Marjorie Gerardi tem novos papéis desafiadores após viver três mulheres reais: “Amadureço com elas”
Atriz em cartaz na peça ‘Closer’ fará primeira protagonista no cinema e longa sobre história dramática do Dr. Drauzio Varella
Agenda cheia de trabalhos e desafios. O sonho de qualquer ator é a realidade de Marjorie Gerardi. O ano segue intenso para a carreira da atriz e produtora.
Nesta entrevista, ela comenta papéis que impulsionam sua evolução artística e revela novas personagens a caminho. Fala ainda sobre o uso de Inteligência Artificial para substituir atores.
O ano de 2025 está cheio de trabalhos, com duas peças e três filmes, além de você comemorar duas décadas de carreira. O que esses números representam?
Olha, é muito louco pensar que já se passaram 20 anos, porque no meu coração parece que comecei ontem. Sempre estou aprendendo e as coisas estão mudando. Mas, ao mesmo tempo, quando olho para trás e vejo o tanto de história, de personagens, de encontros… É uma trajetória que me enche de gratidão. Esse ano em especial está sendo uma celebração do que eu amo fazer. Ter duas peças e três filmes no mesmo ano não é só sobre volume de trabalho, é sobre intensidade de entrega, pesquisa e conexão. Eu me sinto abençoada.
Você já representou três mulheres reais: a Noely (na série ‘As Aventuras de José e Durval’), a Cidinha (no filme ‘Silvio’) e a Tarsila do Amaral (na série ‘Aqueles Dias’). Qual a diferença de compor personagens reais e ficcionais?
Interpretar pessoas reais gera uma responsabilidade muito grande porque você está lidando com memórias afetivas, legados, histórias que de fato existiram. No caso da Noely, eu tive o privilégio de ter muitas fontes de pesquisa. Ela, por conta dos filhos, Sandy e Júnior, já participou de muitos programas de TV e deu muitas entrevistas. Tive acesso ao bate-papo dela com os roteiristas, gravado, contando a trajetória de sua vida, como começou a relação com a música, o teatro e o circo, a história de amor com o Durval (Xororó), sobre os filhos e muito mais.
Uma personagem real viva deixa a responsabilidade ainda maior?
Sim, mas quando conheci a Noely pessoalmente, no final de todo o processo, percebi a doçura, a força, e a potência daquela mulher. Tudo a ver com as minhas escolhas de atuação. Fiquei em paz.
E sobre a primeira esposa de Silvio Santos?
Já para fazer a Cidinha, tive um bate-papo incrível com a Cintia Abravanel, que é a primeira filha dela com o Silvio Santos. Tive o prazer de entender toda a trajetória emocional da Cidinha. Descobri o gosto musical, os trejeitos, as fraquezas, a força, como tudo começou, de onde ela veio, como foi o amor dela e do Neco (apelido carinhoso do Silvio). A Cintia foi essencial para eu conseguir fazer a Cidinha.
E para interpretar a Tarsila?
Fiz uma pesquisa grande em livros, com foco nas escolhas artísticas dela. Há muito material sobre a Semana de Arte Moderna de 1922 e seus expoentes. Tive o prazer de conhecer a sobrinha-neta dela, a Tarsilinha, que me encontrou num café e tirou todas as minhas dúvidas. Contou detalhes que eu não sabia. Enriqueceu a minha pesquisa.
Você estrela o espetáculo 'Closer' (em cartaz até dia 27 de julho no Teatro Vivo, em São Paulo), baseado no filme de grande sucesso. Faz o papel que foi da Julia Roberts. Como foi a sua preparação?
Ah, ‘Closer’ é um presente. Eu amo esse texto. É brutalmente intenso, honesto e questionador sobre as relações humanas. A personagem Anna tem camadas muito complexas. A preparação foi uma loucura! É um drama de relação, então temos sutilezas e intensidade. Mesclar isso com instinto, egoísmo, ser uma sobrevivente, até coisas mais técnicas como noções de fotografia, a profissão da personagem. Sobre a inevitável comparação com a Julia Roberts, eu a admiro demais, mas não me apego às escolhas dela. Encontrei a minha Anna com a minha verdade, do meu jeito.
