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Após queixa de mãe, polícias investigam morte de rapaz em suposto confronto

Professora investigou por conta própria o desaparecimento do filho; testemunha disse que jovem foi agredido e levado por policiais

14 ago 2018 - 03h11
(atualizado em 15/8/2018 às 11h43)
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Diego Ferreira Lazarin, cuja morte é investigada pela polícia
Diego Ferreira Lazarin, cuja morte é investigada pela polícia
Foto: Reprodução / Estadão

A Corregedoria da Polícia Militar e a Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) apuram se uma morte registrada como "decorrente de oposição à intervenção policial" ocorrida no último dia 19 no Morumbi, zona sul de São Paulo, foi na verdade um caso de homicídio de um homem, de 29 anos, praticado por PMs. As suspeitas começaram após queixas da mãe, que procurou os dois órgãos depois de investigar, ela mesma, o desaparecimento do filho.

A mãe, a professora Helena da Ressurreição Pereira Ferreira, de 51 anos, relata duas ameaças, uma contra ela e outra contra uma testemunha do caso, após fazer as denúncias. Ela diz que procurou as polícias porque "confia que haja policiais honestos" que irão apurar o caso e para "evitar que isso aconteça com outras pessoas. "Vou até o fim", garante.

Diego Ferreira Lazarin, a vítima, tinha duas perfurações no abdome, três no tórax, uma nas costas, uma na lombar e uma última no lado direito, quando seu corpo quando foi levado para perícia, segundo informações do inquérito do caso. No registro da ocorrência, ele teria levado os tiros após sair de um Honda Fit roubado e atirar contra policiais militares da Força Tática do 16.º Batalhão da Polícia Militar, às 23h25 do dia 19, na Avenida Hebe Camargo, no Morumbi.

Os PMs responsáveis pelos disparos afirmaram à Polícia Civil que haviam suspeitado do Fit durante patrulhamento de rotina e que fizeram uma busca no sistema sobre as placas do carro. Ao descobrirem que havia registro de roubo do veículo, teriam passado a perseguir o automóvel até ele bater contra um muro. Do carro parado, saltaram três pessoas - Lazarin entre eles. Enquanto o rapaz disparava, segundo a versão dos PMs, os outros dois corriam para escapar, o que teriam conseguido. O rapaz teria levado os tiros enquanto enfrentava os policiais, que não ficaram feridos.

O lugar do acidente, da troca de tiros e da morte do rapaz não tinha câmeras de segurança, ainda segundo informações do inquérito. Os policiais apresentaram uma arma atribuída a Lazarin, uma pistola calibre 380 e entregaram as suas: uma metralhadora e uma pistola calibre .40.

Lazarin era dependente de crack, segundo sua mãe informou aos órgãos de investigação. Ela conta que já havia cuidado da internação do rapaz para tratar da dependência "mais de dez vezes" e que ele havia deixado o trabalho, em um outlet de roupas de marca de Embu das Artes, na Grande São Paulo, havia dois meses, "pois sofreu nova recaída". Ela contou à polícia os detalhes de sua investigação paralela, que apontam para outra razão para sua morte.

Sumiço. A mãe de Lazarin contou que, no mesmo dia 19, quando o filho morreu, ele saiu de casa por volta das 20 horas dizendo que "iria andar". Os dois moravam juntos, em uma casa no centro de Taboão da Serra, Grande São Paulo. Dois dias depois de sumir, como o rapaz não voltou para casa, ela passou a procurá-lo. "Era normal ele ficar fora alguns dias, por causa da dependência dele. Já tinha acontecido antes", conta a mãe. Nessa procura, ela chegou a registrar um boletim de ocorrência de desaparecimento quando foi checar se ele estava preso no 1.º Distrito Policial de Taboão, mas foi em uma mini-cracolândia também em Taboão, a "saída da Fazendinha", que teve notícias do rapaz.

"Por volta das 21h ou das 22h, uma Blazer das antigas, da PM, abordou o Diego (Lazarin) e outro rapaz", conta a mãe. Os policiais teriam perguntado se algum deles "tinha passagem" (já havia sido preso anteriormente) e seu filho teria dito que sim, segundo uma testemunha que a mãe ouviu. O rapaz já havia sido detido por tráfico de drogas e furto e passou 60 dias no Centro de Detenção Provisória de Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo. Nos registros das ocorrências, feitos entre 2010 e o ano passado, o rapaz declarou ter cometido crimes para comprar pedras de crack.

Helena diz ter conversado com o rapaz que estaria com Lazarin. Segundo a mãe, ele contou que o filho começou a ser agredido ali mesmo, na frente da testemunha, e depois foi levado pelos policiais. Após isso, desapareceu.

A mãe conta que, no dia 25, enquanto estava na Corregedoria da PM contando sua história, após registrar o desaparecimento mas ainda sem saber que ele estava morto, o outro filho dela e a nora teriam sido abordados, em casa, por homens em um carro branco. Eles teriam feito ameaças, dizendo que se ela estava procurando pelo filho, iria encontrá-lo. Ela teve a confirmação da morte no mesmo dia.

A Polícia Civil localizou os donos do Honda Fit que Lazarin estaria ocupando e os interrogou no último dia 8. O casal, um professor e uma bióloga, contaram que o veículo foi levado por três pessoas no dia 18 de julho, por volta das 19h, na Vila Sônia, zona oeste, bairro próximo do Morumbi, e que um dos assaltantes colocou a mão na cintura, aparentando estar armado. Ambos viram fotos de Lazarin e disseram que, embora o rapaz tivesse a mesma cor de pele (branca) de um dos assaltantes, não era possível reconhecê-lo como o autor do crime.

O caso segue em investigação. O Estado questionou a PM sobre o destino dos dois policiais militares envolvidos na ocorrência, mas não teve detalhes. Em nota, a assessoria de imprensa da PM informou que uma apuração foi instaurada no dia 25 e que "a Corregedoria iniciou investigação específica sobre a ocorrência, a qual ainda está em curso".

O 16.º Batalhão da Polícia Militar é o mais letal da capital paulista, segundo relatório sobre letalidade policial do ano de 2017 divulgado nesta segunda-feira, 13, pela Ouvidoria das Polícias do Estado de São Paulo. Policiais dessa divisão da PM se envolveram em ao menos 18 ocorrências em que suspeitos terminaram mortos. No Estado, que teve 940 registros ao todo, ele só perde para o 41.º Batalhão da PM, em Santo André, que teve 21 casos no ano passado, e para a Rota, que atua em todo o Estado.

Estadão
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