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Conheça o satélite brasileiro que embarcou no foguete de Elon Musk

Com 125 cm³ e menos de 1 quilograma, equipamento é o primeiro satélite privado desenvolvido no Brasil

25 jan 2022 - 05h10
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Conduzida pelo bilionário Elon Musk, a empresa de exploração espacial SpaceX atingiu resultados históricos nos últimos anos, como o feito inédito de levar civis em um voo orbital. Um lançamento recente da companhia, porém, colocou uma medalha no peito de quatro jovens brasileiros, que estão à frente da startup Pion Labs. Calvin Trubiene, João Pedro Vilas Boas, Bruno Costa e Gabriel Yamato construíram um satélite totalmente nacional que foi enviado ao espaço no último dia 13 de janeiro, a bordo do foguete Falcon 9, da SpaceX.

Trata-se do primeiro satélite privado desenvolvido no Brasil a ser lançado em órbita. Chamado de Pion-BR1, ou pelo apelido carinhoso de "Pionzinho", o equipamento foi desenvolvido durante 7 meses pelo grupo de cientistas, que estudaram na Universidade Federal do ABC (UFABC) e na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) - eles se conheceram em projetos universitários e competições de protótipos de foguete, e juntos fundaram a startup em 2019.

O Pion-BR1 cabe na palma de uma mão: com 125 cm³ e menos de 1 quilograma, ele se enquadra na categoria de "satélites de bolso". No espaço, a mais de 500 quilômetros de altura, o equipamento terá a função de fornecer ensinamentos de como um satélite se comporta na órbita terrestre - ou seja, é um teste para provar novas tecnologias.

"Não é um satélite comercial, e sim educacional. O grande objetivo é ter a herança de voo e testar nossos sistemas, incluindo protocolos de comunicação", afirma ao Estadão o engenheiro aeroespacial e presidente executivo da Pion Labs, Calvin Trubiene, 31, que quando criança trocava os carrinhos de brinquedo por documentários de TV sobre o céu e o espaço sideral - ele também tem formação em pilotagem de avião, um sonho que alimenta desde a infância vivida em São Paulo.

Com o satélite, os cientistas esperam obter informações como condições de temperatura, funcionamento da bateria e até posicionamento do equipamento no espaço - o plano é identificar as condições do Pionzinho a cada 30 segundos. Não é uma tarefa fácil: Trubiene explica que fazer a comunicação do satélite com a Terra é tão desafiador quanto se conectar em uma rede Wi-Fi do Rio de Janeiro a partir de São Paulo.

Feita essa transmissão, os dados do satélite serão públicos e poderão ser acessados por estudantes e pesquisadores. "Será uma forma de evoluir nosso projeto e, ao mesmo tempo, levar o entendimento do ambiente espacial para as pessoas aqui no Brasil", diz o diretor de tecnologia da startup, João Pedro Vilas Boas, 24, que tem formação em robótica e programação. "Queremos trazer o espaço para perto de todo mundo".

É algo que deve começar a se concretizar nas próximas semanas. "Como no mesmo lançamento foram enviados outros 105 satélites, os equipamentos ainda estão muito perto um do outro, o que dificulta a coleta de sinais. Devemos começar a receber informações em breve", diz Trubiene. A expectativa é de que o aparelho fique em órbita pelos próximos 2 a 3 anos.

Com 125 cm³ e menos de 1 quilograma,  Pion-BR1 cabe na palma de uma mão
Com 125 cm³ e menos de 1 quilograma, Pion-BR1 cabe na palma de uma mão
Foto: Pion Labs/Divulgação / Estadão

Inspiração

O lançamento do Pion-BR1 foi feito em parceria com a UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), a OBSAT (Olimpíada Brasileira de Satélites, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação), a Amsat-BR (organização autônoma e informal de radioamadores) e a Labre (Liga Brasileira de Radioamadores). Toda a construção foi realizada pelos quatro cientistas dentro de um laboratório em São Caetano do Sul, na grande São Paulo.

A produção do satélite é 100% brasileira, incluindo componentes como placas, sistemas e software - apenas os chips foram importados, já que não há fabricação no País. "Construímos o Pion-BR1 em meio a uma crise global de semicondutores. Chegamos a precisar reaproveitar componentes de outros produtos para fazer dar certo", conta Vilas Boas.

Ao todo, o projeto custou R$ 500 mil, sendo que aproximadamente R$ 300 mil foram gastos para comprar o assento do Pionzinho no foguete da SpaceX. A startup usou o dinheiro de seu próprio caixa - por meio de licitações, a empresa também vende kits educacionais de satélites para serem usados em universidades.

A construção do Pion-BR1 foi mais rápida do que a média: um equipamento do tipo costuma demorar de 1 a 3 anos para ficar pronto. Os cientistas atribuem o feito à estratégia de desenvolvimento da startup, que se inspira na SpaceX.

"Não passamos muito tempo na ideação, confiamos nos nossos cálculos e fomos direto aos testes, focando em aprender com erros e revisões", afirma o diretor de tecnologia da startup. "É uma estratégia de engenharia que o Elon Musk vem adotando nos últimos anos, e trouxemos para a Pion Labs".

O apego pelo projeto foi tanto que os jovens se recusaram a colocar o Pionzinho nos Correios - para chegar até o foguete da SpaceX, era preciso enviar o dispositivo até o Reino Unido, onde fica a empresa que fez os trâmites entre a Pion Labs e a companhia de Elon Musk. Vilas Boas, então, embarcou em um avião, sozinho, com o satélite no colo. "Passou no raio-x tranquilamente", conta o jovem baiano.

Depois dos perrengues, o dia 13 de janeiro foi uma festa. Calvin Trubiene viajou até a Flórida, nos Estados Unidos, para acompanhar o lançamento no Cabo Canaveral, palco de voos históricos de ônibus espaciais e foguetes. Ele assistiu à decolagem de uma arquibancada, que é aberta ao público que deseja acompanhar o espetáculo. Foi um dia de celebridade.

"Foi um momento de transcendência. Na arquibancada, contei para um menino americano que meu satélite estava no foguete e todo mundo ouviu. As pessoas ficaram muito animadas e até pediram para tirar foto comigo", conta o engenheiro.

Sistemas internos do satélite Pion-BR1, que pretende monitorar impacto das condições espaciais 
Sistemas internos do satélite Pion-BR1, que pretende monitorar impacto das condições espaciais
Foto: Pion Labs/Divulgação / Estadão

Rumo à Lua

Depois do Pion-BR1, a startup planeja desenvolver novas versões do equipamento. No longo prazo, a ideia é criar uma constelação de satélites, que aí sim seria comercializada - os dados poderiam ser usados, por exemplo, para monitoramento no agronegócio e em cidades inteligentes. Por ser brasileira, a Pion Labs acredita que conseguirá fugir do câmbio e baratear esse tipo de tecnologia por aqui.

Há também planos ainda mais ambiciosos. "O próximo passo é ir para a Lua. Nosso maior sonho é ter um rover no espaço", diz Trubiene.

Estadão
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