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Pesquisadores da Capes dizem não receber bolsa há dois meses

Para alguns dos pesquisadores, o atraso nos repasses representa incertezas em relação ao futuro do projeto de pesquisa e falta de renda para as despesas básicas

8 jan 2015 - 17h21
(atualizado às 17h42)
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<p>MEC enviou um comunicado oficial afirmando que o pagamento que deveria ser creditado em janeiro será creditado nesta quinta-feira</p>
MEC enviou um comunicado oficial afirmando que o pagamento que deveria ser creditado em janeiro será creditado nesta quinta-feira
Foto: Guilherme Lara Campos

Milhares de pesquisadores de todo o País afirmam que o pagamento da bolsa-auxílio oferecida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) tem sido depositado com atraso, ou não foi feito, desde o último mês de novembro. O dinheiro é utilizado como pagamento para a realização dos projetos de pesquisa apoiados pelo órgão federal, ligado ao Ministério da Educação (MEC).

De acordo com depoimentos colhidos pelo Terra, os atrasos acontecem em diferentes modalidades de bolsas, que vão de iniciação à docência a programas de pós-doutorado. Os pesquisadores que recebem as bolsas são alunos de mestrado, doutorado e pós-doutorado, que assinam um acordo em que concordam em não ter nenhum vínculo empregatício enquanto estiverem realizando as pesquisas pela Capes. Com isso, o valor da bolsa é a única fonte de renda que possuem. Os professores pesquisadores e tutores dos cursos superiores a distância (EAD - UAB) também não receberam suas bolsas da Capes desde novembro.

A bióloga Caroline Felfili Fortes é mestre em Ecologia e cursa doutorado em Biotecnologia na Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT). Ela conta que está grávida de sete meses e se propôs a ser bolsista da Capes em uma tentativa de melhorar o seu currículo e buscar novas oportunidades no mercado de trabalho. No entanto, com o atraso do pagamento, Caroline tem tido dificuldades para manter as contas da casa em ordem.

"Temos família, temos que comer, pagar aluguel e honrar todas as dívidas que temos. E como ficamos? Não temos direito algum, pois somos vistos como estudantes", explica. "Somos adultos, responsáveis, profissionais, mães e pais de família, que saíram do mercado de trabalho para estudar. Somente fizemos isso, porque poderíamos contar com essa bolsa, que já não é muito, porém ajuda", desabafa a bióloga. 

Os pagamentos eram feitos até o terceiro dia útil de cada mês. Nos últimos meses, foi alterado para o quinto dia útil. No entanto, desde dezembro, os estudantes têm iniciado o mês sem saber quando vão receber e por quanto tempo a bolsa irá atrasar.

Karina de Araújo Dias é doutoranda do programa de pós-graduação em Educação na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Ela conta que o valor que deveria ter sido depositado no início de novembro chegou apenas no dia 22. Os pagamentos de dezembro e de janeiro também não foram depositados, informa Karina. Geane Kantovitz é bolsista da Fapesc, na mesma universidade, e passa pela mesma situação. "Não recebemos a bolsa nem em dezembro e nem em janeiro", afirma.

Os informes de pagamento dos bolsistas da Capes são publicados no Portal da Transparência do governo federal. No entanto, o portal está desatualizado. A equipe técnica responsável pelo site enviou um e-mail justificando a falta de atualização por conta de alterações no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), o sistema de origem dos dados para publicação no portal. Não há previsão para a normalização do serviço.

"É difícil fazer compromissos financeiros quando não existe regularidade no pagamento de nossas bolsas. Vencem-se os prazos, continuamos sem dinheiro e ganhamos a fama de caloteiros", afirmou Gustavo Garcia Santiago, bolsista de mestrado em Ciência Animal pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).

"Eu me mato de trabalhar, tenho cinco filhos, não tenho direito a férias, ao 13° salário, à licença maternidade remunerada, ao INSS, a nada. E agora o direito e dever de pagar minhas contas em dia estão sendo negados por conta desses atrasos", afirmou Milene Oliveira, bolsista da Universidade Federal de São Carlos, no interior paulista.

Ao procurar pelo MEC, a Associação Nacional de Pós-Graduandos seguiu sem estimativa de quando a situação será normalizada. Procurado pela reportagem, o Ministério afirmou, em um primeiro contato, que a Capes possui autonomia e deve responder pela denúncia. A Capes, por sua vez, disse que não possui gerência financeira própria e que o MEC é quem deve responder pelo caso.

Mais tarde, o MEC enviou um comunicado oficial afirmando que o pagamento que deveria ser creditado em janeiro será creditado ainda nesta quinta-feira (08) na conta dos pesquisadores. Além disso, afirmou que "o MEC trabalha junto ao Ministério da Fazenda para regularizar o fluxo financeiro e solucionar o problema" referente aos demais meses em atraso. 

Desvalorização do pesquisador no Brasil

No último dia 1º, no discurso de posse, a presidente da República Dilma Rousseff anunciou que a educação será a "prioridade das prioridades" de seu atual mandato. Dilma defendeu também um ensino de qualidade em todos os níveis de formação e para todos os segmentos da sociedade. 

Presidente Dilma Rousseff acena para multidão durante cerimônia de posse em Brasília. 01/01/2015
Presidente Dilma Rousseff acena para multidão durante cerimônia de posse em Brasília. 01/01/2015
Foto: Sergio Moraes / Reuters

No entanto, os pesquisadores da Capes afirmam que, embora a educação seja considerada a prioridade atual do governo, eles não sentem que o segmento de pesquisa seja valorizado no Brasil. 

"Quando você opta, no Brasil, por uma especialização stricto sensu [programas de mestrados e doutorados de maior duração] e decide seguir o caminho da pesquisa científica, descobre que vai ter de passar no mínimo seis anos da sua vida adulta e economicamente ativa trabalhando muito e em condições nem sempre adequadas. Ao fim dessa jornada, você cai no mundo profissional com um monte de diplomas que não necessariamente te garantem um emprego", conta a geógrafa Thamyres Sabrina Gonçalves, mestranda em Ciência Florestal e bolsista da Capes.

"É preciso repensar o profissional pesquisador no Brasil, afinal todas essas pessoas são profissionais que abriram mão de sua atuação e de parte de sua carreira profissional para contribuírem com a construção do conhecimento e da ciência no País, isso em números significa muita coisa pro governo, precisamos ser mais respeitados", afirma.

A bióloga Caroline Felfili Fortes, que cursa doutorado em Biotecnologia na UFMT, lembra a importância dos pesquisadores. "É graças ao trabalho desenvolvido pelos cientistas brasileiros, que em sua maioria são estudantes de pós-graduação, que muitos avanços tecnológicos são obtidos para o País. É uma área estratégica para transformações no quadro econômico, político e internacional do Brasil."

Os bolsistas da Capes são pós-graduandos que trabalham, no mínimo, 40 horas por semana. Eles recebem uma bolsa de R$ 1.500 para mestrado, R$ 2.200 para doutorado e R$ 4.100 para pós doutorado.

Fonte: Terra
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