Além de atriz, você é idealizadora do espetáculo e está na produção. Qual é a importância de atuar em outras frentes nas artes?
Acredito muito na autonomia artística. Quando você idealiza e produz, tem a chance de escolher o que quer dizer para o mundo — e isso é muito poderoso. É difícil, claro, tem burocracia, orçamento, pressão… Mas também há liberdade e pertencimento. Hoje, mais do que nunca, eu quero estar nos bastidores tanto quanto no palco. Isso me completa.
No segundo semestre, você estreia dois longas, ‘Por um Fio’ e ‘Festa do Peão de Barretos, o Filme’, neste último será protagonista. Como é fazer o papel principal no cinema pela primeira vez?
Um desafio enorme. O protagonismo não é só estar mais tempo em cena, é sustentar uma história inteira emocionalmente. Em ‘Festa do Peão de Barretos, o Filme’, eu e Rafael Cardoso vivemos um romance recheado de músicas e aventuras. Minha personagem, Ana Amélia, é uma menina simples, cheia de personalidade, que vive com o pai numa fazenda e tem o sonho de fazer sucesso como cantora. Precisei passar por uma rotina intensa de aulas de canto, violão e equitação. Já em ‘Por um Fio’, eu faço a Marina, (primeira) esposa do Dr. Drauzio Varella. Ela acompanha o marido, que tomou a decisão de cuidar do próprio irmão com câncer, Fernando, e as fases pesadas que ele enfrentará. O filme reflete sobre o impacto da morte no comportamento de pacientes e seus familiares. Não sou protagonista, mas a intensidade de entrega é a mesma. Busco fazer meu papel bem para a história chegar aos espectadores. Encaro essas personagens como marcos de amadurecimento. Me vejo pronta e, ao mesmo tempo, aprendendo. É um paradoxo bonito.
Como empreendedora, você ajuda sua família na administração de faculdades em Cotia e Itapevi. Como é esse lado empresarial?
Sim, é um lado que poucas pessoas conhecem. Cresci nesse ambiente da educação, já que minha mãe e meu pai sempre foram envolvidos com ensino. Estar ali, ajudando a pensar em estratégias e novos projetos é muito transformador. Eu penso no impacto da cultura e do conhecimento a longo prazo. Isso também é atuação, só que em outra esfera.
Prefere fazer novela ou, como muitos colegas de profissão, os trabalhos mais curtos, como séries no streaming?
Não tenho preconceito com nenhum formato. Acho que tudo depende da história. Eu já fiz novela, cinema, teatro e série. Se for uma novela com uma trama que me toca, com um personagem desafiador, eu vou com tudo. Mas, sim, o tempo das séries, a linguagem do streaming, me seduz muito. Tem uma coisa de ritmo, de foco, que me atrai. No fim, o que eu quero mesmo é contar boas histórias, seja em 9 episódios ou em 200 capítulos.
Usa alguma Inteligência Artificial no seu trabalho?
De forma direta, ainda não. Mas já participei de produções em que a IA foi usada na pós, na limpeza de áudio, na reconstrução de vozes, em dublagens. E tenho curiosidade. Acho que a IA pode ser uma aliada se usada com ética e inteligência emocional. Ainda estamos aprendendo a lidar com isso.
Já existem projetos que substituem atores reais por criações digitais. O que acha disso?
Sou apaixonada pelo humano. Pela falha, pela pausa, pelo olhar que treme. E acho que nenhuma criação digital vai ter isso de verdade. Pode ter técnica, mas não tem alma. Então acho que a IA pode ajudar, mas substituir? Não. A arte precisa do contato humano, da vulnerabilidade. É isso que nos conecta.