salientando que os juros num patamar restritivo, o suficiente e pelo tempo que for necessário visam atingir a meta dentro do horizonte relevante. "Este é o papel. E, de maneira nenhuma, quero fazer parecer aqui que o que eu estou falando sugere a abertura para um debate sobre a meta", afirmou.
Galípolo também disse que não há nada mais danoso a uma sociedade quanto a destruição da moeda e salientou que o BC reagiu de maneira "inequívoca, e sem tergiversação", na defesa da sua moeda.