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Empresas avançam em ações de economia circular mesmo na pandemia

Programa da Natura para recolher embalagens de seus produtos em lojas físicas, lançado em maio do ano passado, alcançou 10 toneladas até julho; a Nespresso ampliou os pontos de coleta de cápsulas de café no País

17 set 2021 - 18h01
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Iniciativas para promover a economia circular têm ganhado força entre empresas no Brasil nos últimos anos, ao mesmo tempo em que as preocupações com o impacto da atividade humana no meio ambiente crescem e a agenda ESG (relacionada às boas práticas ambientais, sociais e de governança) se torna obrigatória.

É verdade que falar em economia circular em um País no qual a coleta seletiva de lixo está longe de ser universal e a taxa de reciclagem de resíduos é irrisória pode até parecer ambição demasiada. Ainda há um longo caminho a seguir para que medidas que garantam o retorno de insumos a serem descartados às cadeias produtivas não sejam casos isolados. Nem a logística reversa, um dos pilares da circularidade, é disseminada no País, apesar de obrigatória desde 2017.

Mas, para especialistas, a questão deve ter mais espaço nas empresas. "Seja por estímulo ou por pressão, as empresas vão ter de se adequar", diz João Amato Neto, presidente da diretoria executiva da Fundação Vanzolini/Poli-USP, especialista em economia circular.

Uma das companhias que há anos olha a questão da circularidade é a Natura. Um de seus programas mais recentes na área começou em maio do ano passado, quando criou uma estrutura para receber embalagens vazias nas lojas físicas Natura e The Body Shop, do grupo Natura &CO. A cada cinco embalagens entregues, o consumidor recebe um produto como brinde. O material recolhido é reciclado e transformado em vasos, cones de trânsito, caixas para vegetais, entre outros utensílios.

Mesmo com a pandemia, o volume coletado nas 60 lojas no Brasil superou as expectativas e chegou a 10 toneladas, do início do programa até julho. "A Natura foi a primeira empresa a lançar refil (de embalagens) ainda em 1983, quando a circularidade ainda não era uma questão", diz Denise Hills, diretora global de sustentabilidade da Natura.

A companhia participa de outras iniciativas de logística reversa. O programa Dê a Mão para o Futuro, do qual fazem parte todas as empresas do grupo Natura &CO (Natura, Avon, The Body Shop e Aesop), é uma ação coordenada pela Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), para que as empresas cumpram a política nacional de gestão de resíduos e dá suporte técnico e financiamento a cooperativas de catadores para a aquisição de equipamentos.

Já o Natura Elos fomenta cadeias de suprimento de material reciclado e envolve a Natura e fornecedores de embalagens (fabricantes, cooperativas e catadores). Em 2020, o programa recuperou 10,2 mil toneladas de material reciclado pós-consumo no Brasil, Argentina, Chile, Colômbia e Peru.

Até 2030, a meta da empresa é ter 100% dos materiais das embalagens provenientes de insumos reaproveitados, recicláveis ou compostáveis. Atualmente, são 81%.

Para Denise, "um dos principais desafios para viabilizar a circularidade total é que esse é um movimento coletivo". À empresa, cabe buscar processos inovadores, "não só para desenvolvimento de produtos e de embalagens, mas também que permitam ao consumidor fazer mais escolhas". Segundo ela, o grupo Natura & Co, investiu, no último ano, US$ 4,9 milhões em soluções "regenerativas", como tecnologias para produção de plástico verde, biodegradável e mudanças no design de embalagens para que contenham menos plástico.

Fabrício Soler, advogado especializado em Direito Ambiental e Direito dos Resíduos, professor e consultor internacional sobre o tema, sócio do Felsberg Advogados, considera que as iniciativas para promover a logística reversa no País têm avançado.

No segmento de embalagens, entre as mais relevantes estão a Coalizão Embalagens, a Dê a Mão para o Futuro (que também tem como parceiros a Abipla - Associação Brasileira das Indústria de Produtos de Limpeza e a Abimapi - Associação Brasileira da Indústria de Massas Alimentícias), e o Prolata (iniciativa da Associação Brasileira de Embalagem de Aço).

