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Política

Candidatos aliados de Lula 'surfam' nas redes com institutos federais lançados em São Paulo

De 11 cidades contempladas, oito contam com pré-candidatos do PT, incluindo dois prefeitos que tentam a reeleição; MEC nega influência política nas escolhas

27 mar 2024 - 15h03
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A lista de novos institutos federais anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no dia 12 de março, tem sido usada por postulantes a prefeito do PT no Estado de São Paulo para impulsionar suas candidaturas. Das 11 cidades contempladas, oito contam com pré-candidatos do partido nas eleições municipais de 2024. As obras também incluem duas novas estruturas na capital paulista, onde o PT não tem protagonismo na chapa, mas firmou aliança com o PSOL do deputado federal Guilherme Boulos.

Ministério da Educação anunciou a construção de 100 novos institutos federais no Brasil, 12 deles no Estado de São Paulo
Ministério da Educação anunciou a construção de 100 novos institutos federais no Brasil, 12 deles no Estado de São Paulo
Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado / Estadão

O Ministério da Educação (MEC) nega que a presença ou não de candidatos tenha sido um fator observado no momento de definir as cidades contempladas. "Os estudos e os critérios foram desenvolvidos pelo MEC em parceria com a Casa Civil. Foram levados em conta regiões que ainda não possuem unidades de Instituto Federal ou que registram número baixo de matrículas em cursos técnicos de nível médio em relação à população da região", afirma a pasta (veja mais informações sobre o critério adotado abaixo).

As obras de construção de novos institutos, porém, estão sendo usadas por políticos aliados que concorrerão nas eleições de outubro. O anúncio, no último dia 12, contou com a presença de diversos prefeitos e pré-candidatos do PT, que posaram para fotos ao lado do presidente Lula, do ministro da Educação, Camilo Santana, e do deputado federal licenciado e atual ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha.

O MEC decidiu, por exemplo, anunciar duas novas estruturas em Diadema e Mauá, as duas únicas cidades governadas pelo PT no Grande ABC, composto por sete municípios. Tanto o prefeito de Diadema, Filippi Júnior, quanto o de Mauá, Marcelo Oliveira, disputam um novo mandato em outubro.

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    O Estadão cruzou os dados do Censo Escolar de 2023, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), com o Censo Demográfico de 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), para verificar a quantidade de matriculados frente ao número de moradores. Seja considerando o ensino técnico como um todo ou apenas a oferta pública, a lista de cidades mais carentes não bate com os 11 municípios escolhidos pelo governo federal em São Paulo.

    O levantamento mostra que, na realidade, 86 cidades paulistas que não contam hoje com um instituto federal em seus domínios têm proporcionalmente menos matrículas no ensino técnico do que Carapicuíba, o município pior colocado entre aqueles incluídos na leva de novos institutos federais até 2026. Em Pederneiras, na região de Bauru, essa relação chega a um aluno em curso técnico a cada 6.404 pessoas, contra 202 em Carapicuíba e 73 em Santos, outra beneficiada pelo programa.

    As cidades paulistas escolhidas, por outro lado, são bastante populosas, o que ajuda a melhorar a imagem do governo em um momento de queda de popularidade nas pesquisas de opinião.

    O MEC foi procurado pela reportagem para explicar o critério usado pelo governo para a escolha das cidades e o cruzamento feito pelo Estadão, mas a pasta apenas reenviou a nota que havia sido encaminhada no primeiro questionamento, reforçando que os critérios levam em consideração o fato de as regiões não possuírem unidades de instituto federal ou registrarem número baixo de matrículas em cursos técnicos de nível médio em relação à população da região".

    Na lista do MEC, ficaram de fora cinco municípios com mais de 100 mil habitantes no Estado de São Paulo e que possuem número de matrículas mais baixo do que os contemplados. São eles: Várzea Paulista, Itapecerica da Serra, Valinhos, Itapevi e Votorantim. O número pode ser maior diante do fato de que os dados do Censo Escolar abrangem 293 do total de 645 municípios na plataforma do Inep.

    Dessas cinco cidades, ao menos duas esperavam contar com um instituto federal, segundo relato gestões municipais. A prefeitura de Itapecerica da Serra, município da região metropolitana de São Paulo governado por Doutor Nakano (PL), declara que enviou ofício nesse sentido no dia 15 de fevereiro e ainda "aguarda devolutiva do governo federal".

    Valinhos, que fica na região de Campinas, por sua vez, diz que os dados de educação são públicos e informados sistematicamente aos órgãos responsáveis e pede que a decisão de não receber um instituto federal mesmo sendo "mais bem qualificado para o programa" seja revista. "Valinhos lamenta essa decisão e questiona se ela realmente foi balizada por critérios técnicos", afirmou a prefeitura administrada por Lucimara Godoy (PSD).

    A especialista em políticas educacionais e presidente do Instituto Singularidades, Claudia Costin, aponta que a localização dos institutos pode ser alvo de pressões políticas, principalmente em ano eleitoral, mas pondera que as cidades beneficiadas não contam hoje com grande oferta de ensino técnico, o que tende a gerar um resultado positivo, e que, a seu ver, não faria tanto sentido inaugurar um instituto federal em uma cidade muito pequena.

    "Se tivéssemos essa demanda por vagas no ensino técnico registrada como temos, por exemplo, no caso de creches, o critério seria melhor", avalia. Claudia acrescenta que a localização dos institutos federais é um aspecto relevante para ampliar a oferta e estimular o desenvolvimento, sobretudo no interior. "E o ideal era que (a formação técnica) fosse conectada com a vocação econômica na cidade onde está inserida. Em áreas rurais, faz muito sentido oferecer cursos técnicos em agronegócio, por exemplo."

    A respeito da situação do ABC, onde apenas as cidades governadas pelo PT foram contempladas, a reportagem apurou que Mauá e Diadema, de fato, contam com menor proporção de matrículas no ensino técnico do que os municípios vizinhos, como justifica o MEC. Ao analisar o Estado de São Paulo como um todo, porém, 101 cidades que não têm previsão de receber institutos federais estão pior colocadas do que Mauá na lista, ou 137 no caso de Diadema.

    Estadão
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