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SAF na Argentina: entenda decreto de Milei e reação negativa dos clubes do país

Medida do presidente argentino permite transformação de times, como Boca Juniors e River Plate, em empresas por meio de modelo semelhante de Sociedade Anônima praticado no brasileiro

23 dez 2023 - 12h10
(atualizado em 24/12/2023 às 12h37)
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O presidente argentino Javier Milei está no centro de uma polêmica no futebol. O chefe do executivo recém-empossado defende a transformação de clubes do país em empresas por meio da implementação de Sociedades Anônimas no esporte, nos moldes do que ocorre com o futebol brasileiro. De acordo com ele, isso permitiria investimentos externos para melhorar a situação econômica dos clubes, como Boca Juniors e River Plate, que não estão dispostos a aceitar o novo modelo.

Na última quarta-feira, dia 20, Milei anunciou um pacote de medidas para desregulamentar a economia em crise da Argentina. Alvo de protestos, o chamado "decretaço" inclui a modificação da Lei Geral de Sociedades (nº 19.550/1984) para permitir que os clubes de futebol se tornem sociedades anônimas (S.A.), desde que obtenham o voto favorável de dois terços dos associados.

"Esta atualização normativa não deve ser interpretada como uma imposição às mencionadas entidades esportivas para que transformem sua forma atual de organização, mas sim como uma ampliação das opções entre as quais podem escolher livremente a estrutura que melhor atenda aos seus interesses", descreve o texto publicado no Diário Oficial da Argentina.

Clubes são contra

Desde o inicio, a ideia de Milei não foi bem aceita pelos clubes argentinos, que já haviam se reunido em novembro para vetar a inclusão das Sociedades Anônimas Desportivas (SADs) no estatuto de futebol do país — o modelo semelhante às Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs) em vigor no Brasil. A votação unânime, com 45 votos contrários e apenas a única ausência do Talleres, evidencia a resistência.

A eleição no Boca Juniors, clube com a maior torcida do país, foi o cenário mais recente dessa disputa. Sócio do clube, Milei foi recebido com vaias na La Bombonera, onde compareceu para participar da escolha do novo mandatário. Assim como na política, o direitista apoiou a chapa de oposição composta por Mauricio Macri e Andrés Ibarra, no pleito que acabou sendo vencido pelo ex-jogador Riquelme.

O ídolo do Boca Juniors foi escolhido por 64% dos mais de 43 mil sócios participantes do pleito, evidenciando sua oposição declarada à implementação das SADs ao longo da campanha. Dirigentes e associados temem impactos na estrutura social dos clubes e, consequentemente, a perda de poder caso o novo modelo seja posto em prática. Além do Boca, River Plate, Racing e Independiente de Avellaneda, maior clube do país, também rejeitam a ideia.

Diferentemente do Brasil, na Argentina a participação dos torcedores em eleições de alguns clubes é massiva e não fica restrita a um pequeno quadro de sócios. No pleito do Boca, 43.367 torcedores depositaram seus votos nas urnas. Dessa forma, a construção do que se entende como torcedor pertencente a um clube de futebol é muito distinto nos dois países vizinhos. Por isso, na Argentina, há uma restrição ainda maior a entregar o controle acionário a uma empresa ou empresário bilionário.

A Argentina se encontra dividida entre a possível modernização proposta por Milei e a tradição profundamente enraizada no coração do futebol argentino. No entanto, o jogo está longe de terminar, e as próximas jogadas prometem ser tão intensas quanto uma disputa de pênaltis.

Eduardo Carlezzo, advogado especializado em direito desportivo e sócio do Carlezzo Advogados, entende que a opção dos clubes argentinos em vetar a criação das sociedades anônimas "é completamente equivocada". Ele explica. "Sobretudo quando analisamos o contexto vivido por lá de hiperinflação, dólar nas alturas, falta de recursos para investimento, empobrecimento contínuo da população, entre outros fatores negativos que também impactam no futebol e tornam quase que impossível colocar em prática um crescimento orgânico e sustentável das receitas, sem depender de capital externo".

O advogado brasileiro, autor do livro Direito Esportivo Empresarial, entende que, tendo em vista que falta dinheiro para vários clubes e o grande endividamento, a única opção para revitalizar financeiramente uma agremiação esportiva é a venda do controle das ações.

"Caso contrário ficará remando indefinidamente num mar de dívidas, cenário que conhecemos bem no Brasil com o Cruzeiro, Vasco e Botafogo", opina. "Para clubes que estão nestas condições não há alternativa: é SAF ou continuar a ser um mero gestor do aumento do endividamento. Para os clubes brasileiros isso significa que, não havendo grandes transformações na estrutura dos clubes argentinos, tendem a seguir um caminho vitorioso nas competições continentais, pois já existe e haverá ainda mais dinheiro circulando por aqui devido as transações dos direitos de TV, SAF e, esperamos, da futura liga", complementa.

Estadão
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