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Estados Unidos

Lori Lightfoot: os desafios da 1ª prefeita negra e gay de Chicago, "cidade mais corrupta dos EUA"

A cidade americana de Chicago fez história na terça-feira ao eleger para a Prefeitura Lori Lightfoot, a primeira mulher negra e gay a ocupar o cargo; mas liderar a terceira maior cidade dos Estados Unidos traz desafios.

4 abr 2019 - 05h24
(atualizado às 16h34)
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Lightfoot, que foi promotora federal e nunca teve cargo político, vai substituir Rahm Emanuel, o ex-chefe da Casa Civil de Barack Obama e prefeito da cidade há quase uma década
Lightfoot, que foi promotora federal e nunca teve cargo político, vai substituir Rahm Emanuel, o ex-chefe da Casa Civil de Barack Obama e prefeito da cidade há quase uma década
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A cidade americana de Chicago fez história na terça-feira ao eleger para a Prefeitura Lori Lightfoot, 56, a primeira mulher negra e gay a ocupar o cargo.

Numa disputa entre duas candidatas mulheres, Lightfoot derrotou Toni Preckwinkle, uma política de longa data de Chicago, importante líder do partido Democrata.

Lightfoot, que foi promotora federal e nunca teve cargo político, vai substituir Rahm Emanuel, o ex-Chefe de Gabinete de Barack Obama e prefeito da cidade há quase uma década.

Ela também carrega a tocha de Harold Washington, o primeiro prefeito negro da cidade, que ficou na função de 1983 a 1987. Considerando que 30% dos moradores da cidade são negros, é surpreendente que ele tenha sido o último, há mais de trinta anos.

"Ela trouxe esperança e até otimismo, mas vai ser pressionada para mostrar resultados e não decepcionar as pessoas que a apoiaram", diz Peter Slevin, professor da Universidade Northwestern e ex-chefe da sucursal do Washington Post em Chicago.

"Os eleitores apostaram que uma outsider poderá fazer o que uma sequência de políticos profissionais não conseguiram: deixar a cidade mais segura, melhorar a educação e investir em bairros esquecidos."

Mas liderar a terceira maior cidade dos Estados Unidos traz desafios. Aqui estão alguns deles:

Corrupção

Segundo um relatório preparado pela Universidade de Illinois com base em dados do Departamento de Justiça, Chicago é a cidade mais corrupta dos Estados Unidos. O levantamento leva em conta o número de condenações por corrupção de 1976 a 2017.

Mais de 30 membros do conselho municipal - correspondente à Câmara de Vereadores - foram ligados a casos de corrupção nesse período. Em janeiro, o membro mais antigo, Edward Burke, foi acusado de tentativa de extorsão por supostamente usar sua posição política para levar processos para o seu escritório de advocacia.

O Democrata, que nega as acusações, foi reeleito em fevereiro, apesar das suspeitas contra ele.

Mas o caso teve forte impacto na corrida eleitoral. As ligações de Preckwinkle com Burke afetaram negativamente as chances dela, disse à BBC Lynn Sweet, a chefe da sucursal de Washington do jornal Chicago Sun-Times.

"O escândalo de corrupção ajudou Lightfoot a se destacar na corrida eleitoral."

A jornalista acrescenta que a nova prefeita terá que desenvolver uma relação produtiva com o conselho municipal, que está cheio de novos membros.

Durante um debate no mês passado, Lightfoot prometeu aos moradores de Chicago que ela mandaria "a máquina de corrupção política de Chicago para a cova de uma vez por todas".

Apoiadoras da nova prefeita aguardavam com ansiedade o resultado da eleição
Apoiadoras da nova prefeita aguardavam com ansiedade o resultado da eleição
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Violência urbana

Apesar de o Estado de Illinois ter leis rígidas sobre posse e porte de armas, elas entram por Estados vizinhos, e o resultado é que a violência armada na cidade continua fazendo manchetes. Os tiroteios frequentes são usados como exemplo por ativistas pró-armas de que ter uma legislação rigorosa não reduz crimes.

