Seca e calor levam cidades de SP a racionar água; saiba quais
Incêndios no interior do Estado agravam a situação, elevando o consumo no combate às chamas
A seca e o calor já levam municípios a adotar ou prever racionamento de água no interior de São Paulo. Cidades importantes como Bauru e São José do Rio Preto enfrentam escassez de água para abastecimento. Em Bauru e outras cidades o rodízio já está em vigor. Os incêndios agravam a situação, elevando o consumo de água, usada para a limpeza da fuligem nas casas e no combate às chamas.
Ao menos 53 municípios do Estado estão em emergência devido à seca e aos incêndios, segundo a Defesa Civil estadual. No final de julho, eram dez cidades nessa condição.
Com a previsão de atraso na temporada de chuvas este ano, as prefeituras realizam campanhas e impõem multas a quem desperdiça água.
Nesta quarta-feira, 11, o município de Atibaia decretou estado de emergência hídrica e adotou o rodízio devido ao risco de desabastecimento. A cidade foi dividida em três setores que recebem água em dias alternados.
O decreto municipal permite aplicar multas a quem lava carros, calçadas ou rega jardins. Os moradores foram convocados a denunciar o desperdício. "A medida pretende mitigar os efeitos das secas de forma a manter o sistema de abastecimento de água com o menor prejuízo possível à população", diz o decreto.
O departamento de água de Bauru, cidade de 380 mil habitantes, iniciou, na segunda-feira, 9, uma série de manobras na rede para se adequar à queda drástica no nível do reservatório de captação das águas do rio Batalha. Nesta quarta-feira, o nível do rio atingiu 1 metro, mais de três vezes abaixo do ideal, que é de 3,20 m. Vários bairros passaram a receber água de poços profundos para equilibrar a distribuição do líquido. O racionamento teve início no dia 9 de maio e atualmente os bairros ficam 24 horas com água e 48 sem.
Em Vinhedo, o rodízio também perdura desde maio e o município passou a usar água de poços artesianos particulares. A multa para quem desperdiça água é de R$ 663, valor que dobra em caso de reincidência. Moradores reclamam que recebem água suja na retomada do fornecimento, durante o rodízio. A Sanebavi, empresa de saneamento do município, disse que a água retorna com muita velocidade e leva resíduos que estavam presos na tubulação.
Lavar fuligem
O maior uso de água para limpeza da fuligem das queimadas também prejudica o abastecimento, segundo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). No final de agosto, a companhia chegou a emitir um alerta sobre o risco de falta de água nas cidades de Franca e Restinga devido ao alto uso de água para limpar a sujeira da fuligem.
Em Sorocaba, o prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) assinou decreto declarando emergência climática no município. A norma prevê multa de até R$ 150 mil para quem for flagrado colocando fogo em mato. Devido ao grande número de focos, o uso de água para abastecer caminhões-pipa do Corpo de Bombeiros e da Defesa Civil para combater os incêndios tem causado risco para o abastecimento urbano.
Os incêndios que se espalham pelo interior, além de elevar o consumo de água para a limpeza da fuligem e o combate às chamas, chegam a ter impacto direto no abastecimento. Em Marília, no domingo, 8, o fogo atingiu transformadores e equipamentos do sistema de captação do Rio do Peixe, que abastece 50% da cidade. A suspeita é de que uma queimada no terreno vizinho atingiu a estação. Até a manhã desta quinta havia falta pontual de água.
Cantareira em atenção
O Sistema Cantareira, que abastece grande parte da Região Metropolitana de São Paulo, está com 55% do volume útil total e opera na faixa de atenção, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). A faixa de alerta começa quando o sistema opera abaixo de 40%.
Com a falta de chuvas, os reservatórios vêm perdendo a reserva de água. No final de agosto, o volume útil total era de 57%, enquanto no fechamento de julho estava com 62%. No início de setembro de 2023, o Cantareira operava com 73% do volume útil.
Desde maio deste ano, o Sistema Cantareira é alimentado com a água proveniente da bacia do rio Paraíba do Sul, captada na Represa do Jaguari. Atualmente, são captados 7,5 metros cúbicos por segundo. Conforme o Cemaden, atualmente o sistema está classificado em situação de seca hidrológica variando de moderada a severa.
