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Nova versão de 'O Prisioneiro' não consegue escapar do original

12 nov 2009 - 15h51
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Tim Goodman

Provavelmente não haveria uma saída vitoriosa para a nova versão da série O Prisioneiro pela rede AMC, que estreia no domingo como minissérie a ser exibida em três segmentos de duas horas de duração. Enquanto a série original de 1967, transformada em clássico cult por sucessivas gerações de espectadores, tinha 17 episódios e redefiniu as possibilidades da narrativa não linear (e possivelmente não lógica) da televisão, a versão moderna tem hora para acabar -a noite de terça-feira- e oferecerá uma conclusão concreta.

O problema é o caminho que nos conduzirá até lá. Os fãs que ainda conseguem lembrar do original (exibido nos Estados Unidos a partir de 1968) provavelmente não se incomodarão. As novas gerações de fãs de programas cult de TV que redescobriram mais tarde o original um tanto alucinógeno provavelmente não gostarão da refilmagem, porque em última análise ela altera os padrões da série. Sempre que uma produtora decide alterar um grande clássico, o produto sai perdendo. A AMC deve ter tido a ousadia de seguir adiante apesar disso ou a imprudência de persistir apesar das possíveis hesitações.

Mas além de tudo, mesmo desconsideradas as comparações pouco lisonjeiras, há dois outros grandes problemas com o novo Prisioneiro. Primeiro, porque o original permitiu que uma nova geração de roteiristas desconsiderasse as convenções, os telespectadores norte-americanos agora já assistiram de tudo, de Twin Peaks a Lost, passando por Arquivo X e toda espécie de ficção científica, a começar de Battlestar Galactica. A ideia de que ser vago, adotar um tom de ameaça e linhas de narrativa estranhas pode bastar para interessar os telespectadores já não procede. Todo mundo já viu essas coisas. Caso a ideia seja repetir o uso desses recursos, as pessoas precisarão de algo mais: precisarão de respostas.

O que nos conduz ao segundo problema, que talvez seja o mais grave: O Prisioneiro não atrai o interesse. É muito desconexo. Suas esquisitices não são interessantes, sua narrativa heterodoxa não é especial o bastante. E, ao final da sexta hora de minissérie, o momento em que os telespectadores enfim encontram uma resolução para a história (algo que não acontecia no original), a primeira questão que deve lhes ocorrer será: "Passei seis horas assistindo para isso?"

Quem quer que tenha assistido a O Show de Truman ou, melhor não esquecer, as diversas versões diluídas da mesma ideia (universos alternativos que não reais, a contaminação daqueles que chegam por uma sensação de que as coisas não são o que deveriam) vai estar bocejando diante da tela muito antes da terça-feira.

Não seria justo dizer que não existem reviravoltas interessantes no novo O Prisioneiro. Ian McKellen como Número 2 (o único Número 2) é sempre fascinante, mesmo quando o diálogo que lhe cabe não é. Existem alguns momentos -ainda que não muitos nas duas primeiras horas- que levam o espectador a persistir, e atualizam de maneira aguçada as ideias do original (principalmente o uso da manipulação psicológica e a ideia de que um poder mais alto -talvez uma organização de mineração de dados?- pode tentar ir além de seus limites, em detrimento da sociedade.)

Seria possível argumentar que se a pessoa não tiver assistido ao original, o novo O Prisioneiro talvez pareça interessante (e nem tanta gente assistiu à toda série original). Mas mesmo sem pontos de referência, não existe intriga dramática suficiente para manter a atenção dos espectadores durante três noites. O ator britânico Patrick McGoohan concebeu o original depois de deixar Secret Agent, uma série de sucesso. Em sua versão da série, McGoohan era de novo um espião, dessa vez desiludido a ponto de abandonar o serviço secreto. Ele é sequestrado e forçado a viver em The Village, uma bizarra comunidade onde ninguém tem nome, apenas um número (ele é o Número 6), e todos abrigam segredos e motivações ocultas que resultam em jogos psicológicos, paranóia e delícias escapistas. Décadas de teses tentaram desvendar o que exatamente estava em jogo na história, determinar se sua mensagem era de niilismo ou esperança, antigovernamental ou pró-liberdade pessoal. Vista anos mais tarde, a série é um claro produto de sua era.

Caso a AMC desejasse realmente revolucioná-la, a rede de TV a cabo teria de produzir uma série exponencialmente mais assustadora, em termos psicológicos e das ameaças pessoais que existem em The Village. Na forma atual, Jim Caviezel, o novo Número 6, simplesmente passa por uma série de flashbacks nebulosos sobre Nova York (e seu sinistro emprego de recolher dados sobre pessoas em busca de "um padrão"). Ele nunca parece estar em perigo no novo Village. Até mesmo a incorporação de elementos do original -frases de efeito e truques estranhos de ficção científica- falha em expandir os limites de nosso quebra-cabeça mental, como o original conseguia.

Os tempos mudaram. As ameaças políticas e até mesmo as do poder empresarial já foram tratadas inúmeras vezes em filmes e seriados. O seriado original abriu as portas a décadas de televisão inovadora. Refilmá-lo agora parece sem propósito. E fazê-lo de forma a não insuflar vida nova ao resultado é simplesmente decepcionante, se bem que não inesperado.

Foto: Divulgação
The New York Times
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