Ex-funcionário elaborou 46 dossiês sobre desvios na CBF
Durante anos Moisés Campos de Lima atuou no anonimato. Dono de um acervo de dezenas (ou centenas) de documentos sobre a CBF, ele agora resolveu se apresentar publicamente. Em entrevista exclusiva ao Terra, o ex-chefe de segurança da seleção campeã do mundo em 1994 contou como elaborou nos últimos anos o total de 46 - isso mesmo, quarenta e seis - dossiês que versam sobre desvios na CBF.
Todo material está em poder do Ministério Público Federal, no Rio. Em sua casa, na zona oeste da capital carioca, Moisés recebeu a reportagem e mostrou as cópias dos 46 dossiês – tudo devidamente encadernado, com índice e ilustrações.
A decisão de dar sua primeira entrevista como opositor declarado do presidente da CBF, Marco Polo Del Nero, foi calculada. Ele queria aproveitar a data de início do julgamento de José Maria Marin nos Estados Unidos para se manifestar. O ex-presidente da entidade estará sentado nesta segunda (6) no banco dos réus para que a Corte americana se defina sobre o período de sua condenação ou, o que é pouco provável, o absolva.
Marin cumpre prisão domiciliar nos EUA, acusado de receber propinas em negociações de venda de direitos de transmissão de competições de futebol. A mesma acusação recai sobre Del Nero e Ricardo Teixeira, também ex-presidente da CBF. Para Moisés, os três têm de ser banidos do esporte para que a confederação possa ser refundada.
Por que esse trabalho persistente ao longo de vários anos?
MC – Porque o futebol brasileiro precisa de transparência, de uma gestão comprometida com os interesses dos clubes, dos atletas, do torcedor. A caixa preta das finanças da entidade tem de ser aberta. Não podemos ser coniventes com desvios.
O senhor se candidataria à presidência da CBF?
MC – Meu candidato para ocupar o cargo já tem nome: é Mauro Silva, ex-campeão do mundo, atleta que goza do respeito de seus pares e desenvolve um belo trabalho como diretor da Federação Paulista de Futebol. Ele poderia ter como auxiliares outros nomes de peso, como Raí, Leonardo, Ricardo Rocha, Zetti, pessoas com formação e conhecimento.
Como elaborou esses 46 dossiês?
MC – Tenho muitos documentos do período em que trabalhei na CBF, de 1989 a 2002. Fui chefe da segurança da Seleção na Copa dos EUA, assessor da vice-presidência, coordenador de serviços gerais, secretário nacional de controle de dopagem. Depois disso, mantive minhas fontes e estabeleci outras com um grande número de funcionários da CBF. Todo mundo que era demitido vinha falar comigo. Uma boa parte dos dossiês se refere individualmente aos que comandam a entidade. O de Marco Polo Del Nero é o mais volumoso. Entreguei tudo ao MPF e há alguns dias recebi um retorno do gabinete da procuradora-geral Raquel Dodge de que não ficará pedra sobre pedra. Essas investigações correm sob segredo de justiça.
Por que só agora decidiu deixar o anonimato?
MC – Porque chegou a hora do julgamento, da verdade. José Maria Marin não vai escapar e levará com ele Del Nero e Ricardo Teixeira. Isso vai determinar uma varredura na CBF. É inadmissível e vergonhoso que o presidente da entidade não possa representar o nosso futebol no exterior, por medo de ser preso. Desde que foi indiciado pela Justiça dos EUA em 2015, o mínimo que o Del Nero deveria ter feito era renunciar ao cargo. A Fifa deveria ter exigido isso dele. Mas a entidade máxima foi omissa, é cúmplice.