Paulo Rocha: paixão por doces fez chef deixar quilombo em busca da alta gastronomia
À frente da confeitaria da rede de restaurantes de Erick Jacquin, chef quer ser exemplo para quem sonha em atuar nesse ramo da gastronomia
Foi vendo a avó preparar bolos perfumados, pães fofinhos e doces artesanais que Paulo Rocha se encantou pela confeitaria. Dona Zizi preparava os quitutes para serem vendidos na feira, quando a família ainda vivia em uma comunidade quilombola em Chapada do Norte, Minas Gerais. De lá para cá, a confeitaria virou o propósito de Paulo, que hoje é chef confeiteiro da rede de restaurantes do francês Erick Jacquin.
O caminho foi longo, mas desde o início ele sabia que queria trabalhar fazendo doces. Para Paulo, a relação com a confeitaria é ancestral.
"Era muito bom estar ali por perto. Em toda a minha família, todo mundo usa a gastronomia para ganhar dinheiro. Eu cresci tendo esse contato", lembra ele, em entrevista ao Terra.
Aos 12 anos, mudou-se com o pai para São Paulo. Aos 16, por coincidência ou não, conseguiu seu primeiro emprego em uma confeitaria da capital. A Zona Leste foi o ponto de partida para o caminho que Paulo trilharia até a alta gastronomia.
No início, ajudava os confeiteiros e fazia doces mais populares. Seu fascínio por livros e revistas que mostravam as sofisticadas técnicas francesas foi o ingrediente que adoçou sua trajetória. A paixão o levou a buscar cursos e aprimorar suas habilidades.
"Desde então, eu nunca mais fiz outra coisa. Me apaixonei. É um ambiente onde eu me sinto bem, onde eu não vejo o tempo passar, enfim, em que eu me adaptei muito bem, e dei continuidade a toda essa coisa da minha família, de trabalhar transformando alimentos", afirma.
A primeira confeitaria francesa
Através de contatos com amigos, logo Paulo Rocha conseguiu trabalhar em uma confeitaria francesa no bairro do Jardins, em São Paulo, onde pôde aprimorar suas técnicas. A experiência lhe rendeu outras oportunidades profissionais, e em 2014, entrou no Senac, onde cursou gastronomia.
Depois, Paulo passou a ser confeiteiro do Jockey Club de São Paulo, lugar frequentado pela alta sociedade paulistana, e começou a ser reconhecido pelo seu trabalho na alta gastronomia. O trabalho abriu portas, e não demorou até ele trabalhar com o chef francês e jurado do Masterchef Brasil, Erick Jacquin.
Visibilidade
Com forte presença nas redes sociais, Paulo sente a responsabilidade de ser um homem preto em um ambiente que é majoritariamente branco. Por isso, desde 2017 ele usa sua conta no Instagram para mostrar a jovens aspirantes a cozinheiros e confeiteiros que é possível encontrar oportunidades.
Ele não hesita em afirmar que a confeitaria pode ajudar a realizar sonhos, independentemente da origem das pessoas.
"Eu abri o Instagram na finalidade de conseguir mostrar meu trabalho para as pessoas e para poder também influenciar pessoas como eu, pretas, que vêm de longe, porque eu sei muito da realidade das pessoas que vêm de onde eu vim, da falta de oportunidades. No mundo da gastronomia, não era muito comum ver pessoas pretas liderando, chefiando", afirma.
Paulo Rocha destaca ainda o quanto é importante ter representatividade na gastronomia, para que as pessoas se sintam inspiradas e acreditem que seus sonhos também podem se tornar realidade.
"É aí que entra a minha missão, de mostrar que eu estou lá e que, sim, isso pode ser deles. O espaço é de todos e eles podem estar onde quiserem. A gente precisa criar algumas oportunidades e acreditar que a gente é capaz. Isso precisa estar dentro da pessoa", ressalta o chef confeiteiro.
Essa visibilidade tem dado certo. Paulo Rocha passou a receber convites para participar de programas de televisão, como o Masterchef, onde foi jurado convidado em uma prova. Ele também fez parte do elenco do Iron Chef, na Netflix, desta vez como participante. Lá, ele pôde conquistar o público com suas técnicas.
Já em 2022, Paulo apresentou o programa Esse Doce Tem História, no GNT, ao lado de Michele Crispim. No programa, uniu a paixão pela confeitaria ao amor por história, compartilhando informações sobre a criação de vários doces.
"Tenho muita vontade de ter um programa de TV para falar de sobremesas, de doces, contar as histórias deles, enfim. Tenho esse sonho", revela.
Novo projeto
Atualmente, o chef confeiteiro se prepara para lançar um curso online de bolos, com o objetivo de compartilhar seus conhecimentos com pessoas que desejam aprimorar suas habilidades e até empreender no ramo da confeitaria.
"Estou lançando esse curso para tentar ajudar a galera e poder fazer mais confeiteiros, para eles poderem viver da confeitaria como eu vivo hoje, tanto no trabalho no restaurante como nos trabalhos fora do restaurante. Acho que é muito importante estar sempre estudando", conta.
O chef reitera que a confeitaria pode ser uma ferramenta de transformação social, ao promover a diversidade, e pode se tornar até a principal fonte de renda de uma pessoa.
"Eu tenho o maior carinho e gosto muito de ensinar, então, eu acho que o curso ficou maravilhoso e vai poder ajudar mesmo muita gente. A ideia é conseguir fazer com que as pessoas vivam disso, porque é uma oportunidade para se ganhar dinheiro, é uma oportunidade para se cuidar da família e ser feliz", conclui.