O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ainda não se manifestou após a Procuradoria-Geral da República (PGR) pedir a condenação dele e de seus ex-ministros e militares que, segundo a acusação, integraram o ‘núcleo crucial’ do plano de golpe de Estado. Antes da divulgação da manifestação de 517 páginas, ele fez uma postagem nas redes sociais e afirmou ser alvo dos adversários.
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"O sistema nunca quis apenas me tirar do caminho. A verdade é mais dura: querem me destruir por completo - eliminar fisicamente, como já tentaram - para que possam, enfim, alcançar você. O cidadão comum. A sua liberdade. A sua fé. A sua família. A sua forma de pensar. Sem que reste qualquer possibilidade de reação", escreveu.
Segundo o procurador Paulo Gonet, “O grupo, liderado por Jair Messias Bolsonaro e composto por figuras-chave do governo, das Forças Armadas e de órgãos de inteligência, desenvolveu e implementou plano progressivo e sistemático de ataque às instituições democráticas, com a finalidade de prejudicar a alternância legítima de poder nas eleições de 2022 e minar o livre exercício dos demais poderes constitucionais, especialmente do Poder Judiciário”.
Gonet sustentou nas alegações que a denúncia por ele apresentada “não se baseou em conjecturas ou suposições frágeis”. O procurador-geral menciona que os investigadores obtiveram diversas provas porque “a organização criminosa fez questão de documentar quase todas as fases de sua empreitada”.
Durante depoimento ao STF em junho, Bolsonaro negou as acusações e afirmou algumas vezes ter seguido 'dentro das quatro linhas'. “Muitas vezes me revoltava, falando palavrão. Falava o que não devia falar. Sei disso. Mas, no meu entender, fiz aquilo que tinha de ser feito”, disse, em um dos momentos, sempre com Constituição Federal em cima de sua mesa.
Seguindo o mesmo tom, Bolsonaro minimizou a reunião com ministros para discutir a suposta minuta de golpe. “Não existia essa vontade. O sentimento de todo mundo era de que não tínhamos mais nada o que fazer. Se tivesse que ser feito alguma coisa seria lá atrás, via Congresso Nacional. Não foi feito, então, tínhamos de entubar o resultado das eleições”, declarou para a Primeira Turma do STF.
Já sobre o fato dele não ter passado a faixa presidencial para Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como é de praxe em mudanças de governos, o motivo foi pautado em vergonha. “Eu não ia me submeter à maior vaia da história do Brasil, o senhor há de concordar comigo”, afirmou.
O que mais Bolsonaro falou sobre a denúncia do golpe?
Desde o indiciamento pela PF, o ex-presidente sempre negou as acusações em entrevista ao portal Metrópoles, em 21 de novembro. Bolsonaro afirmou que Moraes conduzia o inquérito de forma “criativa”. “Alexandre de Moraes conduz todo o inquérito, ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e tem uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que não diz a lei”, afirmou o ex-presidente. “É na PGR que começa a luta”, completou Bolsonaro, afirmando que aguardaria informações de seus advogados sobre o teor do relatório final da PF.
No dia seguinte, em entrevista à revista Veja, Bolsonaro negou ter conhecimento sobre o plano de assassinato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do vice Geraldo Alckmin (PSB) e do ministro do STF Alexandre de Moraes.
O “Punhal Verde e Amarelo” foi planejado pelo general Mário Fernandes, secretário-executivo da Secretaria-Geral da Presidência. A pasta é conhecida como a “cozinha do Palácio do Planalto”, dada a proximidade com o chefe do Executivo federal. As execuções contariam com o apoio de “kids pretos”, como são conhecidos os militares das Forças Especiais do Exército Brasileiro.
