Oito minutos cronometrados foram suficientes para que criminosos experientes invadissem o Museu do Louvre, em Paris, e levassem joias da coroa francesa de valor histórico incalculável. O roubo, ocorrido na manhã de domingo (19), expôs falhas graves na segurança dos museus franceses e provocou uma reação imediata do governo, que prometeu reformas estruturais e reforço na proteção do patrimônio cultural.
O Museu do Louvre, o mais visitado do mundo, permanece fechado pelo segundo dia consecutivo após um roubo cinematográfico ocorrido na manhã de domingo (19). Quatro criminosos mascarados invadiram a Galeria Apolo, que abriga as joias da coroa francesa, utilizando um guindaste e um elevador de carga para acessar o primeiro andar do prédio. Com motosserras, quebraram vitrines de alta segurança e fugiram em motocicletas, levando oito peças do século XIX — entre elas tiaras, colares e brincos de diamantes, esmeraldas e safiras.
A operação durou apenas oito minutos e não deixou feridos, mas causou enorme repercussão internacional. Uma das joias, a coroa da imperatriz Eugênia, foi encontrada danificada nas imediações do museu.
A promotora de Paris, Laure Beccuau, afirmou que os autores podem ter agido a mando de um colecionador ou com o objetivo de desmontar as peças para lavagem de dinheiro. Segundo especialistas, as joias são praticamente impossíveis de revender em seu estado atual.
O presidente francês, Emmanuel Macron, classificou o roubo como um "ataque ao patrimônio histórico" do país e prometeu que os responsáveis serão levados à Justiça. O ministro da Justiça, Gérald Darmanin, reconheceu falhas graves na segurança e disse que o episódio projeta uma imagem "deplorável" da França. A ministra da Cultura, Rachida Dati, afirmou que o crime foi "profissional e silencioso", e que há décadas os museus franceses enfrentam negligência em investimentos na segurança.
Em um pré-relatório consultado pela AFP nesta segunda-feira, o Tribunal de Contas da França — órgão responsável por fiscalizar o uso de recursos públicos — já criticava, antes mesmo do roubo, o "atraso persistente" do Museu do Louvre na implementação de equipamentos de segurança para proteger seu acervo.
A presidente do museu, Laurence Des Cars, será convocada a prestar esclarecimentos. Ela será ouvida nesta quarta-feira (22) pela Comissão de Assuntos Culturais do Senado francês, segundo o presidente da comissão, Laurent Lafon, que afirmou querer "explicações após o roubo".
A investigação mobiliza cerca de 60 agentes da Brigada de Repressão ao Banditismo e do Escritório Central de Combate ao Tráfico de Bens Culturais. Imagens de câmeras de segurança e vídeos feitos por visitantes estão sendo analisados. Um dos suspeitos aparece usando um colete amarelo, já apreendido pela polícia.
Vulnerabilidade dos museus franceses
O roubo reacendeu o debate sobre a vulnerabilidade dos museus franceses. O relatório do Tribunal de Contas, ainda não publicado oficialmente, aponta que 75% das salas da ala Richelieu e 60% da ala Sully não possuem câmeras de vigilância. Além disso, o Louvre perdeu 200 agentes de segurança nos últimos 15 anos, enquanto o número de visitantes aumentou em 50%.
O governo francês anunciou uma revisão urgente dos protocolos de segurança em todos os museus do país. A CGT Cultura, sindicato que representa trabalhadores do setor, exige o reforço imediato de pessoal e investimentos em tecnologia. O projeto "Louvre Nouvelle Renaissance", lançado em janeiro, prevê reformas avaliadas entre € 700 e 800 milhões ao longo de uma década, mas apenas uma parte será financiada pelo Estado.
Enquanto isso, o museu segue fechado, sem previsão de reabertura. Visitantes que haviam comprado ingressos estão sendo reembolsados. A cena do crime permanece isolada para perícia, e a busca pelos criminosos continua.
Monalisa já foi roubada, assim como outras obras famosas
Antes do roubo das joias da coroa francesa no Louvre, outros museus ao redor do mundo já haviam sido alvo de furtos espetaculares. Em 1911, a Mona Lisa foi levada por um vitreiro italiano que havia trabalhado no museu e manteve a obra escondida por dois anos. Em 1972, o Museu de Belas Artes de Montreal perdeu 18 pinturas e dezenas de joias em um assalto armado — a maioria das peças nunca foi recuperada. Já em 1990, o Museu Isabella Stewart Gardner, em Boston, foi enganado por falsos policiais que roubaram 13 obras de mestres como Rembrandt e Vermeer, num prejuízo estimado em meio bilhão de dólares.
Em 2003, o museu de Viena perdeu a peça renascentista, "O Saleiro", de Benvenuto Cellini, avaliada em mais de € 50 milhões, recuperada três anos depois enterrada numa floresta. No Museu Munch, em Oslo, dois homens armados roubaram em 2004 os quadros "O Grito" e "A Madona" em plena luz do dia, diante de visitantes. As obras foram encontradas danificadas dois anos depois. Em 2010, o Museu de Arte Moderna de Paris teve cinco obras de Picasso, Matisse e outros artistas furtadas após falhas nos sensores de movimento — nenhuma delas foi recuperada.
Mais recentemente, em 2019, o museu Grünes Gewölbe, em Dresden, na Alemanha, foi invadido por um grupo ligado a um clã criminoso de Berlim, que levou joias do século XVIII avaliadas em mais de € 113 milhões. Parte do acervo foi devolvida após acordos judiciais, mas algumas peças estavam danificadas ou incompletas. Esses episódios mostram que, apesar de avanços tecnológicos, museus continuam vulneráveis a ações ousadas e bem planejadas — como a que, em apenas oito minutos, mudou para sempre a história do Louvre.
Itália reforça segurança com IA
No dia seguinte ao roubo das joias da coroa francesa no Museu do Louvre, o Ministério da Cultura da Itália anunciou o desenvolvimento de sistemas de segurança baseados em inteligência artificial (IA), capazes de identificar comportamentos suspeitos em torno de obras de valor inestimável. Em comunicado oficial, o governo italiano afirmou que "a proteção do patrimônio cultural passou a ser uma prioridade absoluta", embora não tenha mencionado diretamente o furto em Paris.
A iniciativa envolve dois grandes projetos experimentais voltados ao patrimônio arqueológico, financiados por mais de € 70 milhões em recursos da União Europeia. Os sistemas utilizarão IA, análise de big data e ferramentas de cibersegurança para aprimorar a vigilância e a prevenção de crimes em museus e sítios históricos.
Segundo o ministério, os novos sistemas serão capazes de realizar análises de vídeo inteligentes, detectar movimentos e comportamentos anormais com alta precisão e emitir alertas preditivos em tempo real, respeitando as normas de privacidade. A medida foi anunciada poucas horas após o "roubo do século" no Louvre.
Com AFP