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Ofertas de cidades para ter sede da Amazon são segredo até para autoridades locais

Em busca de atrair a construção da segunda sede da varejista na América do Norte, regiões abusam de sigilo - a ponto de legisladores e prefeitos não saberem o que estão oferecendo

13 ago 2018 - 05h12
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Jared Evans, membro da prefeitura de Indianápolis está orgulhoso com o fato de a cidade estar entre as 20 finalistas para um dos mais cobiçados prêmios no país: ser local da planejada segunda sede da Amazon na América do Norte. No entanto, ele tem duas perguntas: que incentivos financeiros sua cidade irá obter? E o que vai oferecer em troca?

Por enquanto, nada.

Em todo os EUA, a busca pela "sede número dois", ou HQ2, como é chamado o projeto, tem sido feita em segredo. Mesmo líderes da sociedade civil não conseguem saber que tipo de incentivos fiscais e outros atrativos foram prometidos para a Amazon. Muitos até intensificaram campanhas legais para saber se isto é possível - eles têm medo de que os contribuintes sejam onerados com uma conta enorme com poucas chances de ser evitada.

Uma razão para esse blecaute de informação é que, em muitos casos, as propostas foram analisadas por afiliados da Câmara de Comércio local ou grupos de desenvolvimento econômico, que não são obrigados a levar suas negociações a público suas negociações. Muitos dos grupos também não são atingidos por leis de acesso à informação ou exigências estaduais no sentido de disponibilizar seus registros para quem requerer.

Mas há outra razão. São as artimanhas usadas. Algumas cidades querem que suas propostas para a Amazon sejam secretas para não passar informação para concorrentes. E a Amazon exigiu que os finalistas assinassem acordos de confidencialidade, que proíbem grupos locais de divulgar informações exclusivas sobre a companhia.

"Não sei o que oferecemos para a Amazon em termos de incentivos financeiros, mas acredito que a empresa espera obter o maior pacote de incentivos oferecidos por uma cidade", afirmou Leslie Pool, membro da Câmara dos Vereadores de Austin, no Texas.

Com tanto segredo em torno do caso, além de propostas como a de Austin, que envolve promessas de autoridades não-eleitas, há um risco de os contribuintes e líderes da sociedade civil se verem obrigados a aceitar as condições propostas ou viver com o estigma de terem rechaçado uma oportunidade extremamente lucrativa.

Regras. A Amazon, que deverá contabilizar US$ 235 bilhões em receitas este ano, promete levar para o local vencedor mais de 50.000 empregos bem remunerados e um investimento de US$ 5 bilhões em construção da sua sede.

Quando o concurso foi anunciado no ano passado, 238 localidades se habilitaram. Em janeiro a lista dos concorrentes, depois de uma primeira triagem, se resumiu a 20, que agora aguardam o resultado. Há rumores de que a empresa pode fazer mais uma seleção este mês, em busca das melhores propostas finais.

As poucas propostas que foram divulgadas incorporam pacotes financeiros impressionantes, mostrando até que ponto muitos Estados estão dispostos a pagar para atrair a Amazon. Maryland reuniu um pacote de incentivos fiscais e de infraestrutura no total de US$ 8,5 bilhões, e autoridades estaduais e municipais em Nova York obtiveram aprovação do legislativo para oferecer à companhia isenções fiscais e incentivos de US$ 7 bilhões se Newark for escolhida.

Mas nem todos são transparentes."Não estamos divulgando documentos relacionados com o projeto HQ2 da Amazon. Não estamos sujeitos ao Freedom of Information Act", disse Michael Finney, presidente e diretor executivo do Miami-Dade Beacon Council, parceria público-privada que administra a proposta da Amazon.

Newark divulgou sua proposta somente depois de um cidadão ingressar com uma ação judicial. Autoridades de outras localidades também estão sendo contestadas judicialmente. O gabinete do prefeito de Chicago vem reagindo a um grupo civil de defesa da transparência. Pittsburgh, Filadélfia e Pensilvânia estão também recorrendo de decisões do Office of Open Records do Estado que determinaram que as propostas das cidades sejam levadas inteiramente a público.

As cidades acham que há muito mais em jogo do que apenas empregos e investimentos neste caso. A Amazon afirma que seus investimentos em Seattle criaram mais de 53 mil empregos na localidade, excluindo as contratações feitas pela própria varejista. Segundo a empresa, sua presença adicionou US$ 38 bilhões sua economia, de 2010 a 2016.

Mas há também sérias desvantagens para a cidade. Em um discurso na Conferência de Prefeitos este ano, a prefeita Jenny Durkan, de Seattle, disse que os preços dos imóveis residenciais na cidade custam em média US$ 824 mil, os aluguéis subiram 57% nos últimos cinco anos. Além disso, há pelo menos quatro mil pessoas sem-teto nas ruas todas as noites.

Essas são preocupações levantadas pela vereadora Leslie Pool, de Austin. Segundo ela, a cidade não tem infraestrutura e nem habitações para acomodar 50 mil pessoas a mais. Para a legisladora, um crescimento assim tão rápido vai alterar a conformação sócio-econômica e a qualidade de vida de Austin.

"Esta é uma cidade onde você deseja se estabelecer. As pessoas aqui são amigas. Os parques são bonitos. Mas se alguém como a Amazon vem para cá, um grande inconveniente é a enorme confusão que isso causa. Você sufoca pequenas empresas e antigos proprietários de imóveis, que são aqueles que realmente dão à cidade o seu caráter e, diria, a sua marca", disse ela. / Tradução de Terezinha Martino

Estadão
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