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Entrevista com Melody Gardot: "Tenho uma longa história de amor pelo Brasil"

23 out 2020 - 16h05
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Em maio deste ano, a cantora norte-americana de jazz Melody Gardot ganhou as manchetes quando lançou uma chamada de elenco nas redes sociais para músicos de orquestra incapazes de trabalhar devido às restrições da quarentena impostas pelo coronavírus.

Foto: Laurence Laborie / The Music Journal

Com inscrições recebidas de todo o mundo, ela fez o impensável e criou uma "orquestra global digital" para o lançamento de seu primeiro single, From Paris With Love. A música foi acompanhada por um vídeo que apresentava retratos de pessoas de todo o mundo, enviados durante a quarentena, com a mensagem "De (a cidade onde a pessoa estava confinada) Com Amor".

A mensagem de juntos apesar da distância tornou-se ainda mais impactante quando a Decca Records e Gardot orgulhosamente se uniram para doar os royalties do single a uma organização de caridade para profissionais de saúde.

A cantora voltou novamente às manchetes em junho, enquanto gravava a primeira sessão de estúdio que cumpria os requisitos de segurança para a prevenção do coronavírus no histórico Abbey Road Studios, de Londres, juntamente com a aclamada Royal Philharmonic Orchestra.

Hoje, Meloy Gardot está lançado seu novo álbum Sunset in Blue, que conta com treze canções onde se destaca o dueto com o lendário cantor britânico Sting em Little Something. Juntos, os vocais distintos de Gardot e Sting se misturam perfeitamente em numa faixa up-tempo, inspirada na música pop latina.

Melody e Sting farão sua primeira aparição no Reino Unido juntos esta noite, para realizar o dueto no The One Show, da BBC, após uma excepcional estreia ao vivo no Good Morning America, no início deste mês.

Em uma entrevista exclusiva de Melody Gardot com o TMJ, a artista falou sobre a concepção de From Paris With Love, de sua visão sobre o jazz atual e de seu amor pelo Brasil, que, segundo ela, graças a nomes icônicos como Astrid Gilberto, Caetano Veloso, Elis Regina, Nelson Gonçalves, Orlando Silva e Noel Rosa "que adquiri uma noção do que é a música na cultura brasileira".

Confira a entrevista na íntegra:

Foto: Laurence Laborie / The Music Journal

Marcelo de Assis: Melody, você inicia a divulgação de seu novo álbum com um dueto com Sting. Como foi gravar "Little Something" e como surgiu a ideia desta colaboração?

Melody Gardot: Em um momento em que todos nós agradecemos por colaborar apesar da distância: aí veio uma música. Recebi a faixa de Jen Jis, a produtora musical de Paris, fiz uma demo e então nós, Sting e eu, gravamos nossas respectivas partes separados um do outro. Não é tradicional, em termos de como normalmente gravaríamos, mas, novamente, nada é neste momento sem precedentes … Temos que continuar criando!

Marcelo de Assis: Sting mencionou que o single tem uma "alegria simples e contagiante". Isso também se identifica com a atmosfera que vocês encontraram em estúdio ao gravar a canção?

Melody Gardot: Eu concordo com o Sting! Esta é realmente uma música para "sentir bem". Estou muito feliz e grato por ter participado dessa faixa com ele.

"Para mim, Jazz sempre foi sobre diálogo. É uma conversa onde agradecemos a partilha de ideias. Jazz é liberdade".

Marcelo de Assis: Melody, como foi o seu processo criativo para "Sunset in The Blue" e como a atual pandemia impactou nele?

Melody Gardot: O álbum exigiu muita determinação e colaboração de pessoas em todo o mundo. Till Brönner, Antonio Zambujo, Sting e até mesmo a Royal Philharmonic Orchestra de Londres foram gravados à distância. Nossa equipe deu um apoio incrível apesar do desafio e todos corajosamente aceitaram a ocasião. Por isso, estou imensamente orgulhosa de todos que trabalharam neste álbum.

Marcelo de Assis: Seu primeiro single "From Paris With Love" parece ter nascido de uma maneira especial, não? Naquele momento você chegou a trabalhar com uma orquestra virtual. Como foi todo aquele processo?

