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Observatório no Rio critica resultados e transparência da intervenção federal

'Quadro desalentador', diz pesquisadora. Intervenção chega a seis meses com 360 operações, envolvendo 170 mil policiais

16 ago 2018 - 10h40
(atualizado em 17/8/2018 às 00h36)
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RIO E BRASÍLIA - Passados seis meses da intervenção federal, os moradores do Rio de Janeiro continuam a sofrer com tiroteios, mortes e insegurança. Os milhares de homens das forças de segurança nas ruas e favelas não têm produzido os resultados esperados. E, ainda por cima, não há transparência sobre os custos envolvidos nas operações. Esse é o balanço do Observatório da Intervenção, divulgado no Rio na manhã desta quinta-feira, 16.

De acordo com os números do Observatório, foram realizadas até hoje 360 operações, envolvendo 170 mil militares e policiais. As ações, no entanto, não conseguiram coibir a violência. Neste mesmo período, foram registrados 4.500 tiroteios e 30 chacinas (quando há três ou mais mortos). Pelo menos 600 pessoas foram mortas em ações policiais. E 50 PMs e um militar foram assassinados.

"Olhando os números, vemos um quadro desalentador", afirmou a coordenadora do Observatório, Sílvia Ramos. "Os índices mais sensíveis permanecem altos, como mortes violentas, tiroteios e chacinas. Houve um crescimento preocupante de ocorrências que denotam descontrole no sistema de segurança pública, como mortes decorrentes de intervenção militar e policial. A vitimização dos próprios agentes de segurança continua alta."

Sílvia Ramos cita ainda episódios traumáticos registrados sob a intervenção. "Os tiros disparados de helicópteros da polícia sobre favelas, a morte de Marcus Vinícius da Silva, de 14 anos, atingido por tiros originados de um blindado quando seguia para a escola, no Complexo da Maré", enumerou.

O relatório critica o que chama de "fraca cultura investigativa da Polícia do Rio. "Depois de 6 meses, a polícia fluminense, (...), não elucidou o crime contra Marielle Franco (...), nem explicou como se deu a chacina da Rocinha, em que oito pessoas foram executadas durante operação do Batalhão de Choque. A verdade é que o Gabinete da Intervenção não deu respostas sobre as mais de 600 mortes decorrentes de ações policiais sob sua gestão."

Os custos da intervenção federal tampouco são transparentes, segundo o balanço divulgado pelo Observatório. "O Governo Federal abriu um crédito extraordinário de R$ 1,2 bilhão para intervenção federal no Rio de Janeiro, em março de 2018", aponta o relatório. "Deste montante, R$ 900 milhões deverão ser destinados para despesas correntes (gasolina, munição, alimentação - tudo o que não incluir salários) e R$ 300 milhões para investimentos (aquisição de equipamentos, armamentos e veículos, por exemplo). Até o fim de julho, a Presidência da República, responsável pela execução dos recursos, havia empenhado apenas R$ 830 mil e pago R$ 103 mil dessa verba."

Segundo Sílvia Ramos, "as dezenas de operações militares, que o próprio Exército chama de faraônicas, e que, segundo os porta-vozes da intervenção federal, chegam a mobilizar cinco mil agentes, ao custo de mais de R$ 1 milhão cada, arrecadaram poucas armas e tiveram efeito reduzido na desarticulação de quadrilhas até agora".

General tem avaliação positiva da intervenção

Mesmo com as avaliações do Observatório da Intervenção Federal na Segurança Pública no Rio de Janeiro de que, passados seis meses da intervenção, os moradores continuam a sofrer com tiroteios, mortes e insegurança, os militares avaliam que as operações no Estado estão "dando certo" e apresentam números para defender o trabalho das tropas federais.

Relatório elaborado pelo Instituto de Segurança Pública (ISP) do Rio e entregue ao presidente Michel Temer no início da semana informa que o número de latrocínios (roubos seguidos de morte) caiu 55% no mês passado se comparado a março, quando começou a intervenção.

No mesmo período, segundo esse relatório, crimes com letalidade violenta caíram 14,15%, homicídios foram reduzidos em 19,69%, roubo de veículos, 34,34% e roubo de rua caiu 1,65%. "Esses números do ISP comprovam que o trabalho da intervenção está dando certo, ao contrário do que tentam dizer", afirmou ao Estado o general Walter Braga Netto, responsável pela intervenção federal, que esteve em Brasília, participando da reunião do Alto Comando do Exército.

Outro dado apresentado pelo general Braga Netto para mostrar que o trabalho de reconstituição do Estado na área de segurança pública e das polícias está dando certo é que, no último mês, nenhum policial militar foi morto. Para ele, este resultado é fruto do treinamento oferecido nos centros do Exército. "Nunca prometemos que em seis meses íamos resolver o problema da insegurança no Rio", afirmou o general Braga, ao citar que todo o esforço, neste momento, é de reconstituição da estrutura das polícias. "É um trabalho estrutural, de reconstituição", observou.

No governo, o avaliação é de que será necessário intensificar a divulgação dos dados e resultados dos trabalhos.

"Pelo quarto mês consecutivo houve uma redução nos índices de criminalidade. O esforço do Gabinete de Intervenção Federal para melhorar a gestão na área de segurança pública do Rio de Janeiro é essencial para a contínua queda na criminalidade", afirmou o ministro da Defesa, general Joaquim Silva e Luna, ao Estado.

Neste processo todo ainda houve o "embate" com o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, que, atendendo a pressões, colocou à disposição do gabinete de intervenção a Polícia Federal para investigar o assassinato da vereadora Marielle Franco e do seu motorista, sob a alegação de que poderia haver suspeita de envolvimento de agentes públicos no caso. A Secretaria de Segurança Pública rejeitou a proposta.

Os militares consultados pelo Estado lembraram que como a segurança pública do Rio está sob intervenção federal, a Polícia Federal já está trabalhando em cooperação com a Polícia Civil, que está cuidando do caso, desde o início das apurações. Além disso, o gabinete de intervenção considera que a Polícia Civil é o órgão com mais competência técnica para investigar um homicídio.

Estadão
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