Além do Cantareira, a RMSP conta com outros seis sistemas de abastecimento, mas alguns estão em situação mais crítica. O Rio Claro tinha 26,9% do volume útil nesta quinta, enquanto a Represa de Guarapiranga estava com 40%. Na média, o volume armazenado total dos sistemas era de 52,8%, mas com operação negativa, ou seja, maior saída do que entrada de água.
O cenário afeta também bacias hidrográficas importantes para o abastecimento público. Nesta quinta, o rio Piracicaba, que abastece Piracicaba e Americana, estava com vazão 60% abaixo da média para o mês de setembro, segundo o Consórcio das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (PCJ). Na área urbana de Piracicaba a situação é mais crítica, com vazão de apenas 18,3 mil litros por segundo, um terço da média histórica, de 55,3 mil litros.
O Serviço Municipal de Água e Esgoto (Semae) capta de 300 a 400 litros por segundo, mas a má qualidade da água causa queda na oxigenação e dificulta o tratamento. Isso ocorre, segundo a prefeitura, porque alguns municípios à montante de Piracicaba não tratam seus esgotos. O nível baixo tem causado mortandade de peixes. A cachoeira, atração turística da cidade, se transformou em fios de água entre as pedras.
Em Porto Ferreira, o rio Mogi Guaçu, no ponto de captação, está com 0,73 metro, quando o mínimo necessário para a captação é de 0,50 m. "Diante do cenário de atenção por conta do nível do manancial e, especialmente, com as altas temperaturas que têm gerado aumento no consumo de água, a concessionária destaca que o uso racional do recurso por parte da população é um importante aliado para atravessarmos o momento mais crítico da estiagem este ano", disse a concessionária BKR, responsável pelo abastecimento.
Sem racionamento
A Sabesp informou que o Sistema Integrado Metropolitano opera nesta quinta-feira com 52,8% do volume total e se mantém na média dos últimos cinco anos, que ficou em 52%. "O sistema é composto por 7 mananciais, o que possibilita abastecer áreas diferentes da metrópole com mais de um sistema, conforme a necessidade", disse.
A companhia destacou os investimentos realizados desde a crise hídrica de 2014/15 para tornar o sistema mais robusto. "Não há racionamento neste momento nos 375 municípios operados pela Sabesp, mas, como mostram a severa estiagem e as altas temperaturas que afetam todo o país, a Companhia ressalta que o uso consciente da água é essencial em qualquer época", afirmou, em nota.
Chuvas podem atrasar
Conforme o Cemaden, a previsão meteorológica indica um provável atraso no início da próxima estação chuvosa, o que resultará na prolongação do período de estiagem nos rios de todas as regiões do país, com exceção da região Sul.
O provável atraso é devido ao maior aquecimento do Oceano Atlântico na região da América Central, favorecendo chuvas mais intensas que o normal nessa região, o que acarreta diminuição das chuvas sobre a maior parte da América do Sul, incluindo o Brasil. Como resultado, a situação de seca deve persistir ou até se agravar na maioria das bacias hidrográficas do país.
Ainda segundo o Cemaden, as causas da seca na região Sudeste, que inclui São Paulo, resultam de uma combinação de fatores como o déficit de chuvas na estação passada devido a uma atuação mais intensa do fenômeno El Niño. Em consequência, não houve a recarga dos aquíferos, mantendo os rios abaixo dos níveis esperados.
Também houve antecipação da estação seca no estado, com chuvas escassas desde o mês de maio. Essa situação deixou o solo e a vegetação extremamente secos, criando um ambiente favorável para a propagação de grandes incêndios.
O órgão vinculado ao Ministério da Ciência Tecnologia e Inovações destaca situações que atuam no longo prazo, como as mudanças climáticas, que geram um aquecimento progressivo da atmosfera, produzindo sequências mais longas de dias sem chuva, e as mudanças no uso do solo, com a substituição de áreas de floresta por campos dedicados à agricultura e pecuária, o que deriva na redução da umidade ambiente e, consequentemente, das precipitações.