Melody Gardot: Foi incrível ver que nos conectamos, descobrimos e colaboramos com músicos e pessoas de todo o mundo. Uma orquestra digital verdadeiramente global! Músicos de mais de 20 países, incluindo o brasileiro Lucas Lima. Fiquei maravilhado com esta bela resposta a uma bela mensagem: com amor de Paris e com amor de todo o mundo. Juntos, apesar de nossa distância. A mensagem era forte: vamos apoiar os artistas e tentar quebrar o silêncio ensurdecedor nas artes. E com isso, vamos encontrar uma forma de apoiar uma instituição de caridade. Como era o início do bloqueio, minha equipe e eu ficamos muito preocupados com a situação. Procuramos a maneira de fazer o maior bem e, junto com a Universal Records, concordamos em doar ambas as nossas ações de todos os royalties para a Protege Ton Soignant (uma organização de trabalhadores da saúde em Paris para ajudar os profissionais da saúde durante o início da pandemia).

Foto: Divulgação | Universal Music | Decca Records / The Music Journal

Marcelo de Assis: Como você analisa o jazz nos dias de hoje?

Melody Gardot: Algumas palavras: Liberdade. Diálogo. Troca. Pesquisa. Para mim, Jazz sempre foi sobre diálogo. É uma conversa onde agradecemos a partilha de ideias. Jazz é liberdade. Acredito que se formos capazes de quebrar as barreiras do "gênero", as tradições do passado, e deixar de lado nossas limitações para nos unirmos neste momento - então fizemos o melhor que pudemos para continuar a continuar a verdadeira tradição do jazz. Siga em frente. Empurre mais longe. Crie mais … e crie de novo.

Marcelo de Assis: O jazz sempre foi um gênero democrático, onde os artistas puderam, ao longo dos anos, conectar com outros gêneros musicais e até desenvolvendo novos estilos. Parece que sua música segue por estes mesmos caminhos. O que você pensa a respeito disso?

Melody Gardot: Concordo com você! Devemos sempre desafiar a regra do gênero para criar de novo. O que quer que seja Kamasi ou Coltrane. Devemos seguir em frente.

Marcelo de Assis: Melody, quais artistas são para você uma referência imediata na sua musicalidade?

Melody Gardot: Alguns de meus favoritos: Bill Evans, Duke Ellington, Joni Mitchell, Juliette Gréco, Miles Davis, Mahler, Satie, Chopin, Chet Baker … a lista continua!

Smart Call (capturas: Samsung)
Smart Call (capturas: Samsung)
Foto: The Music Journal

Marcelo de Assis: E por falar em jazz, é impossível não mencionarmos a Bossa Nova. O que você conhece da música brasileira sobre este gênero?

Melody Gardot: Tenho uma longa história de amor com o Brasil. Desde o início da minha recuperação e introdução à musicoterapia, me apaixonei pela música brasileira. Foi graças a cantores como Astrid Gilberto, Caetano Veloso, Elis Regina, Nelson Gonçalves e Orlando Silva com Noel Rosa - um pouco o equivalente Gardel da Argentina para mim - que adquiri uma noção do que é a música na cultura brasileira. No começo, apegava-me apenas às palavras. Adorei as sílabas e o "som" da língua. Fiquei encantado com o ataque amolecido, essa natureza aveludada de palavras como "coraçao", o jogo da poesia para rimar, e como a língua, mesmo falando, era de alguma forma "cantada". Eu não conseguia o suficiente, realmente, estava encantado. Como estrangeiro - e uma espécie de "gringo" na época - era o som mais suntuoso que eu já ouvira! A linguagem e a música com certeza eram algo que me chamava, mas eu não tinha formação, não tinha professor e estava em um hospital me recuperando nos EUA. Naquela época, eu apenas ouvia as músicas com atenção, olhava as letras e tentava repeti-las, às vezes imitando as palavras sem saber exatamente o que significavam. Mas, na realidade, esses artistas e essas músicas foram meus primeiros professores e ainda estou aprendendo com eles agora cada vez que ouço.

Marcelo de Assis: Quando você virá ao Brasil?

Melody Gardot: O mais breve possível! Você tem uma passagem para mim? (risos). Tenho saudades de um bom acarajé e de uma boa Caipivodka! Ou até mesmo o néctar do Caju!

Marcelo de Assis: Melody, muito obrigado!

Melody Gardot: Abraços, Marcelo e obrigado pela sua entrevista!

The Music Journal The Music Journal Brazil
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