Policiais militares foram afastados no Rio Grande do Norte após denúncia de agressão à advogada Edricélia Silva, que afirmou ter sido agredida enquanto tentava intervir em um caso na Festa do Caju; a OAB manifestou repúdio e cobra apuração rigorosa do caso.
A Secretaria da Segurança Pública e da Defesa Social do Rio Grande do Norte abriu uma investigação interna e afastou policiais militares do trabalho nas ruas após a advogada Edricélia Silva denunciar ter sido agredida na madrugada do último domingo, 30, durante a Festa do Caju, em Serra do Mel. A informação foi confirmada à OAB do estado durante uma reunião na tarde desta quarta-feira, 3.
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Ao Terra, Edricélia afirmou que tentava intervir ao ver uma mulher sendo arrastada por cerca de dez PMs no evento.“Quando olhei para o lado, vi cerca de dez policiais arrastando uma mulher para uma área escura da festa. No momento, só consegui pensar em ajudar. Se fosse comigo, eu iria querer que alguém fizesse o mesmo", relatou.
De acordo com ela, ao se identificar como advogada e questionar a ausência de uma policial feminina na revista, os agentes passaram a agredi-la, a arrastaram para fora da festa e confiscaram seu celular e sua carteira. “Eles me arrastaram pelo braço junto com a outra mulher. Tomaram minha carteira e meu celular. Cada vez que eu tentava pegar o telefone ou pedir meus direitos, levava um tapa no rosto. Minha orelha ficou roxa", relembrou.
Segundo a advogada, ela também recebeu golpes de cacetete nas pernas, foi colocada de joelhos diante de uma parede na delegacia, sofreu insultos e permaneceu algemada enquanto pedia que os policiais comunicassem à OAB sua detenção, o que não aconteceu.
“Me colocaram de joelhos, de frente para a parede. Meu braço quase foi quebrado. Eles diziam que eu era burra, que a OAB estava fraca, que qualquer um entrava. Me chamaram de ‘rapariga’. Era um festival de humilhações", disse a advogada.
A advogada afirma que os policiais só pararam de bater quando ela mencionou a palavra “tortura” e apontou que estava sendo alvo de violência por ser mulher e ser preta. Apesar do medo, ela afirmou que decidiu tornar o caso público para proteger outras mulheres. "Não posso deixar que vire só mais um caso. Eu fiz um juramento. Quando apresento minha carteira, estou no exercício da profissão, mesmo numa festa. Não sou eu que tenho que me esconder. Quem tem que se envergonhar são eles", afirmou ela.
Nesta quarta-feira, a OAB informou que houve uma reunião reunindo a vítima, representantes da Seccional, da OAB Mossoró, da Secretaria da Segurança Pública, das Polícias Militar e Civil, da Procuradoria-Geral do Estado e da Secretaria das Mulheres.
“Nosso objetivo com a reunião foi trazer ao Estado providências imediatas a serem adotadas. Não só a instauração do procedimento, como também o afastamento dos envolvidos e a formatação de um acordo de cooperação para que possamos contribuir com a formação dos agentes de segurança e evitar que fatos como esse voltem a acontecer”, explicou Carlos Kelsen, presidente da OAB RN.
O Terra entrou em contato com a Secretaria da Segurança Pública e da Defesa Social do Rio Grande do Norte e com a Polícia Militar, mas não obteve nenhum retorno.
Afronta direta à dignidade, diz OAB
Em nota pública, a Ordem dos Advogados do Brasil no Rio Grande do Norte (OAB/RN) manifestou indignação e repúdio diante da agressão sofrida pela advogada e afirmou que o caso não se configura apenas como uma violação ao Estatuto da Advocacia, mas também como uma afronta direta à dignidade da pessoa humana.
A OAB acrescentou que seguirá cobrando todos os órgãos e instituições para garantir a completa apuração dos fatos, a preservação das provas e a responsabilização de todos os agentes públicos envolvidos em condutas ilegais ou incompatíveis com a Constituição e que representem desrespeito às prerrogativas da advocacia.
A entidade informou ainda que a Seccional Potiguar convocará toda a classe para a realização de um Desagravo Público contra os policiais envolvidos e ressaltou que não permitirá que violações flagrantes às prerrogativas da advocacia permaneçam impunes.
"A OAB/RN ressalta que nenhuma advogada ou advogado pode ser intimidado, agredido, cerceado ou impedido no exercício de sua atividade profissional, especialmente ao atuar na defesa dos Direitos Humanos, na proteção de mulheres em situação de vulnerabilidade ou na fiscalização de abordagens policiais. Qualquer violação às prerrogativas da advocacia constitui afronta direta ao Estado Democrático de Direito", disse a instituição.
A Seccional Potiguar, a Subseção de Mossoró e a Comissão Nacional de Prerrogativas do CFOAB informaram que seguirão acompanhando o caso em conjunto.