Dívidas da Ambipar em recuperação judicial somam R$ 10,5 bi
Fluxo de caixa, essencial para que os credores entendam a capacidade de pagamento da empresa, foi entregue em envelope lacrado e sob sigilo
A Ambipar informou à Justiça do Rio de Janeiro, em seu pedido de recuperação judicial, que suas dívidas somam R$ 10,481 bilhões, sendo R$ 10,439 bilhões quirografárias (sem garantias vinculadas a elas). Segundo o documento obtido pelo Estadão/Broadcast, R$ 35,9 milhões são dívidas com fornecedores e R$ 6,3 milhões trabalhistas.
A companhia tem ainda cerca de R$ 2 bilhões de passivos com bancos. Entre as instituições financeiras, o maior credor é o Santander, com R$ 663 milhões, seguido pelo Banco do Brasil, com R$ 352 milhões.
Na lista dos bancos credores, está também o Banco do Nordeste, com R$ 207 milhões, e o Deutsche Bank, com R$ 188 milhões, este por conta de derivativos. O Bradesco aparece com R$ 165 milhões e há também bancos médios, como o Daycoval (R$ 109 milhões) e o ABC Brasil (R$ 56 milhões).
No documento, a Ambipar voltou a apontar seu ex-CFO João Arruda como o responsável pela assinatura dos aditivos de derivativos contratados com o Deutsche Bank, que pressionaram a empresa a recorrer à proteção contra credores em 25 de setembro.
No pedido de recuperação judicial, a Ambipar descreve a trajetória de Arruda desde sua saída do Bank of America, em que participou da oferta de ações que levou a companhia para a bolsa, até a mudança no contrato de derivativos do Deutsche Bank de proteção cambial nos bonds emitidos pela Ambipar, que teria sido feita sem conhecimento dos demais executivos.
A defesa de Arruda diz que as acusações não encontram respaldo nos fatos nem nos documentos oficiais. "O executivo não assinou o contrato de cessão entre o Bank of America e o Deutsche Bank, sendo este documento assinado por Guilherme Borlenghi, filho do controlador e diretor estatutário da companhia (Tércio Borlenghi Junior). Já o aditivo, firmado posteriormente, foi assinado pelos diretores estatutários Thiago Silva e Luciana Barca, profissionais de plena confiança do controlador, e anexado pela Ambipar nos autos da cautelar", escreve a defesa, em nota.
Segundo os advogados de Arruda, também não procede a alegação de que ele "tenha convocado reunião com investidores em setembro. As reuniões foram organizadas pelo Bank of America, com pauta institucional voltada à atualização de crédito e tendo como foco principal a participação do controlador, Sr. Tércio Borlenghi Junior. Esse fato pode ser comprovado em registro do terminal Bloomberg em 19 de setembro às 10h57. Além disso, pode ser confirmado diretamente pelos bancos envolvidos."
O comunicado completa: "diante da intensa disseminação de informações falsas contra João Arruda, a defesa informa que serão adotadas as medidas legais cabíveis, inclusive a responsabilização criminal dos mentores dessa campanha difamatória. Considerando a instauração de procedimento investigativo indevido, poderá restar caracterizado o crime de denunciação caluniosa."
Para a defesa, "as acusações levianas só se prestam a construir uma narrativa falaciosa, ao que tudo indica visando desfavorecer credores".
Ambipar diz que Deutsche detonou crise
No pedido de recuperação judicial, a Ambipar descreve que a decisão do Deutsche Bank de fazer uma chamada de margem por conta de um derivativo de R$ 170 milhões acabou gerando um processo de desconfiança no mercado sobre a situação financeira da empresa e seu caixa, desencadeando outro movimento de cobrança.
O não pagamento, segundo a empresa, provocaria o vencimento antecipado de uma dívida de US$ 35 milhões com o Deutsche e dos bonds, puxando outros vencimentos, como os das debêntures.
Logo após o Deutsche, o Santander declarou um vencimento antecipado de US$ 120 milhões (R$ 650 milhões pelo dólar de hoje) e exigiu, segundo o documento, o pagamento em 24 horas desse valor.
Os advogados da Ambipar descrevem que, se não buscasse a Justiça, mais bancos fariam o mesmo, o que "seria o gatilho para o vencimento antecipado de dívidas de todo o Grupo Ambipar". "As cobranças do Deutsche Bank, acompanhadas de ameaças de vencimento antecipado, desencadearam uma corrida dos credores, dentre eles o Banco Santander, com o potencial de sufocar de uma vez só as requerentes", ressalta o pedido de recuperação judicial (RJ).
Da dívida total, os maiores credores da Ambipar são os detentores de títulos de dívida (bonds) emitidos no exterior, com US$ 1 bilhão (R$ 5,4 bilhões pelo câmbio desta terça-feira), seguido por investidores de debêntures, com R$ 3 bilhões.
No pedido à Justiça do Rio, o relatório gerencial de seu fluxo de caixa foi entregue em um envelope lacrado, sob sigilo. O relatório sigiloso inclui a projeção de caixa para os próximos dois anos.
Essa é justamente a maior dúvida do mercado: o que aconteceu com o caixa de R$ 4,7 bilhões que a empresa reportou no balanço do segundo trimestre. Desse total, a companhia alegava ter R$ 2 bilhões com disponibilidade imediata.
A Ambipar enviou ao juiz outros documentos sigilosos, incluindo um relatório com a relação dos bens particulares dos sócios controladores e os extratos atualizados das contas bancárias dos requerentes e de suas aplicações financeiras.
Manutenção do processo no Rio
O documento também defende a instauração do caso na Justiça do Rio de Janeiro, com provas fotográficas da sede na capital fluminense, contestando ainda as provas dos bancos credores, que foram levadas ao juízo no pedido de transferência da causa para São Paulo.
A defesa da tese da sede da empresa no Rio é acompanhada inclusive de parecer do professor e ex-juiz da vara de falências de São Paulo Daniel Carnio.