Como africana denunciou fábrica chinesa por poluir rios e mudou realidade em região na Gâmbia: 'Fui ameaçada muitas vezes'
Aminata E. Sanyang afirmou ao Terra que o jornalismo de soluções pode promover mudanças onde não há esperança
Aminata E. Sanyang cresceu em uma comunidade na região costeira da Gâmbia, um país da África Ocidental que faz fronteira com o Senegal e que tem apenas 2,8 milhões de pessoas. A jornalista de 28 anos se recorda de ir ao rio com um cesto, onde ela e a família pegavam peixes de graça. No entanto, com a chegada de novas empresas no litoral do país, essa realidade se transformou, e o meio ambiente sofreu fortes impactos.
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Formada em jornalismo na Universidade da Gâmbia, a jovem foi 'pautada' por um editor para escrever uma matéria sobre uma fábrica chinesa em uma pequena comunidade da Gâmbia, chamada Sayang. Ao chegar no local, ela se deparou com um grave problema. Aquele rio que fez parte da sua infância mudou a coloração. O azul foi substituído pelo rosa.
"Era uma fábrica de processamento de peixe. Eles têm licença do governo para operar, mesmo sabendo que causam um estrago no meio ambiente. Eles têm tecnologias tão sofisticadas que você, como jornalista, não pode chegar perto", afirmou ela, que, atualmente, trabalha como produtora, apresentadora e repórter na Gambia Radio and Television Services (GRTS), onde cobre tópicos variados, com um olhar especial para meio ambiente e gênero.
Segundo ela, o rio sofreu graves interferências da fábrica chinesa por causa do despejo de resíduos tóxicos na cadeia hídrica, o que ocasionou a morte de muitos peixes, caranguejos e camarões.
"Fui ameaçada muitas vezes. Levei cerca de dois meses para conseguir fazer a matéria. A tecnologia deles é tão sofisticada que derrubava até mesmo um drone. Eu tive que contratar um especialista em drones para conseguir fazer imagens aéreas da fábrica", relatou.
As pessoas que moram naquela pequena comunidade foram impactadas diretamente com a poluição e a contaminação do rio. "Isso impactou enormemente, a ponto de as pessoas começarem a migrar. Os pescadores realmente desistiram da pesca. Existe uma parte da fábrica que também passa pelo rio, e os peixes começaram a morrer", acrescentou.
De acordo com Aminata, uma das cenas que mais a emocionou foi quando registrou diversas mulheres segurando cestas vazias na beira do rio. "Você vê ali essas mulheres paradas com seus baldes, se perguntando como conseguir peixes. É disso que elas dependem para alimentar suas famílias", destacou.
Uma luz no fim do túnel
Após a repercussão internacional da história da comunidade afetada pela fábrica chinesa, um grupo de jovens iniciou um programa para proteger o meio ambiente do entorno. O programa deles também inclui o plantio de árvores e a defesa das tartarugas marinhas, que andam à costa para botar seus ovos.
"Quando elas [tartarugas marinhas] aparecem, as pessoas normalmente as matam. Então, esses jovens começaram a fazer a defesa delas, pegando-as e protegendo-as em um tanque, até que os ovos amadurecessem", disse. Ela explicou que o grupo se dirigiu às comunidades afetadas para ouvir e entender seus problemas.
"Quando você conta histórias nas comunidades costeiras, talvez você perca um pouco da esperança. E quando as pessoas perdem a esperança, elas não conseguem tomar atitudes. Mas quando você mostra a solução, isso incentiva outras pessoas a seguir o mesmo caminho".
Outras comunidades da região costeira do país africano também estão sofrendo com as fábricas de processamento de peixe. Ela contou que a grande retirada de peixes do rio, de maneira não sustentável, acaba agredindo o ecossistema e o prejudicando.
"São várias comunidades impactadas. Alguns jovens são fornecedores da fábrica de processamento de peixe, então, todos os dias, toneladas de peixes são levadas para as fábricas, o que acaba impactando o ecossistema marinho", afirmou.
"Quando eu olho para essas histórias, eu não dou destaque apenas à pesca do país e ao impacto negativo dela, eu também dou destaque à comunidade que está tentando promover mudança. Isso realmente vai atrair mais interesse de todas as comunidades costeiras para também se inspirar no trabalho dessas comunidades", concluiu.
*Essa reportagem foi produzida como parte da Climate Change Media Partnership 2025, uma bolsa de jornalismo organizada pela Earth Journalism Network, da Internews, e pelo Stanley Center for Peace and Security.

