Periferia de São Paulo não viu a cor do dinheiro da Lei Rouanet na última década

Levantamento cruzou valores e endereços. Bairros centrais concentram recursos, enquanto 26 distritos não captaram nada

23 jul 2025 - 00h59
(atualizado às 21h28)
Resumo
A pesquisa é fruto de uma articulação entre organizações culturais e pesquisadores com ampla atuação em políticas públicas e no fomento à arte e cultura negra e periférica. Foi coordenada pelo Observatório Ibira 30 e Universidade Federal do ABC (UFABC), com apoio da Fundação ABH.
Jardim Ângela, extremo da zona sul de São Paulo, não captou recursos da Lei Rouanet nos últimos dez anos.
Jardim Ângela, extremo da zona sul de São Paulo, não captou recursos da Lei Rouanet nos últimos dez anos.
Foto: Irene Quintáns

Estudo inédito que cruza valores captados e locais de projetos aprovados pela Lei Rouanet mostram que a periferia de São Paulo ficou praticamente excluída do fomento na última década. É o que mostra o relatório Lei Rouanet e a Periferia, conduzida por instituições como a Universidade Federal do ABC (UFABC), cobrindo de 2013 a 2024.

Nesse período, quase 90% do valor captado ficou concentrado em uma pequena parcela do território: distritos centrais, de alta renda, com infraestrutura consolidada e redes de apoio empresarial bem estruturadas. As periferias — onde vive mais da metade da população paulistana — seguem praticamente excluídas do mapa do fomento cultural.

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O distrito de Pinheiros liderou a captação, concentrando 17,7%. Sabe quanto dá, por cabeça? O estudo mostra: mais R$ 18 mil investido em cultura para cada morador. Seguem em semelhante situação confortável Jardim Paulista, Consolação e República. E as periferias?

Regiões como M’Boi Mirim, mesmo com mais de 570 mil habitantes, têm infraestrutura cultural extremamente limitada e quase nenhuma presença nos mecanismos da Lei Rouanet.
Foto: Edson Lopes Jr./SECOM

26 distritos na capital paulista que não captaram absolutamente nada nos últimos dez anos de Lei Rouanet. São locais como Jardim Ângela, Perus, São Mateus, Jaçanã. “Ao adotar esse recorte territorial, o relatório evidencia que a exclusão cultural nas periferias não é exceção, mas regra”, afirma o relatório.

As periferias estão de fora, mas tentam entrar na Lei Rouanet. Dos 96 distritos da cidade de São Paulo, somente oito não apresentaram projetos. Entre os aprovados, 14 distritos não conseguiram captar nada em dez anos, o que corresponde a 62 propostas.

Instituto Tomie Otake, em Pinheiros, bairro que concentrou a captação via Lei Rouanet na última década em São Paulo.
Foto: Divulgação

Cruzando dados e locais: como foi realizado o estudo

Para relacionar população, localização e valores, o relatório cruzou três fontes. A primeira é a base com informações sobre propostas, projetos e outros indicadores da Lei Rouanet, o Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (SALIC).

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A segunda fonte foram os números de pessoas jurídicas, através dos quais se descobre o endereço de quem captou recursos. Os valores e endereços foram então relacionados ao mapa digital da cidade de São Paulo, chamado GeoSampa.

Através dele, foi possível descobrir a qual distrito pertence o endereço de quem captou pela Lei Rouanet, e a distribuição geográfica do fomento cultural na cidade.

A capital paulista é também o centro da disparidade nacional, abocanhando um terço do orçamento da Lei Rouanet, quase 90% concentrado em distritos centrais. No ano passado, a cidade de São Paulo captou, sozinha, mais do que todas as regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sul juntas.

Quanto mais escuro, mais recursos captados. A área mais escura concentra 87,86% nos últimos dez anos em São Paulo.
Foto: Reprodução

Área 1 – Regiões centrais com menor vulnerabilidade social

Valor captado: R$ 5,25 bilhões

% do total captado: 88,86%

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% da população da cidade: 17,21%

Captação per capita: R$ 2.660,00

Área 2 – Distritos com média vulnerabilidade, fora do centro expandido

Valor captado: R$ 373 milhões

% do total captado: 6,24%

% da população da cidade: 31,13%

Captação per capita: R$ 104,00

Área 3 – Distritos periféricos com alta vulnerabilidade social

Valor captado: R$ 83 milhões

% do total captado: 1,38%

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% da população da cidade: 50,67%

Captação per capita: R$ 14,20

Área 4 – Bolsões de vulnerabilidade dentro do centro expandido

Valor captado: R$ 270 milhões

% do total captado: 4,51%

% da população da cidade: 0,99%

Captação per capita: R$ 2.378,00

Fonte: Visão do Corre
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