A polícia de Chicago diz que houve uma redução de 24% no número de tiroteios neste ano, tendência que já vinha sendo observada em 2018.

O relatório de 2018 da polícia mostra que houve uma queda de 15% no número de assassinatos, a maior redução entre as grandes cidades americanas. As mortes em tiroteios caíram 31% desde 2016, diz a corporação.

Entre as estratégias adotadas estão a contratação de outros mil policiais, compra de novas tecnologias e a abertura de novos centros de apoio a decisões policiais, onde há análise de dados.

Mas há ainda muita frustração entre a população que espera maior combate à violência por parte das autoridades, algo com que Lightfoot terá que lidar, e há também bastante expectativa devido ao fato de ela ter chefiado o conselho policial de Chicago e a força-tarefa de prestação de contas da corporação à sociedade.

Reforma policial

"À medida que as taxas de homicídio aumentaram, um número cada vez maior de moradores de Chicago, principalmente os negros, perderam confiança na polícia", diz o professor Slevin.

Em 2014, o assassinato de Laquan McDonald, um adolescente negro, por um policial branco, provocou revolta nacional e houve protestos contra a brutalidade policial. O caso gerou uma investigação federal sobre a polícia da cidade que concluiu que havia um padrão de discriminação racial e uso excessivo da força pela corporação.

Em janeiro, um juiz federal aprovou um plano com dezenas de reformas para a polícia de Chicago, que foi elaborado pelo município e promotores do Estado, com contribuições do público e da polícia. Algumas iniciativas da reforma são treinamento de policiais para intervenção em situações de crise, investimento em saúde mental e políticas de uso da força, de acordo com uma rádio de Chicago.

"A Lightfoot pedia sempre que houvesse reformas policiais e agora ela terá a chance de realizá-las", diz Slevin. "Ela disse aos eleitores que quer que a polícia trabalhe de forma mais próxima aos moradores e que eles sejam responsabilizados por suas ações."

Quando chefiou o conselho policial de Chicago, o grupo demitiu cerca de 75% dos policiais acusados de má conduta. Em anos anteriores, essa taxa era de cerca de 40%, segundo o jornal Chicago Tribune.

Com o caso do ator Jussie Smollett, preso sob suspeita de ter registrado um boletim de ocorrência falso, a atenção nacional se voltou novamente para a polícia de Chicago.

Sweet diz que a nova prefeita provavelmente vai ter a tarefa de superar o caso de uma maneira produtiva.

"A próxima decisão importante é se o atual superintendente, Eddie Johnson, fica no cargo."

Educação em crise

Em 2018, quase a metade das escolas de Chicago tiveram resultados abaixo do esperado, de acordo com uma métrica estabelecida pelo governo.

Dessas, 40% eram escolas de ensino médio, e quase todas as que foram mal ficam na zona sul da cidade, cuja população é em grande parte negra, diz o site de educação Chalkbeat.

"Dezenas de milhares de moradores negros se mudaram da cidade para escapar da violência e das más escolas", diz o professor Slevin.

Mas Lightfoot terá um orçamento pequeno para lidar com a questão das escolas, assim como outros serviços públicos.

"Ela não vai ter muita margem para desperdício, dado que o Estado está endividado e tem um sistema previdenciário com verbas insuficientes."

O gabinete da Prefeitura ainda se recupera da decisão, tomada em 2013, de fechar 50 escolas públicas em áreas predominantemente negras, o maior movimento de fechamento de escolas da história da cidade.

Imagem

Como a terceira maior cidade do país, Chicago é conhecida globalmente, mas sua imagem nem sempre é das melhores, devido às associações feitas com violência armada e corrupção.

"Um dos trabalhos da Prefeitura é vender a cidade ao mundo", diz Sweet. "A cidade vai perder um pouco da atração com a saída de Rahm Emanuel."

Emanuel, que foi Chefe de Gabinete do ex-presidente Barack Obama, "tem uma personalidade marcante", e aparece com frequência na televisão, observa Sweet.

Os eleitores de Chicago indicam que estão prontos para grandes mudanças.

"O desafio dela é unir a cidade sob sua liderança", diz Sweet.

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