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Quarentena pode causar ansiedade e paranoia; veja como lidar

Brasileiros que já estão em isolamento fora do Brasil e especialistas falam sobre a importância da saúde mental em época de isolamento

27 mar 2020 - 07h43
(atualizado às 08h26)
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“Trancada, sozinha, em um espaço de 30 metros quadrados”. Essa tem sido a realidade da jornalista de 23 anos Victória Faragó nos últimos dias. Assim como ela, muitos brasileiros também estão tendo que enfrentar a quarentena, oficializada em alguns estados nesta semana. A diferença é que o isolamento social de Victória já dura 19 dias - e, além de solitária, ela está em quarentena em Milão, na Itália, longe da família e amigos.

“Nos primeiros dias não tinha caído a ficha. Demora um tempo para perceber que, legalmente, você precisa ficar trancado em casa”, conta a jornalista. “Mas para mim, a maior dificuldade é estar isolada sozinha, em um espaço tão contido”, referindo-se ao estúdio onde mora: um imóvel pequeno e sem divisão de cômodos. 

De acordo com a especialista de psicossomática Maria José Femenias Vieira a adaptação nesses casos - onde o isolamento é imposto, e não opcional - pode ser mesmo muito difícil. “Somos seres sociais e nos constituímos como indivíduos por meio da relação com o outro. No isolamento é comum um estranhamento e uma sensação de desamparo, abandono, incertezas e solidão”, explica.

Por isso, nos próximos dias, é normal que a população brasileira, especialmente a que está seguindo à risca recomendações de isolamento, apresentem algumas características que, segundo médica, são consequências do confinamento e que vão depender do histórico emocional e do momento atual de vida de cada um. “Pode ocorrer depressão, ansiedade, paranoia, sentimento de baixa autoestima, solidão e até psicose”, completa.

Esteja sempre em contato com alguém

01/09/2018
REUTERS/Rodrigo Garrido
01/09/2018 REUTERS/Rodrigo Garrido
Foto: Reuters

O advogado Vinícius Eduardo Pereira dos Santos, 26 anos, que está desde o fim de fevereiro com as aulas suspensas em Coimbra, em Portugal, também está mais “experiente” em relação aos efeitos da quarentena do que os brasileiros. Entre outros problemas, chama a atenção para a dificuldade de ficar completamente sozinho.

“O maior contato que tenho é com pessoas do Brasil. Mas, por conta do fuso horário diferente, acabo conversando com o pessoal até tarde da noite aqui, e, no outro dia, não consigo levantar cedo e acabo entrando em um ciclo ruim”, comenta ele.

Apesar dos percalços, manter-se em contato com outras pessoas é uma das principais dicas para lidar com o isolamento. “Converse online duas vezes por dia com ao menos dois grupos diferentes de no mínimo três pessoas para configurar um grupo e ampliar as possibilidades do sorrir”, recomenda Julio Peres, psicólogo clínico e doutor em neurociências.

O psicólogo defende que os sentimentos de conexão e pertencimento a comunidades são protetores contra depressão e transtornos ansiosos. Sabendo do risco, Victória usa os recursos digitais para ficar sempre em contato com o namorado. “Já fizemos alguns ‘dates’ virtuais. A gente se liga por vídeochamada e janta juntos ou assiste uma série”.

Estabeleça uma rotina

Para a jornalista, criar uma rotina tem sido fundamental. “Eu acordo pela manhã, me visto, tomo café da manhã e tento variar as atividades: passo um tempo lendo, depois tento uma atividade manual, que não exija tanto esforço mental, como dobrar roupa”, descreve ela, que também tem aulas online em período integral duas vezes por semana.

A dica é unânime. O estudante Marcelo Sampaio, de 23 anos, que mora em Barcelona, na Espanha e está há duas semanas sem aulas devido a pandemia, também tem apostado no planejamento do dia para enfrentar a quarentena. 

“Tenho aulas online de manhã, de tarde alterno entre trabalhos e vídeos no Youtube. Depois faço uma malhação caseira improvisada e mais tarde jogo algo pelo celular com meus amigos do Brasil”, fala.

Especialistas também concordam que a prática é importante, conforme indica o médico neurocirurgião e neurocientista do Hospital das Clínicas de São Paulo Fernando Gomes. “Criar uma rotina, estabelecer horários e escolher fontes seguras de informação, são importantes para lidar com o isolamento de uma maneira saudável”.

Inclua as crianças

11/02/2020
REUTERS/Tyrone Siu
11/02/2020 REUTERS/Tyrone Siu
Foto: Reuters

Quarentena não é férias. A regra também vale para as crianças, que, assim como adultos, podem ter o psicológico abalado pela mudança nos hábitos diários. Por isso, é importante que os responsáveis pensem em uma rotina para os pequenos e também transmitam as informações cabíveis, livrando, desse modo, a criança de medos e inseguranças que possam surgir, conforme orienta a psicóloga e especialista em neuropsicologia Taciana Feitosa.

“Esse é o momento de criar um horário de estudo, um horário de brincadeiras espontâneas e ócio, de brincadeiras dirigidas, de contato virtual com pessoas que ela está habituada a lidar no dia-dia… tudo isso é muito protetivo para a mente da criança, pois ajuda a organizar e estruturar uma rotina, evitando que ela fique estressada e irritada”, comenta a especialista. 

Explicar que é um tempo passageiro também é fundamental. “‘Vai passar’ é a fala que mais tranquiliza. É o momento que a gente vai precisar se afastar um pouco e já já a gente vai poder retornar às atividades”, recomenda.

Cuide da saúde mental: invista em atividades que dão prazer

Alterações de humor são queixas comuns entre quem já está há mais tempo em quarentena. Sentir ansiedade, tristeza, angústia e até raiva estão entre as principais reclamações. 

Para não deixar-se abalar, o neurocirurgião do Hospital das Clínicas recomenda praticar exercícios físicos moderados, além de evitar excesso de comida, cigarro e café. “Abrir as janelas para ventilar a casa e expor-se à luz solar e reservar um momento ao dia para meditar, orar e praticar exercícios de respiração”, são outras orientações.

As redes sociais, nesse momento, também devem ser observadas com atenção. Com o aumento de fluxo de informações devido ao tema comentado no mundo todo, é importante selecionar as informações que serão recebidas. “Não fique lendo tudo que enviam. Não vai mudar a evolução. Precisamos saber apenas o necessário para enfrentarmos esta situação”, reforça a especialista em psicossomática.

Tentar enxergar o lado bom da situação também ajuda, segundo os especialistas. “Acredito que não existe uma receita, já que somos diferentes uns dos outros. Mas aproveitar esse tempo pra desenvolver ou buscar uma nova paixão pode ajudar”, finaliza Marcelo.

É importante ressaltar que nenhuma dessas dicas substitui o acompanhamento psicológico, que pode ser imprescindível em alguns casos. Buscar acolhimento online é uma alternativa para o momento de confinamento e pode ajudar a passar pela quarentena com a saúde mental em dia.

Fonte: Redação Terra
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