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Ministros do STF citam de Cazuza a Shakespeare em julgamento sobre prisão em 2ª instância

Leitura dos votos, que varia de 20 a 100 minutos, é apoiada por citações que evocam poetas, iluministas, juristas e ativistas contemporâneos

25 out 2019 - 12h05
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O Supremo Tribunal Federal iniciou na semana passada o julgamento de jurisprudência para a prisão em 2ª instância, em decisão que pode afetar quase 5 mil pessoas condenadas no País. O placar atual aponta 4 a 3 a favor da execução da pena antes de esgotados os recursos judiciais. A discussão deve ser retomada em novembro. Os ministros vêm justificando seus votos - que vão de 20 a 100 minutos - com citações que vão de Mahatma Gandhi e Voltaire a Cazuza e Angela Davis.

Abaixo, veja alguns dos pensadores evocados pelos ministros do Supremo durante a defesa de seus votos contra ou a favor da prisão em 2ª instância:

Luiz Fux - William Shakespeare

"O bem que os homens puderam fazer são enterrados com seus ossos. Os males que os homens fizeram sobrevivem depois da morte destes homens", afirmou Luiz Fux, citando William Shakespeare para explicitar o papel da Corte.

O ministro do STF Luiz Fux
O ministro do STF Luiz Fux
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil / Estadão

Marco Aurélio - Ruy Barbosa

Relator do processo, o ministro Marco Aurélio, assim como seus colegas, resolveu citar um jurista. O escolhido foi o baiano Ruy Barbosa de Oliveira. "Dias melhores pressupõem a observância irrestrita à ordem jurídiconormativa, especialmente a constitucional. É esse o preço que se paga ao viver-se em Estado Democrático de Direito, não sendo demasia relembrar Ruy Barbosa quando, recém-proclamada a República, no ano de 1892, ressaltou: 'Com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora da lei não há salvação'."

Luís Roberto Barroso - Cazuza

Durante a leitura de seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso argumentou que os defensores da tese apresentada no plenário se basearam principalmente em três argumentos: o artigo 5º, LVII da Constituição, o qual defende que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória"; o "suposto" impacto da prisão em segunda instância sobre os índices de encarceramento; e o "suposto" impacto sobre os réus pobres.

Barroso defendeu que nenhum desses argumentos "resistem ao teste da realidade". "São ideias que não correspondem aos fatos", afirmou o ministro, citando a música O Tempo Não Para, de Cazuza.

Rosa Weber - Voltaire, Salvador Dalí e Angela Davis

No começo de seu voto, Rosa Weber evoca uma passagem do iluminista Voltaire, para abordar a relação entre o trabalho da Corte e a opinião pública sobre suas decisões: "Na França, não se acredita que o papa, assistido por seus cardeais, seja infalível: poder-se-ia, do mesmo modo, crer que oito juízes de Toulouse não o são".

Ainda no início de sua leitura, a ministra, que se posicionou contra a prisão em 2ª instância, argumentou que o direito, assim como a arte, é passível de múltiplas interpretações. "Lembro aqui instigante entrevista de Salvador Dalí, ao dizer que a beleza da obra de arte não está necessariamente na obra em si, mas nos olhos de quem a contempla", pontuou.

Mais tarde, Weber também evocou no plenário as ideias defendidas pela "acadêmica, ativista feminista e autora de livros sobre o sistema prisional" Angela Davis, coincidentemente de passagem pelo Brasil nesta semana. "De fato, qualquer que seja sua justificativa, 'o encarceramento é a própria negação da liberdade'."

Alexandre de Moraes - Apocalipse, Churchill, Ghandi e Martin Luther King Jr.

Em seu voto, Alexandre de Moraes citou a pressão da opinião pública sobre o STF, a "onda de fake news" que os ministros têm enfrentado desde que começou o julgamento e até a responsabilidade do próprio plenário em não se deixar abater. Para isso, ele citou passagens que vão da Bíblia ao ex-primeiro ministro britânico Winston Churchill.

"Nesse Armagedon, em vez de granizo, terremoto, enxurradas, fogo, enxofre, raios e doenças, o STF é ameaçado com fake news", afirmou Moraes, fazendo referência ao Apocalipse descrito no último livro da Bíblia. Em seguida, ele cita uma passagem de Memórias da Segunda Guerra, de Churchill: "O único caminho sensato consiste em agir, dia após dia, de acordo com o que a própria consciência parece ditar".

Antes de terminar sua leitura, o ministro ainda cita dois pacificadores para reforçar a importância de não se influenciar pela opinião pública. "O 'Populismo Judicial' é incompatível com o exercício da judicatura, pois sempre é mais fácil, como já advertia [Mahatma] Gandhi, 'se posicionar no meio da multidão, mas é preciso coragem para se posicionar sozinho'", afirmou.

Mais tarde, ele relembra uma passagem dita pelo norte-americano Martin Luther King Jr., ao afirmar que é preciso coragem para debater e pautar temas controversos: "A vaidade faz a pergunta: isso é popular? Mas a consciência faz a pergunta: isso é certo?".

Estadão
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