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Cidade mais bolsonarista do Brasil pretende reforçar apoio ao presidente por 'patriotismo'

Nova Pádua (RS), conhecida como 'Pequeno Paraíso Italiano', depositou 92,96% dos votos válidos em Bolsonaro nas últimas eleições

29 set 2022 - 05h00
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É comum encontrar o símbolo nacional em comércios, casas e até carros de Nova Pádua
É comum encontrar o símbolo nacional em comércios, casas e até carros de Nova Pádua
Foto: Juliana Steil / Redação Terra

No autodenominado "Pequeno Paraíso Italiano", são bandeiras do Brasil que estão hasteadas em quintais, janelas e calçadas. Esta é a visão que se tem ao chegar no centro de Nova Pádua, município de 2,5 mil habitantes da serra gaúcha que, em 2018, recebeu o título de cidade mais bolsonarista do País. Naquele ano, a população local depositou 92,96% dos votos em Jair Bolsonaro --na época do PSL.

Localizada a 160 km da capital Porto Alegre (RS), Nova Pádua era um distrito da vizinha Flores da Cunha antes de se emancipar, em 1992. A região ganhou forma por imigrantes italianos que deixaram Vêneto, na Itália, ainda no século 19.

É por isso que, no bar que serve como rodoviária para o município de um bairro só, os mais velhos sentam à porta e batem papo em um idioma que, com certeza, não é o português. Eles falam talian, dialeto vêneto reconhecido por lei municipal como língua oficial da cidade.

As referências às raízes italianas continuam. As casas são coloridas e têm uma arquitetura própria, espaçosa, arborizada e sem grades, em nada lembrando os grandes prédios cinzas que se amontoam na capital a algumas horas dali. No único restaurante da cidade, o Del Miro, vinho é tomado no almoço e uma sobremesa alcoólica é servida com naturalidade no buffet.

Apesar de tanto apoio e de resgatar o patriotismo brasileiro de um município que se reconhece italiano, Bolsonaro não prestigiou os moradores com uma visita sequer ao longo de seu mandato.

Bandeiras pela cidade

Destoando de todo o "paraíso italiano", uma bandeira verde e amarela tremula com o vento da serra no quintal de uma grande e luxuosa residência na Rua Professor Arcângelo Vazata, a principal da cidade. Símbolo de nossa nação, foi também adotada como marca da campanha do atual presidente. De dentro da casa, surge uma senhora elegante, com um lenço no pescoço. 

É dona Laura Salvador, 77, que explica que a bandeira está ali por causa das comemorações do Bicentenário da Independência, mas, por ocasião das eleições presidenciais, ficará por mais algum tempo fincada em seu quintal. 

"Setembro é o mês da Pátria. Como professora, eu sempre fiz isso [exibir a bandeira]. Agora, como é época de eleições, vou deixar até depois. Tem gente que esconde seu voto, né, mas é agora que o Brasil precisa", reflete.

Ela, que revela ter votado em Jair Bolsonaro nas últimas eleições, diz que ainda não está certa de seu voto para presidente, mas, provavelmente, deve seguir "esse caminho" nas urnas em outubro. A outra opção seria "a moça de cabelo escuro", como tenta explicar durante uma falha de memória, se referindo à candidata Simone Tebet (MDB).

A atuação do presidente eleito não foi satisfatória para a professora aposentada, mas a culpa recai sobre seus apoiadores – ou a falta deles. "Tive muita pena do mandato, me coloquei no lugar dele. Ele foi um homem muito simples, mas não deixaram muito ele fazer o que precisava. O voto mais limpo que poderia ser, é nele", diz. 

Ela liga a possível vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) --principal adversário do presidente-- ao comunismo, discurso constantemente usado por Bolsonaro na campanha.

"Sinto uma coisa triste. Se ele [Bolsonaro] perder, vai entrar o comunismo, me perdoe ser sincera. Converso com minha neta, de 11 anos. Ela não vota, mas mando ela rezar pelo Brasil. Para que ganhe a pessoa que mantenha nosso Brasil verde e amarelo", diz dona Laura, séria.

