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Da repressão à democracia: Espanha lembra 50 anos da morte do ex-ditador Franco

Em 20 de novembro de 1975, foi anunciada a morte do general Francisco Franco, líder das forças nacionalistas durante a derrubada da Segunda República Espanhola e responsável por governar o país durante a ditadura, de 1939 a 1975. Meio século depois, enquanto o governo espanhol celebra os anos de democracia conquistados, associações de familiares de desaparecidos pedem justiça e reparação. Ao mesmo tempo, uma parcela da sociedade demonstra certa nostalgia pelo passado autoritário.

20 nov 2025 - 11h48
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 Ana Beatriz Farias, correspondente da RFI em Madri

O ditador Francisco Franco nos anos 1960
O ditador Francisco Franco nos anos 1960
Foto: AFP - - / RFI

Cinco décadas após o fim do franquismo, 21,3% dos espanhóis afirmam que os anos da ditadura foram bons (16,8%) ou muito bons (4,5%). Os dados são de uma pesquisa realizada pelo Centro de Investigações Sociológicas (CIS) em outubro deste ano. A maioria, porém, considera o período ruim (26,4%) ou muito ruim (39,1%).

O estudo também revela outro dado significativo: embora grande parte da população avalie que o atual regime democrático é melhor (40,8%) ou muito melhor (33,8%) que a ditadura, uma parcela considera que a democracia espanhola é pior (11,8%) ou muito pior (5,5%) do que o regime franquista.

Esses números refletem a pluralidade de interpretações sobre uma etapa "nefasta", como a define o historiador Josep Maria Fradera. "Foi uma ditadura do princípio ao fim. Começou matando e terminou matando". Para ele, a nostalgia de parte da sociedade espanhola não é um fenômeno isolado, mas parte de uma "onda de nostalgia da direita" que atravessa diversos países europeus — algo "preocupante" e "alarmante".

Memória e justiça

Emilio Silva Barrera, presidente da Associação para Recuperação da Memória Histórica (ARMH), acredita que "a melhor política de memória se faz nos tribunais e nas escolas" - duas coisas que, segundo ele, o poder das elites tem tentado impedir. Ele afirma que essas elites trabalharam para que jamais se abrisse a porta de um tribunal para julgar um franquista e para que nas escolas se passassem décadas escondendo ou distorcendo a história da Espanha.

Para Silva Barrera, a Espanha transformou-se em uma "grande fábrica de ignorância", porque muitas das pessoas que comandaram o país "especialmente nos 35 primeiros anos após a morte de Franco" tinham vínculos diretos com a ditadura. "Pertencendo a partidos de esquerda ou de direita", muitos descendiam de franquistas - o que, afirma, determinou a ausência de políticas de memória.

O avô do ativista, Emilio Silva Faba, morto durante a ditadura, foi a primeira vítima do franquismo identificada geneticamente na Espanha, conta Silva Barrera. Ao analisar as reparações oferecidas pelo Estado, ele é categórico:

"Agora, como vítima do franquismo, minha família pode solicitar um diploma que o governo chama de reparação e que diz algo que eu já sei: que meu avô era um desaparecido. Onde está a reparação? É uma outra maneira de dizer a mesma coisa, não é?", questiona.

Para ilustrar que o Estado já prestou atenção diferenciada a outros grupos de vítimas, Silva Barrera cita as compensações concedidas a vítimas de terrorismo: indenizações, presença em julgamentos, condenações aos responsáveis e benefícios sociais. Também menciona países como a Argentina, que, segundo ele, avançaram mais na reparação das vítimas das ditaduras.

A transição espanhola

Ao falar sobre a transição espanhola - período geralmente compreendido entre a morte de Franco, em 1975, e a aprovação da Constituição, em 1978 -, Silva Barrera é crítico. Para ele, o grande pacto daquele momento, marcado por intensas negociações, consistiu em esconder as vítimas para proteger os carrascos.

Analisando as legislações posteriores, ele vê continuidade desse padrão: "Temos duas leis de memória, uma de 2007 e outra de 2022, que mencionam muitas vezes a palavra 'vítima' e nunca mencionam a palavra 'algoz'. Não se pode contar a verdade contando apenas a história de quem foi a vítima."

O historiador Josep Maria Fradera, por outro lado, entende que a transição só se completou em 1986, com a entrada da Espanha na União Europeia - e o processo, segundo ele, trouxe resultados positivos. "O país passou por uma situação que poderia ter sido particularmente difícil se tivesse chegado a um confronto aberto, mas encontrou um sistema razoável para se adaptar, digamos, ao quadro democrático prevalecente na Europa naquela época".

Frutos de meio século

Para medir as transformações vividas pela Espanha nas últimas cinco décadas, Fradera compara o país do pós-guerra - pobre e cruel, especialmente com mulheres e minorias, de acordo com o historiador - com o país atual, moderno e economicamente desenvolvido. Ele destaca ainda o papel da Espanha no turismo internacional e sua imagem valorizada globalmente. Apesar dos avanços, Fradera ressalta que persistem "deficiências educacionais e culturais, além de grandes desigualdades sociais".

Já Silva Barrera ressalta conquistas da sociedade civil, sobretudo no campo das exumações e identificação de vítimas. Nos anos 1970, ele conta que o pensamento era: "Não falamos das vítimas nem dos carrascos". Hoje, graças ao trabalho das associações e das famílias de desaparecidos, as vítimas não podem mais ser escondidas.

No entanto, ele destaca que o silêncio sobre os carrascos permanece. "Isso é chamado em ciência política de Lei de Ferro da Oligarquia, cujo autor é Michels. É um limite imposto por um grupo de interesse formado pelos filhos dos franquistas que estão em diferentes organizações políticas, e é um limite que não se toca, não se toca e não foi tocado em 50 anos".

50 anos sem Franco

Para marcar os 50 anos da morte de Francisco Franco, o governo espanhol lançou um programa nacional com mais de 400 atividades entre novembro e dezembro de 2025, com continuidade prevista para 2026. A programação, impulsionada pelo Ministério da Política Territorial e Memória Democrática, busca estimular reflexão sobre os direitos e liberdades conquistados desde o fim da ditadura. A campanha "A democracia é o seu poder" tem foco especial nos jovens - um público que pode chegar a ver a ditadura como algo distante.

O ministro Ángel Víctor Torres afirmou que a iniciativa pretende fortalecer o conhecimento histórico e o debate público, destacando a importância de comparar a atual democracia com o período de ausência de liberdades.

Paralelamente, grupos pró-Franco organizam homenagens ao ditador. Em Madri, haverá uma missa em sua memória, e outras cerimônias estão previstas em diferentes cidades. A Fundação Francisco Franco coordena parte desses atos, mantendo ativa a exaltação da figura do ex-chefe de Estado, desafiando a Lei de Memória Democrática, que sanciona a exaltação do franquismo.

RFI A RFI é uma rádio francesa e agência de notícias que transmite para o mundo todo em francês e em outros 15 idiomas.
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