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'Tudo é passageiro': mulher de 54 anos conta a jornada com o Alzheimer precoce

Lina Nonaka e o marido, Renato Ikegami, enfrentam uma rotina de esquecimentos e ressignificam a vida em pequenos gestos

21 set 2025 - 05h59
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Resumo
Lina Nonaka, diagnosticada com Alzheimer precoce aos 54 anos, enfrenta desafios diários com o apoio da família, ressignificando a vida por meio do acolhimento, positividade, memórias afetivas e uma rotina adaptada.
Lina Nonaka e o marido, Renato Ikegami
Lina Nonaka e o marido, Renato Ikegami
Foto: Arquivo pessoal

Lina Nonaka olhava as prateleiras cheias do supermercado. De repente, não lembrava o que foi ali comprar. Voltou para casa com as sacolas cheias -- mas sem o que realmente precisava. Renato, o marido, lembra que esse foi um dos primeiros sinais de que algo estava errado. "Ela comprava tudo, menos o que era necessário. A gente achava que era estresse, que era cansaço do trabalho. Mas foram se acumulando esquecimentos, desatenções", conta ao Terra.

Nutricionista de formação e profissional de marketing, Lina sempre viveu entre projetos, metas e compromissos. Dormia pouco, trabalhava muito. Até que os lapsos se tornaram insistentes. "Será que eu tive consciência disso?", questiona ela hoje, aos 54 anos, ao revisitar a memória fragmentada de quando os primeiros sintomas começaram, por volta dos 50.

Lina percebeu que algo estava errado quando se perdeu no trabalho, enquanto atuava analisando e prestando consultoria a uma empresa: "Eu não estava dando conta. Literalmente me perdia. Comos se realmente, as ideias não se ligassem. Como se a conexão caísse no meio".

Seus colegas de trabalho também levantaram suspeitas de que algo estava errado e, com isso, ela buscou atendimento médico. O diagnóstico veio após uma avaliação neuropsicológica, em 2024. "Nos exames, foi constatado que ela está com Alzheimer", conta Renato Norio Ikegami, seu marido.

O choque foi inevitável. "A gente tomou um susto. Pela idade tão nova... é bem precoce. Infelizmente, não tem cura, não tem medicamento. Quando eu descobri, falei: o que fazer? Mas, ao mesmo tempo, pensei: a gente vai começar a viver cada dia, um dia de cada vez".

"Senti insegurança. Porque, daí, a gente perde a confiança", lembra Lina. Renato, principalmente, lembra dos episódios de pânico: "Ela não reconhecia o local onde estava. Me ligava. Eu mandava ela acalmar e depois ela começava a seguir. É muito doido. Sempre foi centrada, trabalhava bastante. De repente..."

Hoje, a memória recente é a mais afetada. "Eu estou conversando com você agora. Daqui a cinco, dez minutos, ela acaba esquecendo nossa conversa. O momento, tudo, é passageiro", explica Renato.

Vida ressignificada

A rotina mudou. Renato, agora também cuidador, aprendeu a ser paciente. "É ter muita paciência e servir. E aprender". A família buscou apoio na Abraz (Associação Brasileira de Alzheimer), onde participa de palestras e encontros. O casal também encontra força na religião messiânica. "Ela recebe o Johrei (luz divina transmitida pelas mãos) e ajuda a acalmar bastante", diz Renato.

Para lidar com os esquecimentos, a estratégia é o caderno de anotações. "Ela anota o que vai fazer no dia seguinte: limpeza da cozinha, café da manhã, culto, lavar roupa. Tem que escrever que vai almoçar também, se não, ela esquece e passa o dia. Eu acompanho e escrevo na minha agenda para ajudar".

Lista de tarefas da Lina
Lista de tarefas da Lina
Foto: Arquivo pessoal

Apesar das dificuldades, Lina ainda encontra prazer em atividades simples. Cuida das plantas, faz pequenos arranjos para entregar na igreja. Sobre seu passado, recorda com saudade: "Participávamos da Casa de Belém, que acolhe crianças abandonadas. A gente fazia atividades no final de semana, sempre sábado. Era muito bom. A gente inventava passeios, levava música, teatro. Saía cansada. Muita saudade, muita saudade dessa época".

Família, acolhimento e memórias afetivas

O apoio da família é essencial, mas nem todos compreendem a dimensão da doença. O casal mora em Itu, no interior paulista, enquanto a mãe e quatro irmãs de Lina seguem em São Paulo. Os encontros tornaram-se cada vez mais raros, restritos a datas especiais, como o Dia das Mães ou o aniversário da mãe. A família não chegou a visitá-los em Itu.

Questionada se encontrar as irmãs a alegra, Lina respondeu, rapidamente: "Depende", disse com uma risada. 

"Tem uns que não aceitam ou até mesmo desconhecem o que seria o Alzheimer. Porque você tem que saber como conversar, e ter paciência. Ela repete vinte vezes a mesma coisa. Se a pessoa não tiver consciência, fica enfezada, sem paciência", explica Renato, que encontra apoio em outros cuidadores, cujas histórias são compartilhadas. "O pessoal começa a pegar no pé, dizem que ela está fazendo de propósito".

O filho do casal, Thiago, de 17 anos, também enfrenta dificuldades. Com um diagnóstico tão recente, ele não compreendeu a gravidade da doença, nem consegue distinguir os gestos de insistência materna dos sinais de repetição causados pelo Alzheimer. "A gente leva ele para as palestras da Abraz porque é uma forma de aprender e sentir um pouquinho na pele também", diz o pai.

Lina teme apenas uma coisa: "Ficar sozinha". Por isso, Renato insiste na importância do acolhimento. "Uma vez, a gente viu uma senhora deslocada. Então, fizemos o acolhimento. E aguardamos o acompanhante chegar".

"Foi rápido, mas só o fato de você acolher já ajuda essa parte. A pessoa que está com Alzheimer, ela sente falta. Tem que ter um acolhimento, um porto seguro".

Sobre comentários ruins, Lina diz estar "blindada". "Ela está blindada por causa do esquecimento", disse Renato. Ele contou que é comum que as pessoas relatem histórias tristes que ouviram sobre outras pessoas diagnosticadas, que tiveram pioras rápidas ou passaram por momentos assustadores. "Não há necessidade de ficar comentando. Não é necessário fomentar coisas negativas”, alerta Renato, que aprendeu a necessidade da positividade.

Entre as estratégias da família, estão os resgates de memórias afetivas. "A gente buscou um cachorro quente na USP, onde íamos no passado. Ela lembrou. Não era mais uma kombi, agora é um quiosque, mas são memórias guardadas", conta Renato.

Lina agora sonha com coisas simples: "Eu quero viajar. Faz tempo que eu não vou para a praia". Nos planos da família, uma viagem ao litoral norte paulista — destino que Lina costumava visitar com a tia, quando era criança. Uma lembrança que, como tantas outras, ainda resiste.

Fonte: Portal Terra
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