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'Investidor estrangeiro quer carimbo sustentável', diz presidente do BNP Paribas

Sandrine Ferdane, que comanda o banco francês no País, diz que crise diplomática entre Brasil e França deixou clara a preocupação do mundo dos negócios com questões ambientais

30 dez 2019 - 22h08
(atualizado em 2/1/2020 às 17h05)
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A queda de braço diplomática entre Brasil e França, travada diretamente pelos presidentes Jair Bolsonaro e Emmanuel Macron em 2019, envolvendo sobretudo a preservação da Amazônia, não passou despercebida pelos investidores franceses, que concentram quase um terço dos aportes estrangeiros diretos por aqui, segundo dados do Ministério da Economia.

A presidente da Câmara de Comércio Brasil-França e das operações brasileiras do banco BNP Paribas, Sandrine Ferdane, afirmou, em entrevista ao Estadão/Broadcast, que os europeus buscam projetos com "carimbo" de sustentabilidade.

Sandrine Ferdane, presidente do BNP Paribas no Brasil
Sandrine Ferdane, presidente do BNP Paribas no Brasil
Foto: Divulgação / Estadão

"Essa crise foi a oportunidade de o Brasil sentir a preocupação do mundo com a questão da sustentabilidade. O investidor, lá fora, busca investimento carimbado como sustentável. E essa lógica ainda não chegou ao Brasil", disse.

Sandrine também comentou sobre as oportunidades de investimento no País e afirmou ver 2020 com um otimismo temperado de cautela. "Muitos setores estão recuperando a atividade, mas a maioria deles ainda não voltou aos níveis pré-crise. Vemos concessões, privatizações. São razões concretas para o otimismo. (...) Mas isso não quer dizer que o ano vai ser fácil, já que as incertezas existem."

Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Dados do Ministério da Economia mostram que, no acumulado de 2019 até o terceiro trimestre, os investimentos franceses representaram 32% dos total dos investimentos estrangeiros diretos no País. Como avalia as relações comerciais entre Brasil e França em 2019?

Foi um ano de turbulências na relação, mas também de repensá-la. A presença francesa no Brasil é de longo prazo, os dois países têm uma intimidade bem grande. 100% das empresas do CAC 40 (principal índice da bolsa de valores de Paris) estão no Brasil. Ao longo do período de crise que passamos, no entanto, as empresas não pararam de investir. Um evento de destaque esse ano que foi a compra da TAG (Transportadora Associada de Gás, que era controlada pela Petrobrás) pela Engie, por quase US$ 9 bilhões.

A sra. comentou sobre turbulências na relação. O ano também foi de rusgas entre Brasil e França. Mas houve impacto real nos investimentos? Ou ficou só no campo político e, na hora dos negócios, o pragmatismo vence?

A gente nunca pode considerar que o econômico se separa do político. Não existe esse descolamento. Mas existe o papel central, que foi da Câmara de Comércio França-Brasil, de manter as relações. Essa crise teve uma dimensão emocional. Foi oportunidade do Brasil sentir a preocupação do mundo de hoje com a questão da sustentabilidade. O investidor, lá fora, busca investimento carimbado como sustentável e essa lógica ainda não chegou ao Brasil. Existem dificuldades, mas estamos aqui como ponte entre os países, porque a relação econômica é e vai continuar muito forte.

Mas esse momento de "repensar a relação" já passou ou o desconforto ainda está presente?

O primeiro legado é a conscientização. O segundo é a imagem do Brasil, que nessa crise foi afetada. O papel de uma empresa francesa aqui no Brasil é vender a visão do País, não só o potencial econômico. Falou-se muito mal do País, em parte de forma exagerada, obviamente. Então existe, agora, um trabalho de reconstrução de imagem.

Quais as perspectivas para 2020? No Brasil, tivemos a aprovação da reforma da Previdência. Outras, como a reforma tributária, estão a caminho. O investidor francês está animado com a agenda mais liberalizante em andamento?

Se eu tiver de responder 'sim' ou 'não', eu diria 'sim'. Temos um final de ano com uma dinâmica boa. Muitos setores estão recuperando a atividade, mas a maioria deles ainda não voltou a níveis pré-crise. Vemos concessões, privatizações. São razões concretas para o otimismo. É importante lembrar que a gente está no meio do caminho de transformação. Vamos medir cada vez mais o impacto das reformas, da queda dos juros, que alavanca as empresas. Tudo isso é recente e não está ainda materializado no cenário, mas olhando no futuro a gente vê impacto ainda mais positivo. Mas isso não quer dizer que o ano vai ser fácil, já que as incertezas existem e existirão.

Pensando, agora, no cenário internacional. Como repercutiu a imposição de tarifas à França por parte dos Estados Unidos, conforme anunciado pelo presidente americano, Donald Trump, em seu Twitter? Isso impacta o Brasil?

É mais um capítulo de instabilidade comercial internacional grande. Então não é bom para as empresas francesas no Brasil. O fator externo impacta. O que poderia ser o fator de instabilidade para o ano que vem? É mais fácil criar confiança no País em um ambiente internacional um pouco mais estável.

Como avalia o acordo comercial UE-Mercosul?

Esse acordo significa uma mudança nas regras do jogo. Quem ganha com as regras de hoje pode ter um pouco de preocupação. Mas o que mais importa, no longo prazo, é que o jogo muda para ter um País mais competitivo. O Brasil se torna mais atraente, então, na segunda etapa, todos são beneficiados, mas é preciso haver uma transição. Você precisa ter regras e controles bem identificados. Por isso demora. Não é fácil, porque você transforma.

Estadão
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