O que significa a tarifa de 50% de Trump sobre o Brasil? Veja análises de colunistas do 'Estadão'
Taxação foi justificada principalmente como resposta ao julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e a decisões do STF contra empresas americanas de tecnologia
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou na quarta-feira, 9, tarifas de 50% sobre produtos importados do Brasil, com início em 1º de agosto.
A decisão foi justificada principalmente como resposta ao tratamento dado pelo Brasil ao ex-presidente Jair Bolsonaro e a decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) contra empresas americanas de tecnologia. "O modo como o Brasil tem tratado o ex-presidente Bolsonaro, um líder altamente respeitado no mundo, é uma desgraça internacional", disse Trump. "Esse julgamento não deveria estar ocorrendo. É uma caça às bruxas que deve terminar IMEDIATAMENTE!", escreveu.
Segundo o presidente americano, a taxação também responde aos "ataques insidiosos às eleições livres" e às "ordens de censura SECRETAS e ILEGAIS" que, segundo ele, vêm sendo emitidas pelo STF contra redes sociais dos EUA, sob ameaça de "multas de milhões de dólares e expulsão do mercado brasileiro".
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu ao anúncio, afirmando que a resposta do País virá por meio da lei de reciprocidade econômica.
Confira a seguir as causas e consequências do tarifaço com as análises dos colunistas do Estadão William Waack, Lourival Sant'Anna, Fabiano Lana, Duquesa de Tax, Celso Ming e Alvaro Gribel.
William Waack: A direita brasileira identificada com Trump vai sofrer graves danos eleitorais
O ataque do presidente americano ao Brasil não tem paralelos históricos. Trata-se sobretudo de uma agressão política, cujos termos são por definição inegociáveis. Trump age com a prepotência de quem, de fato, escolheu dividir o mundo em esferas onde os fortões fazem o que querem, e os fracos — como o Brasil — que se virem.
Do ponto de vista exclusivamente comercial e geopolítico, o tratamento que Trump dá ao Brasil é simplesmente burrice. Mas é um extraordinário nível de mediocridade estratégica, ignorância histórica e posturas prejudiciais aos próprios interesses da superpotência que Trump vem exibindo desde que assumiu.
O problema muito mais grave é político e terá impacto também no contexto eleitoral doméstico brasileiro. Como aconteceu em países como Canadá, Austrália, México e, até certo ponto, Alemanha, a interferência política de Trump nos assuntos de cada um produziu os resultados contrários. Ou seja, Trump desmoralizou, enfraqueceu e tirou potencial eleitoral das forças políticas que quis "proteger". No caso brasileiro, o clã Bolsonaro e todo agente político que aderiu ao fã clube de Trump. Leia a coluna completa neste link.
Lourival Sant'Anna: Tempestade perfeita entre Trump e Lula vinha se formando, e situação fugiu do controle
Uma tempestade perfeita vinha se formando nas relações entre os governos Trump e Lula, com os motivos se avolumando para o presidente americano dirigir sua metralhadora giratória contra o Brasil. Fiz essa análise na segunda-feira e a reação predominante foi um discurso de suposto "patriotismo", contra o que seria uma visão de "vira-lata".
Trump segue a Doutrina Monroe do século 19, "a América para os americanos", e a reinterpreta como licença para os Estados Unidos se projetarem como líderes do Hemisfério Ocidental, desengajando-se da Ásia Pacífico, que deveria ser liderada pela China, e da Europa, a ser disputada entre Rússia, Alemanha, França e Reino Unido.
Trump estava com outras prioridades. Mas era natural que, diante de tudo isso, um dia ele voltasse sua atenção para o governo Lula, que representa, por causa da importância do Brasil, o principal fator de questionamento de seu poder nas Américas. Esse dia chegou. O certo teria sido evitar se chegar a essa situação. Agora, a situação foge ao controle. Leia a coluna completa neste link.
Fabiano Lana: Lula não buscou relações com Trump, mas pode se aproveitar internamente da afronta
A carta que o americano Donald Trump enviou ao presidente Lula impondo tarifas de 50% aos produtos brasileiros é um espanto até pela linguagem belicosa. Mesmo vindo de quem veio. Os termos, o estilo, parecem mais de briga de condomínio do que de relações internacionais.
Caso as tarifas sejam mantidas, a economia brasileira pode ser significativamente impactada, com destaque para setores industriais como a Embraer e os cafeicultores, dado que o Brasil exporta aproximadamente US$ 40 bilhões para os Estados Unidos.
