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Até onde Temer pode se segurar?

22 mai 2017 - 12h01
(atualizado às 17h16)
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Próximos dias testam novamente o que de fato resta do capital político do presidente. Julgamentos e tentativa de retomada de votações no Congresso devem servir como termômetro.A avalanche de denúncias sugere que seu governo está acabado, mas Michel Temer ainda tenta demonstrar que tem força para resistir. O presidente passou o domingo (21/05) em encontros com ministros e representantes de sua base aliada no Congresso em um esforço para evitar novas deserções, demonstrando que ainda lhe resta alguma capacidade de reação.

Por ora, a iniciativa parece ter momentaneamente estancado a sangria e comprado algum tempo para o presidente entre seus aliados, tudo isso após uma semana que terminou com a saída de ministros e notícias - posteriormente desmentidas - que cravaram como certa a sua renúncia após a divulgação da delação da JBS.

No domingo, um dos encontros entre Temer e aliados reuniu 17 ministros, 23 deputados e seis senadores de diversos partidos. Os políticos que falaram à imprensa afastaram, por ora, o risco de uma debandada ainda maior. O discurso entre aliados variou entre a defesa do presidente e um resignado "ruim com ele, pior sem ele".

O maior risco imediato para Temer era a saída do DEM e do PSDB, que serviram de fiadores do seu governo após o afastamento de Dilma Rousseff em 2016. As duas siglas chegaram a ensaiar um desembarque conjunto, mas acabaram decidindo esperar. Por enquanto, só o PSB (que tem sete senadores e 27 deputados) deixou o governo. Outro alívio para o planalto ocorreu nas ruas. Os protestos contra o presidente no fim de semana também não repetiram o efeito de manifestações anteriores, reunindo apenas algumas milhares de pessoas.

O presidente também continua a afirmar que não vai renunciar. Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, disse que tomar a iniciativa de deixar o cargo "seria admissão de culpa".

Próximos passos

Embora Temer tente demonstrar que ainda tem algum controle sobre os acontecimentos, os próximos dias devem testar novamente o que de fato resta do seu capital político.

A principal frente contra o presidente está no âmbito jurídico. Temer se tornou alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal (STF) por suspeita de corrupção passiva, obstrução à Justiça e organização criminosa.

No último sábado, sua defesa pediu a suspensão das investigações e pediu que fosse realizada uma perícia no áudio envolvendo o presidente. Nesta segunda-feira, a defesa desistiu do pedido e afirmou ter contratado uma perícia particular, que encontrou "70 pontos de obscuridade" na gravação.

Segundo o advogado Gustavo Guedes, como a defesa está certa de que o áudio é fraudulento, quer que a investigação siga normalmente para provar a inocência do presidente.

Caso as investigações realmente prossigam, há, no entanto, o risco de que os caciques políticos que declararam apoio ao presidente no domingo mais uma vez reavaliem o suporte ao governo.

Antes do recuo da defesa nesta segunda-feira, Temer já vinha tentando desqualificar as acusações. No fim de semana o presidente atacou o empresário Joesley Batista, da JBS, a quem chamou de "conhecido falastrão". Também citou uma reportagem da Folha de S.Paulo que sugere que a gravação do diálogo entre o presidente e o empresário teria sido editada - outros veículos da imprensa contestaram as conclusões do perito ouvido pelo jornal.

Após o STF, outra frente jurídica será aberta. No dia 6 de junho, deve ser retomado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o julgamento da ação que pede a cassação da chapa Dilma-Temer em 2014. Mesmo antes das novas revelações da última semana, analistas já apostavam que o relator do processo, o ministro Herman Benjamin, votaria pela cassação.A incógnita sempre foi determinar como votariam os outros ministros desse tribunal e os palpites apontavam que o placar parecia favorável a Temer.

Apesar do propagandeado perfil técnico da corte, não é segredo que alguns ministros costumam levar em conta a situação política do momento quando tomam suas decisões.

O próprio presidente do tribunal, Gilmar Mendes, disse anteriormente que a corte levaria em conta a governabilidade do país. "É um julgamento complexo e certamente o tribunal terá de fazer uma análise de toda a ordem", disse. A declaração foi feita em abril, quando a situação do governo era mais sólida e a permanência de Temer até 2018 era encarada por mais atores políticos e sociais como um fator de estabilidade, e não de turbulência. Depois das revelações, um ministro não identificado disse que o julgamento poderá acabar sendo uma "saída honrosa" para Temer.

Antes do novo capítulo da crise, também havia a expectativa que a ação fosse se arrastar por meses se algum ministro fizesse um pedido de vista e pedisse mais tempo para analisar o relatório - o que também seria favorável a Temer. Com a temperatura política em alta, os ministros devem agora ser pressionados para chegarem mais rapidamente a uma decisão.

Agenda da "normalidade"

No Congresso, Temer enfrenta uma entrega já regular de pedidos de impeachment. Nessa frente, a situação de Temer parece mais confortável. Cabe ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM), aceitar ou não os pedidos. Fiel aliado do presidente e também um político alvo de inquéritos da operação Lava Jato, Maia ainda não deu qualquer indicação de que pretende romper com o presidente.

Mas a apresentação de pedidos tem um efeito de desgaste nos trabalhos do Congresso. Até mesmo a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que foi favorável ao impeachment de Dilma Rousseff em 2016, planeja entregar nesta semana o seu próprio pedido - é a terceira vez em sua história que a ordem decide apoiar a saída de um presidente.

Ainda no Congresso, Temer deve tentar pressionar pela retomada da votação de reformas, em uma tentativa de demonstrar que o governo não ficou paralisado. Nos últimos cinco dias, todo o esforço para passar os projetos teve que ser canalizado para dar sobrevida ao próprio governo. O desafio de demonstrar força com a agenda de reformas deve encontrar obstáculos com a delação da JBS, e não só porque Temer está na mira.

Maior doadora da campanha de 2014, a empresa afirma ter repassado valores para 166 deputados (quase 1/3 da Câmara) e 28 senadores. A revelação de que tantos congressistas estão envolvidos arrisca converter qualquer iniciativa coletiva de defesa de Temer em lutas individuais de sobrevivência política, paralisando de vez a agenda do presidente. Temer também continua a ser alvo de setores da imprensa que pedem sua renúncia e até agora não recebeu nenhuma demonstração de apoio público de membros da elite econômica interessada no seu pacote de reformas.

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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