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Fuligem produzida por fogões no 3º mundo agrava aquecimento

17 abr 2009 - 15h18
(atualizado às 15h38)
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Elisabeth Rosenthal

Estados Unidos

"É difícil acreditar que isso esteja causando o derretimento das geleiras", diz Veerabhadran Ramanathan, um dos mais respeitados estudiosos do clima em todo o mundo, enquanto abria caminho por um labirinto de barracos com paredes de barro, cada um dos quais equipado com um fogão a lenha que despeja fuligem na atmosfera.

Fogões alimentados por gravetos e esterco produzem uma espessa fumaça que também polui o ambiente
Fogões alimentados por gravetos e esterco produzem uma espessa fumaça que também polui o ambiente
Foto: The New York Times

Enquanto mulheres usando saris de miríades de cores assam pão e cozinham lentilhas no final da tarde, em fogões alimentados por gravetos e esterco, as crianças tossem devido à espessa fumaça que toma suas casas. Fuligem escura reveste a palha que forma o telhado e teto. Quando o dia nasce, uma nuvem escura se estende por sobre a cena como um manto de sujeira diáfana.

Em Kohlua, no centro da Índia, onde praticamente não existem carros ou eletricidade, as emissões de dióxido de carbono, um dos principais gases responsáveis pelo efeito-estufa e aquecimento global, são próximas do zero. Mas a fuligem - também conhecida como carbono negro - de dezenas de milhares de aldeias como esta está se tornando uma grande causa de mudança climática, que até o momento não vem sendo apreciada como deveria.

Embora o dióxido de carbono possa ser a maior causa da alta na temperatura mundial, dizem os cientistas, o carbono negro ocupa um respeitável segundo posto, e recentes estudos indicam que seja responsável por 18% do aquecimento global, ante 40% para o dióxido de carbono. Reduzir as emissões de carbono negro poderia ser uma maneira relativamente barata de conter significativamente o aquecimento global -especialmente em curto prazo -, dizem os especialistas em clima.

Substituir os fogões primitivos por modelos modernos que emitem muito menos fuligem representaria uma medida paliativa muito necessária, enquanto os países enfrentam a muito mais difícil tarefa de adotar programas e desenvolver tecnologias que reduzam as emissões de dióxido de carbono geradas pela queima de combustíveis fósseis. De fato, reduzir as emissões de carbono negro é uma entre diversas medidas relativamente simples e rápidas para melhorar o clima com o uso de tecnologias existentes que os cientistas afirmam poderiam ser adotadas de imediato a fim de evitar as piores consequências do aquecimento global.

"Está claro para qualquer pessoa que se preocupe com a mudança no clima que isso teria grande impacto sobre o meio ambiente mundial", disse Ramanathan, professor de ciências do clima no Instituto Scripps de Oceanografia, que está trabalhando com o Instituto de Energia e Recursos de Nova Delhi em um projeto que ajudaria famílias pobres a adquirir fogões novos.

"Em termos de mudança climática, estamos chegando rapidamente a um precipício, e isso poderia nos dar tempo", disse Ramanathan, que saiu da Índia 40 anos atrás mas retornou ao seu país natal para o projeto. Ainda melhor, reduzir a fuligem poderia fazer efeito rapidamente. Ao contrário do dióxido de carbono, que persiste por anos na atmosfera, a fuligem só persiste por algumas semanas. A adoção de fogões que geram pouca fuligem removeria rapidamente os efeitos do carbono negro sobre o aquecimento global, enquanto o fechamento de uma usina de energia acionada a carvão requer anos para a redução substancial das concentrações de dióxido de carbono.

Mas a consciência quanto ao papel do carbono negro no aquecimento global surgiu tão recentemente que ele nem mesmo foi mencionado como agente de aquecimento no relatório de 2007 pelo Painel Intergovernamental sobre a Mudança Climática que definiu como "inequívocas" as provas de aquecimento global. Mark Jacobson, professor de engenharia ambiental na Universidade Stanford, disse que o fato de o carbono negro não estar incluído nos esforços mundiais de combate ao aquecimento era "bizarro", mas "reflete, em certa medida, até que ponto essa idéia é nova". As Nações Unidas e o governo federal dos Estados Unidos estão tentando descobrir como incluir o carbono negro nos programas de combate à mudança do clima.

Na Ásia e na África, os fogões são responsáveis pela maior parte do carbono negro, ainda que motores diesel e usinas de energia acionadas a carvão também o produzam. Nos Estados Unidos e Europa, as emissões de carbono negro já foram significativamente reduzidas pelo uso de filtros e sistemas de remoção.

As partículas de fuligem aquecem o ar e derretem o gelo ao se depositarem sobre geleiras e absorverem o calor do sol. Um estudo recente apontou que elas poderiam responder por até metade do aquecimento na região ártica. Embora não tenham o alcance mundial dos gases causadores do efeito-estufa, elas se deslocam. Fuligem gerada na Índia foi localizada nas ilhas Maldivas e no altiplano do Tibete; fuligem norte-americana foi localizada no Ártico.

Os médicos há muito protestam contra o carbono negro por seus efeitos de saúde devastadores sobre os países pobres. A combinação de benefícios ambientais e de saúde significa que reduzir a fuligem "oferece retorno muito elevado pelo investimento", disse Erika Rosenthal, advogada da Earth Justice, uma organização ambiental de Washington. "Agora, interessa a todos tratar de questões como a dos fogões - e não só porque eles estão causando a morte prematura de milhares de mulheres e crianças".

Tradução: Paulo Migliacci

The New York Times
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