Gol negocia com credores por 'flexibilidade financeira' e avalia aporte de capital
Empresa vem tomando medidas desde 2020 para reorganizar a situação financeira afetada pela pandemia; ações caíram 6% nesta segunda diante de possibilidade de pedido de recuperação judicial no curto prazo
A Gol discute com seus credores diversas opções "que tragam maior flexibilidade financeira, incluindo capital adicional para financiar as operações", informou a empresa aérea, em nota, após o Estadão/Broadcast questioná-la sobre possibilidade de ela pedir recuperação judicial no curto prazo.
Essa é uma das saídas possíveis para a empresa resolver o problema de caixa de curto prazo para fazer frente às obrigações financeiras.
A ação da Gol fechou nesta segunda-feira em queda de 6,05%. O tombo reflete a preocupação dos investidores com o andamento da renegociação das dívidas da empresa, avalia Ygor Araújo, analista da Genial Investimentos.
Apesar de ainda não ser certo, um pedido de recuperação judicial por parte da Gol faria mais sentido nos Estados Unidos, onde ela opera voos comerciais — como fez a Latam, em 2020. Isso porque a lei de falência brasileira prevê que, no caso de recuperação de uma empresa aérea, contratos de arrendamento de aviões ficam de fora do processo. No caso da Gol, são justamente esses contratos a principal fonte de pressão financeira de curto prazo. A empresa conseguiria uma proteção contra isso, portanto, apenas se o processo corresse nos EUA. Empresas que comprovem relação com o país podem pedir recuperação judicial por lá.
A empresa tenta encontrar uma solução para sua dívida com os lessores (arrendadores de avião) desde o fim do ano passado. O momento de escassez de aeronaves e aumento da demanda aérea pós-pandemia dificultam a renegociação, dado que os arrendadores podem repassar os jatos para outras companhias com maior facilidade.
Em evento com investidores no mês passado, o CFO da Gol, Mario Liao, disse que a companhia aérea prepara um plano de reestruturação com injeção de capital por parte dos acionistas. O executivo afirmou que não planeja oferecer ações como garantia para os credores. Essa é uma estratégia diferente, por exemplo, da Azul, que optou por trocar parte da dívida com arrendadores por fatia do negócio.
A falta de garantias por parte da Gol é um dos pontos que têm travado as conversas. A empresa já ofereceu seu programa de fidelidade, o Smiles, como garantia para um empréstimo feito no ano passado com a Abra (holding que detém a companhia brasileira e a colombiana Avianca). A estratégia da Gol tem sido mostrar que tem uma operação forte que será capaz de gerar fluxo de caixa para fazer os próximos pagamentos.
As conversas têm avançado melhor com os arrendadores maiores, que podem ter dificuldade para repassar um grande número de aeronaves a outras aéreas, segundo pessoas envolvidas na negociação. Os pequenos, por sua vez, estão mais intransigentes. Também diferentemente do que fez a Azul, a empresa não fez uma proposta única para os arrendadores e negocia, separadamente, com cada um.
Reestruturação
Desde 2020, a Gol vem tomando medidas para reorganizar a situação financeira afetada pela pandemia. Em fevereiro do ano passado, a aérea renegociou parte dos títulos de dívidas emitidos no exterior. No começo de dezembro, a Gol contratou a assessoria financeira Seabury Capital, uma das principais consultorias financeiras globais do setor de aviação, para auxiliá-la em uma ampla revisão de sua estrutura de capital.
Também em dezembro, a Abra, holding controladora da Gol, contratou a Rothschild para assessor na reestruturação da dívida.
No final de dezembro, a Gol conseguiu a aprovação de uma apólice de seguro junto ao governo federal que permitirá captar US$ 209 milhões. O montante deve permitir que a empresa consiga fazer voltar a operar 20 aeronaves paradas aguardando manutenção.
As aeronaves em manutenção e os atrasos na entrega de aviões têm sido uma preocupação adicional para a Gol por afetar a capacidade da empresa de aumentar a receita em um momento de alta demanda do setor.
A empresa esperava ter atualmente 53 novas aeronaves 737 MAX voando, mas recebeu apenas 38 em 2023.
Para o analista da Genial, 2024 se desenha como um ano favorável para as empresas aéreas, com demanda estável e custos comportados. "Isso ajuda na melhora da margem de lucro e na geração de caixa", explica Araújo. Ele pondera, no entanto, que a Gol deve conseguir capturar menos os benefícios desse momento por estar com o caixa operacional comprometido com pagamento de juros.
A queda das ações nesta segunda-feira provocou perda de R$ 148 milhões no valor de mercado da Gol. A empresa vale, no momento, R$ 2,408 bilhões, menor valor desde 20 de outubro de 2023.
A Gol encerrou o terceiro trimestre com prejuízo líquido de R$ 1,3 bilhão no terceiro trimestre de 2023 (16% abaixo do mesmo período de 2022) e alavancagem de quatro vezes o Ebitda.