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Seis meses depois, moradores de Chapecó ainda lidam com dor

29 mai 2017 - 11h07
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Existe algo a mais em comum entre a vendedora de churros numa das laterais da Catedral de Chapecó e o pipoqueiro com seu carrinho iluminado em frente a um shopping, a dois quilômetros dali. Solange Vieira de Castro e Agenor Pasolini não se conhecem. No entanto, dividem uma dor endêmica, um luto silencioso pela maior tragédia mundial envolvendo esportistas.

 "Não vai ser da noite pro dia. Quem presenciou tudo que se passou aqui na cidade depois do acidente vai levar esse sentimento para o resto da vida", diz Agenor Pasolini, pipoqueiro e torcedor da Chapecoense
"Não vai ser da noite pro dia. Quem presenciou tudo que se passou aqui na cidade depois do acidente vai levar esse sentimento para o resto da vida", diz Agenor Pasolini, pipoqueiro e torcedor da Chapecoense
Foto: Silvio Barsetti / Especial para Terra

Os dois são nascidos em Chapecó e apaixonados pela Chapecoense. Até hoje, seis meses após a morte de 71 pessoas na queda do avião da Chape (em 29 de novembro) nos arredores de Medellin, não conseguem lidar com a perda. Ambos refletem um sentimento que 'viralizou' entre os quase 220 mil habitantes da cidade e se evidencia pela inúmera quantidade de manifestações de solidariedade recíproca espalhadas por todas as ruas de Chapecó.

"A gente sempre via eles no supermercado,  na padaria, nos restaurantes. Era como se fosse uma familia. De repente, tudo acabou e daquela forma. A tristeza ainda machuca muito", diz Solange, por alguns instantes absorta e cabisbaixa e nem sequer preocupada com as rajadas de vento que ameaçavam a estabilidade da sua barraquinha de churros na noite de sábado (27).

O escudo da Chapecoense pode ser visto em todos os cantos pela cidade catarinense, como em estabelecimentos comerciais e residências
O escudo da Chapecoense pode ser visto em todos os cantos pela cidade catarinense, como em estabelecimentos comerciais e residências
Foto: Silvio Barsetti / Especial para Terra

Para Agenor, o peso emocional da tragédia vai levar algumas décadas para se diluir. "Não vai ser da noite pro dia. Quem presenciou tudo que se passou aqui na cidade depois do acidente vai levar esse sentimento para o resto da vida. Talvez daqui a duas ou três gerações, isso seja mais bem digerido."

Andar sem um roteiro definido pelas ruas de Chapecó e conversar com quer que seja sobre os seis meses pós-tragédia é um exercício que leva à repetição de resultados. A ferida não mostra sinais de cicatrização.

A frentista Daiane Alves vai aos jogos do clube e às vezes se depara com o olhar fixo numa parte específica do campo, longe da disputa de bola. Então, seus olhos lacrimejam e ela tenta construir uma realidade que já não é possivel. "Vejo o Danilo (goleiro, uma das vítimas), correndo de um lado para outro entre as balizas. Vejo a sombra dele. De repente, como se alguém me beliscasse, eu volto a me recompor. A gente até hoje não quer acreditar."

"As pessoas aqui andam de cabeça baixa. A dor está presente. Antes, os jovens passavam de carro exibindo suas caixas de som, a música invadia os quarteirões. Até isso mudou", relata a frentista Daiane Alves
"As pessoas aqui andam de cabeça baixa. A dor está presente. Antes, os jovens passavam de carro exibindo suas caixas de som, a música invadia os quarteirões. Até isso mudou", relata a frentista Daiane Alves
Foto: Silvio Barsetti / Especial para Terra

Daiane veste a camisa da Chapecoense duas, três vezes por semana. Tem orgulho de seu clube e de sua cidade e confidencia uma convicção amarga. "As pessoas aqui andam de cabeça baixa. A dor está presente. Antes, os jovens passavam de carro exibindo suas caixas de som, a música invadia os quarteirões. Até isso mudou."

No entorno da Arena Condá, a aposentada Noeli Jaknil também guarda no íntimo as sequelas da tragédia. Sua rotina mudou depois de 29 de novembro, quando passou a evitar as caminhadas em frente ao estádio do clube. Diz que quer superar isso e tem se esforçado para tanto. Mas ainda lhe faltam ânimo e coragem. "Eu lembro todo dia. Da janela de casa, respiro fundo e digo pra mim mesma que é preciso virar a página, que são coisas da vida. É uma luta diária."

"Eu lembro todo dia. Da janela de casa, respiro fundo e digo pra mim mesma que é preciso virar a página, que são coisas da vida. É uma luta diária", diz a aposentada Noeli Jaknil
"Eu lembro todo dia. Da janela de casa, respiro fundo e digo pra mim mesma que é preciso virar a página, que são coisas da vida. É uma luta diária", diz a aposentada Noeli Jaknil
Foto: Silvio Barsetti / Especial para Terra

Essa tarefa se impõe também para o comerciante Edilson Doss, dono de um restaurante na Avenida Getúlio Vargas, ao lado do hotel onde a Chapecoense se concentra antes dos jogos. Ele costumava receber ali mais da metade dos 71 passageiros que perderam a vida no acidente. Era amigo de vários deles e lamenta não ter registrado com fotos nenhum dos encontros. Tal qual a frentista Daiane, Felipe se flagra várias vezes com imagens que lhe acalmam por alguns segundos, antes da constatação de que o melhor é aprender a vencer o trauma.

"No meio do trabalho, atendendo meus clientes, olho pela porta de vidro e vejo o grupo de jogadores, o técnico, os auxiliares, todos caminhando aqui em frente, como se estivessem vindo do hotel para almoçar conosco. Aí bate uma tristeza que derruba."

Thaysa Tomé,  recepcionista de outro hotel na avenida principal de Chapecó, conhece muito bem a extensão dessa dor. Ela era amiga de vários componentes da comissão técnica,  que moravam no seu local de trabalho e mantém vivo até hoje o perfil deles em redes sociais. Seis meses depois do dia em que acordou com um alerta de uma amiga para que ligasse a TV "porque o avião da Chapecoense tinha caído", Thaysa muda o tom de voz para contar o que lhe dissera o fisiologista Luís Cesar Cunha, o Cesinha, horas antes do voo.

"Ele reclamou de saudades da família e me disse que não queria ir para Medellin. Estava cansado porque tinha chegado dois dias antes dos Estados Unidos, para onde tinha ido a trabalho. Quando eu soube do acidente, eu mandei mensagens de whatsapp para o Cesinha, o Duca (Eduardo de Castro,  auxiliar técnico), o Felipe (Luiz Felipe Grohs, analista de desempenho). Como as respostas não vinham, a agonia e o desespero aumentavam. Hoje, ainda está tudo muito recente. A ferida continua aberta."

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Fonte: Especial para Terra
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