Com os avanços da vacinação contra o HPV, o Brasil pode estar mais perto de eliminar um dos cânceres mais letais entre as mulheres. A nova diretriz nacional que incorpora o teste molecular de DNA-HPV promete mudar a história da prevenção — mas ainda há desafios no caminho.
Saiba a seguir mais sobre isso com informações do Dr. Warley Aguiar Simões, Médico de Família e Comunidade:
Um novo tempo para a prevenção
Nos últimos anos, uma revolução silenciosa vem acontecendo, não nas manchetes, mas na vida de milhões de pessoas: a vacinação contra o papilomavírus humano, o HPV. Desde que o SUS incorporou o imunizante em 2014, o país passou a integrar a vanguarda mundial da medicina preventiva.
Agora, com os avanços recentes e a ampliação dos protocolos nacionais, o que parecia um sonho distante — tornar o câncer do colo do útero uma doença rara — começa a se desenhar como uma possibilidade concreta.
Mas será que já estamos próximos dessa conquista? Para responder, é preciso olhar para os cinco principais motivos que fazem da vacina contra o HPV uma das ferramentas mais poderosas da saúde pública contemporânea.
1. Prevenir o câncer do colo do útero: cortar o mal pela raiz
O grande diferencial da vacinação contra o HPV é atacar a causa, e não apenas o efeito. Em mais de 95% dos casos de câncer do colo do útero, o vírus é o agente responsável. Em países como o Reino Unido e a Suécia, onde a cobertura vacinal é alta, já se observam reduções de até 90% nas lesões pré-cancerosas e 83% nos casos de câncer cervical entre mulheres vacinadas antes da adolescência.
O Brasil também deu um passo decisivo em julho de 2025, com a publicação das novas Diretrizes Brasileiras para o Rastreamento do Câncer do Colo do Útero, aprovadas pela Portaria Conjunta SAES/SECTICS nº 13. O documento oficializa o teste molecular de DNA-HPV como método principal de rastreamento, capaz de identificar o vírus antes mesmo de causar qualquer alteração celular. Essa integração entre vacinação e rastreamento precoce é o pilar central da estratégia global de eliminação da doença.
2. Reduzir o risco de outros cânceres: um efeito dominó benéfico
O HPV não se limita ao colo do útero. Ele está associado a tumores de vulva, vagina, pênis, ânus e orofaringe — tanto em mulheres quanto em homens. Por isso, ampliar a vacinação para meninos e meninas multiplica a proteção e reduz a circulação do vírus em toda a comunidade.
Pesquisas internacionais mostram que homens vacinados também apresentam menor risco de desenvolver cânceres relacionados ao HPV. Assim, vacinar é um ato de equidade em saúde — uma forma de proteger a todos, sem distinção.
3. Evitar verrugas genitais: menos dor, mais dignidade
Os tipos 6 e 11 do HPV, responsáveis por cerca de 90% dos casos de verrugas genitais, também estão cobertos pelas vacinas disponíveis no SUS. Embora essas lesões não causem câncer, são dolorosas, recorrentes e afetam profundamente a autoestima e o bem-estar emocional das pessoas.
Ao prevenir o aparecimento dessas verrugas, a vacinação traz um benefício direto à qualidade de vida — reduzindo o estigma, o desconforto e o impacto psicológico associados à infecção.
4. Vacinar cedo é garantir proteção máxima
O ideal é vacinar antes do início da vida sexual, quando o corpo ainda não teve contato com o vírus. Nessa fase, a resposta imunológica é mais forte e a eficácia da vacina chega a quase 100% contra os tipos cobertos.
No Brasil, o SUS oferece gratuitamente a vacina para meninas e meninos de 9 a 14 anos. Campanhas escolares e ações nas unidades básicas de saúde têm papel fundamental para garantir que essa faixa etária seja plenamente alcançada.
5. A força da imunidade coletiva
Quando a vacinação atinge alta cobertura, toda a comunidade se beneficia — mesmo quem não foi vacinado. É o chamado efeito de proteção coletiva, ou "imunidade de rebanho".
Ao reduzir a circulação do vírus, a transmissão se torna cada vez mais rara. Essa dinâmica, somada ao rastreamento com o teste de DNA-HPV, pode levar o Brasil a atingir o objetivo traçado pela Organização Mundial da Saúde (OMS): menos de 4 casos de câncer do colo do útero por 100 mil mulheres até o fim da década.
Desafios que ainda precisamos enfrentar
Mesmo com os avanços científicos e as políticas públicas consolidadas, persistem obstáculos importantes:
- Cobertura vacinal desigual: A meta de 90% da população-alvo ainda não foi atingida; em algumas regiões, a adesão não chega a 60%.
- Desinformação: Fake news e tabus sobre sexualidade ainda afastam famílias da imunização.
- Acesso ao rastreamento: A ampliação do teste de DNA-HPV precisa se tornar realidade em todas as regiões do país.
- Sustentabilidade política: Campanhas educativas e financiamento contínuo são essenciais para manter os resultados a longo prazo.
Um futuro possível — e próximo
Transformar o câncer do colo do útero em uma doença rara é uma meta ambiciosa, mas viável. Temos as ferramentas, o conhecimento e o compromisso da ciência. O que falta é garantir que a proteção chegue a todos, em cada canto do país.
Vacinar-se é, acima de tudo, um ato de autocuidado e de amor pela vida.
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