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Jogos de Paris

Feitos da ginástica feminina aumentam visibilidade de negros

Daiane, em um discurso emocionado, logo após a conquista de Rebeca, ela destacou a importância das duas realizações para as mulheres negras

31 jul 2021 - 03h49
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Em 2021, Rebeca Andrade conquistou a medalha prata nos Jogos Olímpicos de Tóquio e se tornou a primeira medalhista olímpica da ginástica feminina brasileira. Em 2005, Daiane dos Santos se tornou a primeira brasileira a conquistar uma medalha de ouro em Campeonatos Mundiais da modalidade.

Rebeca Andrade foi prata no individual geral em Tóquio 2021
Rebeca Andrade foi prata no individual geral em Tóquio 2021
Foto: Reuters / BBC News Brasil

Embora separados por quase duas décadas, as duas realizações levam para um ponto único: o aumento da representatividade dos negros em uma modalidade que ainda luta para se popularizar. Esse é o principal consenso entre estudiosos da questão racial no Brasil.

A relação de continuidade entre os feitos das duas ginastas foi observada pela própria Daiane. Em um discurso emocionado, logo após a conquista de Rebeca, ela destacou a importância das duas realizações para as mulheres negras do País.

"A primeira medalha de ouro do Brasil em Mundiais foi negra. E agora a gente tem a primeira medalha olímpica da ginástica artística brasileira também com uma negra. Isso é muito forte", disse Daiane, chorando durante a transmissão. "Durante muito tempo, disseram que as pessoas negras não poderiam fazer alguns esportes. A primeira medalha foi de uma negra. Existe uma representatividade muito grande atrás disso", completou.

É preciso lembrar que, além das conquistas de Daiane e Rebeca, está o feito de Daniele Hypolito, que foi a primeira brasileira a conquistar uma medalha em Mundiais, uma prata no solo de 2001

"A Rebeca se inspirou na Daiane para ser campeã. Ela quis chegar aonde a Daiane chegou. Aí entra a questão da representatividade e a importância de mostrar para as crianças negras que elas podem chegar aonde elas quiserem. Durante muitos anos, a comunidade negra brasileira teve certa carência de exemplos. É importante perceber o significado dessa vitória", opina o pesquisador Marcelo Carvalho, presidente do Observatório da Discriminação Racial.

Essa é a mesma visão do professor Amailton Azevedo, da Pontifícia Universidade Católica (PUC/SP). "O discurso de Daiane emite uma mensagem positiva para uma parcela significativa da população, em especial, para as meninas adolescentes das camadas populares e mais vulneráveis, socialmente", observa o autor do livro As micro-áfricas em São Paulo.

Um dos autores do curso "Esporte Antirracista", oferecido pelo Comitê Olímpico do Brasil para os atletas, o professor Tiago Vinícius André dos Santos lembra o racismo estrutural. "Daiane se refere ao fato de que os negros eram supervalorizados para determinados papéis relacionadas ao esforço físico. No esporte, o atletismo seria o seu lugar mais apropriado. Enquanto é possível praticá-lo mesmo descalço, a esgrima, natação, tênis ou vela exigem a inscrição em um clube ou algo assim", explica o professor de Direito da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul.

A questão racial é delicada na ginástica, como lembra o cientista social e historiador Marcel Tonini, que cita um caso de repercussão nacional. O ginasta Ângelo Assumpção, que já foi uma das promessas da modalidade, está desempregado há quase um ano. Em novembro do ano passado, ele foi demitido do Esporte Clube Pinheiros e afirma que foi alvo de racismo dentro do clube

"Esta medalha de Rebeca também é do Ângelo Assumpção, que, embora campeão de salto na Copa do Mundo de Ginástica em 2015, foi banido pelos poucos clubes, em torno de 20 apenas, do Brasil por denunciar o racismo sofrido ao longo de anos. Por esse motivo, também, o feito de Rebeca é ainda maior", afirma. "Não nos esqueçamos que este esporte é elitista, com presença pobre e negra sendo contada nos dedos, em sua maioria fomentada pelo programa Bolsa Atleta, do Governo Federal", completa o doutor em História Social pela USP.

Para o estudioso, a manutenção de políticas de incentivo ao esporte e a adoção de outras de ação afirmativa, como cotas raciais, sociais, de inclusão, vai diminuir a desigualdade de acesso, permanência e resultados nas mais diferentes modalidades "Quando tivermos dirigentes negros, a estrutura será abalada. Casos como os de Aline Pellegrino, no futebol, são ainda raríssimos e muito pontuais", completa.

Estadão
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