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"Estamos à beira do colapso", diz secretário da Saúde do RN

Com ocupação de leitos públicos de UTI próxima dos 100% nas regiões mais populosas, pasta esbarra na falta de respiradores e mão de obra

3 jun 2020 - 05h12
(atualizado às 07h34)
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NATAL - O sistema público de saúde do Rio Grande do Norte para atendimento aos pacientes com covid-19 poderá entrar em colapso a qualquer momento. Com a ocupação dos leitos gerais públicos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) próxima dos 100% nas regiões mais populosas, a Secretaria de Estado da Saúde Pública (Sesap/RN) corre contra o tempo para abrir novos leitos, mas esbarra na falta de respiradores e mão de obra especializada. O Estado contabilizava, até terça-feira, 2, a morte de 341 pessoas infectadas pelo novo coronavírus.

Conforme dados mais recentes da Plataforma Regula RN, que distribui os pacientes entre os hospitais administrados pela Sesap/RN, a ocupação dos leitos para a covid-19 em Natal e Região Metropolitana está em 97,8%. Na Região Oeste, na qual está a cidade de Mossoró, considerada um dos epicentros da pandemia no Estado e com uma das taxas de contaminação mais altas do Brasil, os leitos ocupados estão em 94,8%. No Seridó, região que faz divisa com a Paraíba, está o mais baixo nível de ocupação: 45,5%. A velocidade de contágio da doença no Rio Grande do Norte impede que o Governo do Estado consiga ampliar o número de leitos num curto intervalo de tempo.

O secretário de Estado da Saúde Pública do Rio Grande do Norte, Cipriano Maia
O secretário de Estado da Saúde Pública do Rio Grande do Norte, Cipriano Maia
Foto: Divulgação/Governo RN / Estadão Conteúdo

"Estamos numa situação extremamente crítica. Não diria ainda colapso, porque os pacientes estão conseguindo ser atendidos em algum serviço. Mas podemos dizer que estamos, realmente, à beira do colapso se não contivermos a taxa de transmissão, se continuarmos com a expansão do contágio e, consequentemente, o aumento do número de pacientes graves que irão demandar mais leitos", disse o secretário de Estado da Saúde Pública do Rio Grande do Norte, Cipriano Maia. "Essa abertura de leitos é limitada. Ela tem muitas restrições tanto no setor público, quanto no setor privado. Realmente, estamos numa situação limite".

O Rio Grande do Norte é um dos Estados nordestinos que tem o menor percentual de isolamento social. Conforme a Plataforma InLoco, no dia 1.º de junho, essa taxa estava em 41,1%, atrás somente de Sergipe, que contabilizou 40%. Na próxima quinta-feira, 4, o Governo do Estado deverá editar novo decreto ampliando o isolamento social por mais 15 dias e recrudescendo as regras de distanciamento, determinando o fechamento de orlas urbanas, praças e proibindo atividades ao ar livre.

Cipriano Maia acredita que a covid-19 ainda não atingiu o seu pico no Rio Grande do Norte. "Estamos nos aproximando do pico. Não temos uma segurança absoluta de quando será. Mas os dados evidenciam que estamos ainda em ascensão e poderemos ficar num período de crescimento por duas a quatro semanas e estabilizar por algumas semanas. É provável que estejamos chegando nesse pico máximo", advertiu. Na tentativa de mitigar os impactos negativo do pico da pandemia no Estado, a Sesap/RN deverá abrir mais 50 leitos, entre clínicos e críticos, em hospitais públicos de Natal e na cidade de Macaíba, na Região Metropolitana.

UPAs lotadas na capital

Em Natal, os 35 leitos específicos para o tratamento de infectados pelo novo coronavírus distribuídos em quatro Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) estão operando em sua capacidade máxima. Em algumas dessas unidades, o volume de pacientes atendidos e/ou internados está 200% acima da capacidade projetada, conforme dados da Secretaria Municipal de Saúde de Natal (SMS Natal).

No Hospital Municipal Dr. Newton Azevedo, na zona Leste de Natal, os nove leitos para a covid-19 estão ocupados. Os leitos semi intensivos, 29 no total, estão com 80% de ocupação. No Hospital de Campanha de Natal, na Via Costeira, todos os sete leitos de UTI estão com pacientes. Outros 43 estão distribuídos nas enfermarias. A unidade tem capacidade para 100 leitos de clínica médica e 20 para UTI, ainda em processo de montagem.

Na rede privada, a situação não é tão divergente. Num dos maiores hospitais particulares de Natal, o Rio Grande, os 25 leitos de UTI montados para o atendimento ao novo coronavírus estão ocupados. A unidade ampliou a oferta dos leitos críticos de 56 para 80, mas não consegue atender à crescente demanda. "Aumentamos consideravelmente o número de leitos de UTI, mas a rede continua tensionada. Há 10 dias, pelo menos, estamos com o nível máximo de ocupação das UTIs no nosso hospital", relatou o diretor Luiz Roberto Fonseca.

Para Fonseca, o Rio Grande do Norte já enfrenta uma situação grave em relação à covid-19. "O que nós vivenciamos hoje é um colapso assistencial. A demanda pelos leitos de UTI é maior que a oferta desses leitos críticos", declarou Luiz Roberto Fonseca. Questionado se há planos para abrir mais unidades de terapia intensiva, Fonseca adverte que há uma problemática difícil de ser solucionada. "Faltam equipamentos, que não são somente os respiradores. Faltam profissionais especializados no atendimento crítico e faltam insumos medicamentosos. Somente um dos bloqueadores neuromusculares que utilizamos em pacientes intubados para uma respiração mecânica mais adequada aumentou o consumo em 600%. Está tudo mais difícil e mais caro".

Peregrinação por leito

O colapso assistencial foi vivenciado, ao longo da terça-feira, 2, pela aposentada Paula Viana de Morais, de 97 anos. Ela começou a apresentar sintomas de infecção pelo novo coronavírus no início desta semana. Na segunda-feira, teve febre ininterrupta que variava de 39ºC a 41ºC. Na manhã da terça-feira, a neta Maria Raíssa de Moraes acionou o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) para socorrer a avó em casa e levá-la a um hospital.

"A ambulância chegou na minha casa por volta das 11h e ficou esperando mais de duas horas pela indicação de alguma vaga na rede pública. Fomos para a UPA da Cidade da Esperança, mas não tinha vaga. Vi outros idosos na mesma situação. Depois, na mesma ambulância, seguimos para a UPA Pajuçara, onde minha avó deu entrada", afirmou Maria Raíssa Moraes.

Apesar de ter sido admitida na Unidade de Pronto Atendimento do Pajuçara, que fica quase 15 quilômetros distante da casa da idosa, ela foi colocada numa sala com outras seis pessoas com sintomas de covid-19, numa cadeira reclinável. "Só tem um médico e muitos pacientes por todos os lados", lamentou Maria Raíssa Moraes. Há a possibilidade da idosa ser regulada para um dos leitos clínicos do Hospital de Campanha de Natal, mas ainda não há confirmação, pois existem outros nove pacientes regulados à espera de leitos na unidade hospitalar.

Estadão
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