A estratégia do governo Lula agora visa transformar a agressão em ganho político interno, atribuindo aos bolsonaristas a responsabilidade pelos prejuízos decorrentes das tarifas. Leia a coluna completa neste link.
Duquesa de Tax: Tarifa dos EUA acaba com dúvida de que comércio internacional é jogo político
Numa novela tarifária que se arrasta há meses, o Brasil agora virou protagonista, e "isso não é bom", diz a colunista do Estadão Maria Carolina Gontijo, a Duquesa de Tax, sobre a taxação de 50% do Brasil anunciada por Trump.
No "Fala, Duquesa!" desta semana, ela reage à carta do republicano endereçada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na qual justifica a medida, que não tem nada de econômica. "Se alguém tinha alguma dúvida de que comércio internacional é um jogo político, está lá o convite carimbado", diz a Duquesa.
O primeiro parágrafo do documento é sobre o ex-presidente Jair Bolsonaro. "Uma coisa a gente já aprendeu aqui no primeiro parágrafo. O foco não é econômico", ressalta a colunista. O segundo trata do STF e da redes sociais. Só no terceiro é que entram os aspectos comerciais. Leia mais detalhes sobre o programa neste link.
Celso Ming: O império ataca: Brasil entra na mira de Trump
Essa supertaxação de 50% de todas as exportações do Brasil aos Estados Unidos, a partir de 1º de agosto, não tem motivação comercial e, se tiver alguma motivação econômica, não parece relevante.
É uma clara punição, que tem intenção de produzir grave impacto sobre os interesses do Brasil, mas com efeitos práticos pouco claros. O comunicado do presidente Trump acusa o governo brasileiro de perseguir o ex-presidente Jair Bolsonaro e de impedir sua candidatura a qualquer cargo político. Desde já, fica incompreensível que uma divergência política, ainda que séria, possa ser combatida eficazmente com megaimpostos alfandegários. É a primeira vez que se tem notícia de que um processo em andamento no Supremo deva ser combatido com um tarifaço comercial.
Há o impacto sobre a política interna. O governo Lula deverá assumir, agora e na campanha eleitoral, o discurso de que se tornou vítima dos agentes do mal. Não está claro como a oposição, particularmente o Centrão e os empresários brasileiros prejudicados, reagirão a esse jogo. Leia a coluna completa neste link.
Alvaro Gribel: BC tem armas para conter o dólar, e tarifaço de Trump tende a ter efeito limitado ao curto prazo
O colunista Alvaro Gribel fez duas colunas sobre o tema. Na primeira, destaca que os efeitos do tarifaço devem ter alcance limitado no tempo.
O Banco Central brasileiro está bem posicionado para lidar com o tarifaço de 50% anunciado pelo presidente americano Donald Trump. Com a Selic a 15%, o País ainda se manterá atrativo para atrair capitais externos, e o alto volume de reservas poderá ser usado para conter disfuncionalidades no mercado de câmbio.
No curtíssimo prazo, contudo, a tendência é que haja uma forte alta do dólar, como ficou evidente na reação do mercado após o anúncio. Sendo os EUA a maior economia do mundo, não é trivial ser alvo de tarifas dessa magnitude e de um dia para o outro.
O tarifaço fez com que bancos e investidores internacionais emitissem relatórios expressos lembrando que as nossas exportações para os EUA são apenas 2% do nosso PIB. A íntegra desta coluna pode ser lida neste link.
Na outra coluna, Gribel destaca que o PT fala em cassar Eduardo Bolsonaro e oposição culpa STF e Lula por tarifaço de Trump.
O líder do partido na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), disse que o PT estuda formas de pedir a cassação do mandato de Eduardo, que está licenciado morando nos Estados Unidos, de onde diz mobilizar republicanos contra o que diz acreditar ser uma injustiça contra seu pai.
Um dos deputados mais ativos nas redes sociais, Nikolas Ferreira (PL-MG), de oposição ao governo, disse ao Estadão que já preparou o discurso de resposta aos petistas.
"A carta (do Trump) fala expressamente, já no primeiro parágrafo, na primeira linha, que isso está acontecendo por conta do tratamento que o Lula está dando ao presidente Bolsonaro, e ao STF, que tem suprimido liberdades de expressão, inclusive, de americanos. Então, está na mão deles", disse Nikolas. Leia a coluna completa neste link.