A incrível trégua de Natal de 1914 durante a Primeira Guerra Mundial

21 dez 2025 - 13h41

Em 24 de dezembro de 1914, alemães e britânicos deixaram suas trincheiras para cantar canções festivas e confraternizar, num breve momento de paz.A Primeira Guerra Mundial já durava cinco meses em dezembro de 1914. Milhões de soldados se enfrentavam nas trincheiras da Frente Ocidental, em meio a campos minados e emaranhados de arame farpado, às vezes a apenas 30 metros de distância uns dos outros. Essa zona de combate se estendia do Canal da Mancha até a fronteira suíça, passando pela Bélgica e pela França.

Os soldados suportavam a extenuante guerra de posições em suas trincheiras, onde ratos, piolhos, frio e rações precárias os debilitavam e a morte era uma companheira constante. Entre as linhas inimigas estava a terra de ninguém, onde os corpos de seus camaradas caídos jaziam, inacessíveis.

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Da certeza da vitória iminente à desilusão

Naqueles primeiros meses a guerra já havia ceifado centenas de milhares de vidas de ingleses, franceses, belgas e alemães - dilacerados por granadas, alvejados por metralhadoras ou mortos em lutas corpo a corpo com baionetas.

Os soldados haviam seguido ao campo de batalha eufóricos, certos de uma vitória iminente. Eles estariam de novo em casa com suas famílias já no Natal - assim prometera o imperador Guilherme 2º, da Alemanha. Os franceses e britânicos também acreditaram nas promessas de seus líderes de um rápido retorno.

Mas, na frente de batalha, a desilusão logo tomou conta deles. Todos os dias os soldados encaravam a morte, mesmo no dia 24 de dezembro. Como sentir o espírito natalino?

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Noite feliz, noite feliz...

Então algo inesperado acontece: no meio de uma noite gelada de dezembro, um soldado alemão numa trincheira perto da cidade belga de Ypres começa a cantar "noite feliz, noite feliz". Logo outros se unem a ele.

Do outro lado, os britânicos mal conseguem acreditar no que ouvem. Silent night? Essa canção natalina também é conhecida na Inglaterra. Inicialmente os britânicos desconfiam dos "hunos", como chamam os alemães. Seria uma isca para atraí-los para uma cilada?

Mas então eles aplaudem e começam a cantar junto. Os alemães respondem com merry Christmas e gritam "we not shoot, you not shoot!". Os primeiros corajosos de ambos os lados saem das trincheiras, dirigem-se à terra de ninguém, entre os corpos de seus camaradas mortos, e se dão as mãos.

Cenas semelhantes se repetem por toda a Frente Ocidental. Por exemplo perto de Fleurbaix, nas proximidades do Canal da Mancha. Lá soldados alemães colocam pinheiros decorados na beira de suas trincheiras. As luzes brilhantes vêm de velas, não de disparos de armas de fogo.

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Árvores de Natal, presentes e futebol

O alto comando do Exército Alemão enviara milhares de pequenas árvores para a linha de frente para elevar a moral das tropas, pois estava ciente do quão difícil era para os soldados estarem longe de suas famílias no Natal.

Mas a luz brilhante de velas, visível para o inimigo? Com isso, os soldados estavam desrespeitando a ordem de blackout durante a guerra. Mas os soldados pareciam não se importar mais com isso.

"Parece inacreditável o que vou lhes contar, mas é a mais pura verdade", escreveu o soldado Josef Wenzl, do 16º Regimento de Infantaria de Reserva da Baviera, aos seus pais em 28 de dezembro de 1914. "Entre as trincheiras, os inimigos que tanto se odeiam se reúnem ao redor de árvores de Natal e cantam canções natalinas. Jamais me esquecerei dessa cena."

Naquela véspera de Natal, milhares trocam pequenos presentes: corned beef por Christstollen, salsichas por pudim de Natal. Os soldados dividem vinho, rum e cigarros e mostram uns aos outros fotos de suas noivas, esposas e filhos. Trocam botões de uniforme como lembranças. A maioria é britânica e alemã, mas alguns soldados franceses também interrompem os combates para trazer seus estoques de champanhe para o Natal.

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Os soldados até mesmo jogam futebol. As traves são marcadas com capacetes ou bonés militares. Uma esfera de palha ou até mesmo uma lata de conserva têm que servir de bola. Mas, não raro, os britânicos conseguem uma verdadeira bola de couro. "Enviamos alguém de volta à nossa posição de reserva de bicicleta", escreveu um soldado da Guarda Escocesa aos pais, "e ele buscou a bola."

Cessar-fogo de curta duração

E outra coisa ocupa os soldados em ambos os lados da frente: finalmente enterrar seus camaradas caídos na terra de ninguém. São momentos de humanidade numa guerra cruel.

"Não sei quanto tempo isso vai durar, mas, de qualquer forma, os canhões voltarão a silenciar no dia de Ano Novo porque os alemães querem ver nossas fotos", escreveu o jovem oficial Alfred Dougan Chater numa carta para sua mãe.

Mas em nem toda a Frente Ocidental havia o desejo de confraternização com o inimigo: em alguns lugares, a guerra continuou. Isso estava totalmente de acordo com os planos dos oficiais de alta patente de ambos os lados, que não estavam nada entusiasmados com a "trégua de Natal". Se dependesse deles, o gesto não se repetiria - e passou a ser punido como "alta traição".

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"É terrível", escreveu um soldado alemão para casa mais tarde, "que num dia possamos interagir tão pacificamente uns com os outros e, no dia seguinte, tenhamos que nos preocupar em nos matar uns aos outros."

A Primeira Guerra Mundial custou a vida de 9 milhões de soldados e de inúmeros civis. Josef Wenzl também morreu em combate em 6 de maio de 1917 - dois anos e meio depois de escrever aos pais: "O Natal de 1914 será inesquecível para mim".

A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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