Critérios de escolha

A professora aposentada não é a única a decorar a cidade com as cores da bandeira do Brasil. A poucos metros de distância, Odila Bisinella, 67, dona de uma loja que vende sapatos, roupas e acessórios, também deixou o estandarte patriota na porta do comércio.

Segundo a comerciante, foi a primeira coisa que fez ao acordar no primeiro dia de setembro, mas agora a bandeira está lá por outra razão. "Se meu Bolsonaro ganhar, vou deixar em todos os meses de outubro. Eu sou muito patriota", diz, com um forte sotaque.

Apesar de citar casos de corrupção no governo petista, o processo que levou Lula a prisão e também uma suposta "ditadura comunista", é uma característica específica que chama a atenção de Odila e se torna quase determinante para que ela opte por Bolsonaro: a idade. 

"A idade de Lula é um pouco avançada para governar um país", opina.

O petista é, realmente, o candidato mais velho entre os primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto, com 76 anos. Já Bolsonaro tem 67. Mas a idade não é um fator impeditivo na política. O atual presidente da Itália, Sergio Mattarella, completou 81 anos em julho, por exemplo.

Voto impresso

No único posto de gasolina paduense, um tímido adesivo na porta de vidro faz menção ao movimento bolsonarista pelo retorno do voto impresso, com uma bandeira brasileira ao fundo. "Saneamento das instituições já. Queremos voto impresso", diz o colante.

Um automóvel estacionado no posto tem o mesmo adesivo. A dona de ambos é Angela Scariot, 44, que reproduz a fake news propagada e nunca provada por Bolsonaro e diz que as urnas eletrônicas são fraudadas, mas não aponta a fonte da informação.

"Urna elétrica rouba. Por que não querem deixar voto impresso, se no mercado o comprovante é em papel?", exemplifica. A dona do posto foi eleitora de Bolsonaro nas últimas eleições e pretende repetir o feito.

A razão do uso da bandeira é, em grande parte, por causa do apoio da cidade ao candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL). Em 2018, Nova Pádua deu 92,96% dos votos válidos para o presidente
A razão do uso da bandeira é, em grande parte, por causa do apoio da cidade ao candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL). Em 2018, Nova Pádua deu 92,96% dos votos válidos para o presidente
Foto: Juliana Steil / Redação Terra

"Eu voto nele, não tenho partido político, vou pela pessoa", explica Angela. "Acredito nele, porque não é só ele que manda, ele precisa de um apoio maior. Bolsonaro não conseguiu fazer muita coisa porque ele não tem um grupo que o ajude."

Ela se arrisca ao explicar o motivo do "pequeno paraíso italiano" ter tantas bandeiras espalhadas, mesmo depois das comemorações de 7 de Setembro. "O outro governo estava aí há muito tempo, né? Bolsonaro chegou e renovou tudo", diz. 

Petistas ilhados

Apesar do alto índice a favor do presidente Jair Bolsonaro, na disputa do segundo turno de 2018, 134 paduenses votaram no candidato petista, Fernando Haddad. Estes eleitores não parecem declarar voto tão facilmente com bandeiras e símbolos em suas janelas e carros, mas Angela garante que, em uma cidade pequena como aquela, todos sabem quem são. 

"Nós sabemos quem são os petistas daqui, cada um deles", diz, mas sem revelar. "Cada um tem seu voto, mas a gente acaba se provocando, sem briga ou ofensa. Quando a gente sabe, a gente brinca provocando. Tem os que ficam bravos, mas religião, política ou futebol não se discute", assume.

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Essa é uma das reportagens da série especial de eleições do Terra Votos pelo Brasil. Eleitores de nove cidades brasileiras, que se destacaram nas Eleições de 2018 e nos últimos quatro anos, contam suas percepções sobre o País e expectativas para 2 de outubro. Novas reportagens serão publicadas diariamente ao longo desta semana.

Fonte: Redação Terra
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