Segundo Soler, estima-se que as três iniciativas somadas ainda representem menos de 50% do mercado de embalagens no Brasil. Ele diz que as empresas que adotam programas têm conseguido cumprir a meta de "desviar" de aterros sanitários 22% das embalagens pós-consumo, como previsto em acordo setorial de logística reversa assinado com o Ministério do Meio Ambiente. "Quem faz consegue, o problema é que várias não fazem."

Ponta do iceberg

O professor João Amato Neto, da Fundação Vanzolini, afirma que há hoje "muita preocupação" com o tema da economia circular nas corporações, principalmente nas grandes. Mas, na maior parte dos casos, até mesmo nas empresas maiores, a transição de um modelo de produção linear para o modelo de economia circular, ainda está em estágio inicial.

Ele diz, ainda, que é preciso "separar o joio do trigo" porque "há muito discurso e também uma parcela de práticas que é tão alinhadas com a questão de sustentabilidade, agora com esse novo rótulo da economia circular, muita prática de greenwashing (marketing verde)".

Mas Amato é otimista, mesmo que ainda haja questões básicas a enfrentar para viabilizar a circularidade, como o baixo índice de reciclagem de resíduos sólidos no País. "Estamos enxergando apenas a ponta do iceberg. O iceberg vai emergir em velocidade mais intensa nos próximos anos porque essa é uma questão que afeta os negócios", diz. Além de consumidores mais preocupados, investidores também têm dado mais atenção aos aspectos ESG nas empresas.

Até a última chance

A gigante de café Nespresso também tem ações em busca da circularidade e foca os esforços para reduzir o impacto ambiental das cápsulas de alumínio. A meta para o País é fazer com que metade delas tenha, até 2025, destino correto e possa voltar às cadeias produtivas. A empresa tem um programa de reciclagem das cápsulas no Brasil desde 2011, no qual investe R$ 5 milhões ao ano. A taxa de reciclagem hoje está em 17% - era metade disso há cinco anos e o objetivo é alcançar 50% em 2025, segundo Cecília Seravalli, gerente de sustentabilidade da Nespresso.

Para atingir o objetivo, a empresa terá de oferecer mais opções de reciclagem. "É um número ao qual podemos chegar, com novas opções de reciclagem, novos pontos de coleta e conveniência, mas também engajando o consumidor", diz.

Nesse sentido, além de 200 pontos de coleta das cápsulas hoje no País - como as lojas Nespresso, do Pão Açúcar, hotéis e restaurantes -, desde março quatro agências também estão recebendo cápsulas, como parte de um projeto-piloto. Outra alternativa foi implantada em quatro capitais, nas quais o consumidor pode comprar online, usando a chamada entrega verde, feita de bicicleta e com a retirada das cápsulas para reciclagem. Uma terceira possibilidade, é enviar as cápsulas usadas pelos Correios, sem taxa.

A Nespresso tem parceria com 80 cooperativas de reciclagem, a maior parte na cidade de São Paulo e na Grande São Paulo, que separam as cápsulas no processo de seleção dos resíduos e as vendem à empresa de café. "É a última chance de pegar a cápsula antes de ela chegar ao aterro (sanitário)", afirma ela.

Todas as cápsulas recolhidas vão para o centro de reciclagem da Nespresso, em Osasco, no qual ocorre a separação do alumínio e do café. O alumínio é destinado à indústria siderúrgica. A borra do café, desde o ano passado, é usada por agricultores do programa Nespresso Hortas na produção de alimentos orgânicos, na zona sul da capital paulista.

Em nível global, a empresa também tem metas para o aumento do uso de materiais reciclados nas cápsulas, produzidas em três fábricas na Suíça. Até o fim deste ano, as cápsulas devem ser produzidas com 80% de alumínio reciclado.

Estadão
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