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Cabify vê o Brasil pior na pandemia e deixará o País em junho

Empresa de mobilidade espanhola atribui saída do País à pandemia de covid-19

23 abr 2021 - 12h08
(atualizado às 19h09)
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Em meio à disputa entre Uber e 99, Cabify deixa o Brasil devido à pandemia de covid-19
Em meio à disputa entre Uber e 99, Cabify deixa o Brasil devido à pandemia de covid-19
Foto: Divulgação / Estadão

A startup espanhola Cabify anunciou nesta sexta-feira, 23, que irá encerrar sua operação no Brasil a partir do próximo dia 14 de junho.

Em comunicado aos clientes, a empresa diz que a persistência da pandemia de covid-19 no País dificulta a criação de valor dos seus serviços de carona compartilhada, dependente da mobilidade urbana, e por decisão de rentabilidade optou de sair do Brasil. Assim, a empresa se torna a primeira startup global a abandonar o País durante a pandemia.

A startup diz em nota que, em países da América Latina e na Espanha, os índices de recuperação pré-pandemia chegaram a 75% no final de 2020 e a demanda chegou a 100% neste ano. A Cabify não revelou como foi o desempenho no Brasil.

"Todos os motoristas parceiros, passageiros e empresas que utilizam seus serviços no País foram devidamente informados e a Cabify tem transmitido sua gratidão pela confiança depositada na empresa nos últimos 5 anos, desde sua chegada ao Brasil em 2016. A empresa continuará atenta às necessidades e oportunidades futuras de mobilidade neste mercado", declarou a startup em nota.

Fundada em 2011, em Madri, a Cabify expandiu, alguns meses depois, para a América Latina e atualmente está presente na Argentina, Chile, Colômbia, Equador, Espanha, México, Peru e Uruguai. No Brasil, a startup viu um mercado altamente competitivo, que conta com a Uber e a 99 como as principais operadoras de serviços de carona compartilhada.

Para Ciro Biderman, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a pandemia foi um choque inesperado que prejudicou uma companhia que já vinha mal das pernas ao utilizar um modelo de negócio rígido (sem tarifas dinâmicas e com motoristas mais qualificados), em comparação com as rivais Uber e 99, que têm modelos mais flexíveis e com opções que variam entre viagens padrão e premium.

"Quando vem a pandemia, a Cabify não tem fôlego para aguentar uma operação tão reduzida. Como a demanda não estava alta, é possível que os outros serviços ficaram muito mais baratos e conseguiram se recuperar graças ao preço dinâmico", explica Biderman.

Além disso, na visão de Paulo Furquim de Azevedo, professor de negócios do Insper, a Cabify sentiu na pele uma característica do mercado de plataformas digitais de mobilidade. "É um setor com espaço para poucas empresas. Ganha o jogo quem tem mais capilaridade, com maior número de motoristas e passageiros. A Cabify não conseguiu alcançar uma massa crítica de usuários consistente", diz.

De acordo com a plataforma Crunchbase, a Cabify levantou US$ 477 milhões em investimento desde a sua fundação, em nove rodadas. É um número muito distante de rivais. Antes de abrir capital, o Uber levantou US$ 24,5 bilhões em 12 rodadas de investimento. No começo de abril, a Cabify contratou um novo diretor financeiro para abrir o capital na Bolsa de Madrid - ainda não é possível saber se a saída do Brasil está relacionada com a preparação das finanças da empresa para executar o movimento.

Sem ajuda do delivery

Os aplicativos de transporte como um todo sofreram impacto da pandemia em suas operações. O Uber, porém, no seu último balanço financeiro (referente ao último trimestre de 2020), conseguiu segurar as contas com o serviço de delivery - a empresa registrou no período um crescimento de 224% em receita da divisão de serviços de delivery, que inclui entrega de comida, objetos e compras de mercado.

A Cabify, porém, nunca conseguiu fincar os pés no mercado brasileiro de delivery, como fizeram gigantes como o Uber. Não que ela não tenha tentando: em 2017, a empresa lançou no País o Cabify Express, uma modalidade de entregas com motoboys no delivery de encomendas. Em abril do ano passado, a Cabify fez um novo esforço no segmento ao fechar uma parceria com a startup de pagamentos Ebanx: os motoristas do app passaram também a realizar entregas diversas, a pedido do usuário ou de pequenos comerciantes. À época deste lançamento, a Cabify afirmou que estava trabalhando para aumentar o número de parceiros para estender o serviço delivery também para supermercados, farmácias e restaurantes. Porém, nenhuma iniciativa da Cabify deslanchou.

Talvez tenha sido por falta de fôlego, dizem especialistas. "Em tempos de crise, negócios rentáveis no longo prazo podem até mudar de dono e se adaptarem, mas persistem", afirma Azevedo. "Outros apps fizeram isso".

Empresa comprou a Easy em 2017

A Cabify chegou ao Brasil em 2016 e sempre tentou manter um posicionamento mais "premium": a ideia da empresa não era brigar com Uber e 99 por preço - esta última foi comprada em 2018 pela chinesa Didi, ganhando fôlego para investir nas operações no País. Posteriormente, porém, foi forçada a mudar de estratégia e os preços caíram. Quando chegou aqui, a empresa havia acabado de receber um aporte de US$ 120 milhões e estava avaliada em US$ 320 milhões.

Em 2017, a Cabify deu um passo importante no mercado brasileiro ao comprar a Easy, então uma das mais conhecidas plataformas de transporte no País, focada em taxis. Uma holding, com pelo menos US$ 100 milhões em financiamento, foi criada para agregar as duas marcas. Em 2019, a marca da Easy foi aposentada, e o serviço de taxis foi absorvido pelo app da Cabify.

Ao comprar a Easy, a Cabify esperava tornar-se uma plataforma de transporte com diferentes modais. Além dos carros privados e dos taxis, a empresa ofereceu voos de helicópteros em parceria com a Voom, uma subsidiária da Airbus. Ela também tentou se aventurar na onda dos patinetes em 2019, com viagens em circuitos específicos, mas esse mercado colapsou antes mesmo de se firmar. Em 2019, a Cabify anunciou um investimento de US$ 20 milhões no País, mirando os cinco anos seguintes.

Para Vladimir Fernandes Maciel, coordenador do Centro Mackenzie de Liberdade Econômica, a Cabify pode ter se perdido na estratégia. "Um serviço mais elitizado tem um público menor. A Cabify inicialmente apostou no nicho corporativo e mais seleto, que agora é justamente o tipo de usuário que está em home office e parou de fazer as viagens", afirma. / COLABORARAM BRUNO ROMANI E BRUNA ARIMATHEA

Estadão
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