Segundo o ex-presidente, milhares de pessoas trabalham no Planalto, de modo que ele não poderia ter conhecimento sobre todas as atividades do prédio. “Havia mais ou menos 3.000 pessoas naquele prédio. Se um cara bola um negócio qualquer, o que eu tenho a ver com isso?”, disse Bolsonaro à Veja em 22 de novembro. “Discutir comigo um plano para matar alguém, isso nunca aconteceu”, disse, acrescentando que “jamais compactuaria com qualquer plano para dar um golpe”.
Em 25 de novembro, Bolsonaro desembarcou em Brasília para se reunir com seus representantes na Justiça. Em entrevista coletiva no aeroporto da capital federal, o ex-presidente disse que estudou “todas as medidas possíveis dentro das quatro linhas” antes da posse de Lula, então presidente eleito, mas que “nunca houve discussão de golpe”.
“Vamos tirar da cabeça isso aí. Ninguém vai dar golpe com um general da reserva e meia dúzia de oficiais. Da minha parte nunca houve discussão de golpe”, disse o ex-presidente. “Se alguém viesse conversar sobre golpe comigo eu ia dizer: ‘Tá, tudo bem, e o after day (dia seguinte)? Como fica o mundo perante a nós? Agora todas as medidas possíveis dentro das quatro linhas, dentro da Constituição, eu estudei”, afirmou o ex-chefe do Executivo.
Durante a entrevista coletiva, Bolsonaro argumentou que não poderia ter incorrido no crime de golpe de Estado porque o ilícito requer a deposição de um governo constituído. O ex-presidente defendeu que, como o governo federal à época dos fatos investigados ainda era o seu, não poderia haver golpe de Estado, pois ele, enquanto presidente, não provocaria sua própria deposição. “Golpe existe em cima de uma autoridade constituída, que já tomou posse. O Lula já tinha tomado posse? Só se fosse em cima de mim o golpe”, disse Bolsonaro.
O argumento do ex-presidente ignora o conceito de autogolpe, que descreve uma autoridade que, empossada no cargo por meios legais, força uma ruptura institucional para obter mais poderes. Em 1937, por exemplo, Getúlio Vargas rompeu com um governo constitucional do qual estava à frente para instituir a ditadura do Estado Novo (1937-45).
Um autogolpe voltou a ser tentado no País em 1961, com a renúncia de Jânio Quadros. A tese mais aceita por historiadores é a de que o presidente renunciou ao Executivo com o objetivo de retornar ao cargo por aclamação popular, com a qual forçaria a ampliação de suas atribuições. A tentativa acabou frustrada.
Em 28 de novembro, Bolsonaro afirmou em entrevista ao portal UOL que se considerava “perseguido” pela investigação por tentativa de golpe e, por isso, não descartava um refúgio em uma embaixada. “Embaixada, pelo que eu vejo a história do mundo, né, quem se vê perseguido pode ir para lá”, disse o ex-presidente. Apesar de cogitar um asilo diplomático, o ex-chefe do Executivo federal afirmou que, se “devesse alguma coisa, estaria nos Estados Unidos”, e não em território brasileiro.
‘Sensação da PF na porta’
Com três indiciamentos pela Polícia Federal, Jair Bolsonaro passou a comentar sobre o risco de ser preso. Além do inquérito por tentativa de golpe, o ex-presidente foi imputado pela PF nas investigações por fraude em seu cartão de vacinas e no caso das joias da Arábia Saudita.
Em entrevistas, o ex-presidente avaliou sua prisão como iminente. Em 22 de janeiro, ao canal do YouTube Auriverde Brasil, Bolsonaro disse acordar todos os dias “com a sensação da PF na porta”.
O ex-presidente voltou a falar sobre o temor de um mandado da prisão da PF no dia 29 de janeiro, em entrevista à Bloomberg, dos Estados Unidos. Na ocasião, afirmou estar “preparado” para o momento. “Durmo bem, mas já estou preparado para ouvir a campainha tocar às 6h da manhã: ‘É a Polícia Federal!’”, afirmou. (*Com informações do Estadão Conteúdo)