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'O Vale do Silício não censura os conservadores', diz pesquisador

Em estudo, professor da Universidade de Nova York investigou uma das principais reclamações da direita americana

28 mar 2021 - 05h10
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Nos últimos anos, uma reclamação comum de conservadores é de que redes sociais censuram os seus conteúdos - nos EUA, o barulho é especialmente alto entre apoiadores do ex-presidente Donald Trump. Paul Barrett, professor da Universidade de Nova York, decidiu investigar a história.

Especialista em redes sociais e política, Barret avaliou os argumentos e hipóteses de que Google, Twitter e Facebook barram o conteúdo sob determinado ângulo político. A conclusão do relatório "Falsa acusação: A alegação infundada de que empresas de redes sociais censuram conservadores" é a de que discursos de políticos de conservadores ganham mais do que perdem em termos de engajamento e atenção online - tudo isso graças aos sistemas de promoção algorítmica de conteúdo das redes sociais. Ele falou com exclusividade ao Estadão. Confira os principais trechos:

É seguro dizer que a direita - ou a extrema direita - espalha mais conteúdos que violam as regras das plataformas do que representantes da esquerda?

Vários estudos concluíram que o fluxo de informações falsas e outros conteúdos nocivos é assimétrico - que circula mais à direita do que à esquerda. Nos EUA, acho que as mesmas forças que impulsionaram o movimento Tea Party, a base de Trump e a Fox News contribuíram para uma mudança na extrema direita republicana. A transformação veio acompanhada de uma mentalidade conspiratória, que gera e consome conteúdo mais extremo em uma variedade de plataformas de mídia social.

O sr. acredita que, se as redes sociais seguirem suas recomendações, isso diminuirá a perda de usuários conservadores para plataformas como Gab e Parler?

Não sei se um número significativo de conservadores está realmente abandonando o Facebook e o Twitter. Algumas figuras importantes disseram que estão fazendo isso. Mas teremos que esperar e ver como tudo isso vai acontecer. Enquanto isso, se as principais plataformas fossem mais transparentes sobre moderação de conteúdo e checagem de fatos - uma de nossas principais recomendações -, alguns membros da direita política poderiam ter certeza de que não são vítimas de preconceitos ideológicos. Não tenho nenhuma ilusão de que nosso relatório encerrará a alegação de viés anticonservador, porque essa alegação em si é uma forma de desinformação destinada a irritar a base do Trump.

Como o sr. responde ao argumento de que a maioria dos diretores do Vale do Silício (e da mídia e de universidades, em geral) tem orientação liberal?

Como dizemos no relatório, a questão não é se os executivos e funcionários do Vale do Silício são liberais. Muitos deles são. A questão é se suas preferências políticas pessoais os levam a censurar sistematicamente os conservadores. Não há evidências para apoiar a última afirmação.

O que impede essas empresas de ter consistência, regras mais claras e maior transparência nas suas políticas?

É interesse das empresas buscar esses objetivos. Mas seria necessário esforço e algum dinheiro para estabelecer e aplicar políticas mais claras. Alcançar maior transparência contradiz o instinto das empresas de manter seu funcionamento interno em segredo dos concorrentes. E uma melhor autogovernança não contribui imediata ou diretamente para os resultados financeiros, mesmo que isso aumentasse o sucesso das empresas no longo prazo e as tornasse melhores "cidadãs corporativas".

Perfis de pessoas influentes dispostas a mentir são mais danosas do que robôs e processos automatizados com perfis falsos?

Sim, geram mais danos do que robôs ou contas falsas. Isso é ruim principalmente quando a conta desses perfis influentes é controlada por um chefe de Estado, que espalha desinformação sobre temas importantes como saúde pública e integridade das eleições e que, ao mesmo tempo, incita a violência em massa.

No debate público digital, qual é a importância da parte da mídia tradicional dos EUA ligada à direita (Newsmax, Fox News) na propagação de teorias da conspiração ou na demonização do centro e da esquerda?

Parte da cobertura de notícias da Fox News - por exemplo, entrevistas feitas por Chris Wallace - pode ser qualificada como mainstream. Mas suas figuras mais populares do horário nobre - como Tucker Carlson, Laura Ingraham e Sean Hannity - são propagandistas de direita. No geral, a Fox News e seus novos rivais na extrema direita, Newsmax e OANN, são componentes cruciais para amplificar as teorias da conspiração, que muitas vezes começam online.

Você acredita que houve arbitrariedade na decisão do Twitter de banir o ex-presidente Donald Trump poucos dias antes de ele encerrar o mandato?

Não acho que a decisão do Twitter de barrar Trump foi arbitrária. Como a empresa explicou, havia uma preocupação real de que o ex-presidente continuaria a usar o Twitter para elogiar extremistas de direita e incitá-los a cometer mais violência destinada a interferir na transferência pacífica de poder para o novo presidente. Além disso, os tuítes perigosos de Trump, que incitaram a insurreição de 6 de janeiro no Capitólio, não vieram do nada. Por meses, ele violou as regras do Twitter ao minar a validade da eleição e aplaudir a resistência armada às medidas de saúde pública relacionadas à pandemia do coronavírus. É difícil imaginar um caso envolvendo um usuário do Twitter que poderia causar danos maiores do que um chefe de Estado que se recusa a reconhecer que foi derrotado em uma eleição livre e justa e que deseja usar a plataforma para encorajar seus seguidores a interferir na conclusão do processo eleitoral.

Estadão
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