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Conta de padaria ajuda o empreendedor no planejamento do negócio

O empreendedor, o orçamento empresarial e a conta de padaria

27 jul 2023 - 06h15
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Foto: Adobe Stock

Todos os leitores já devem ter ouvido a expressão “conta de padaria”. Ainda garoto conheci um português, sr. Manoel, dono de padarias, é claro. Cheguei a trabalhar com ele por um breve período. Seu negócio era a compra e venda de padarias, sempre com lucro. 

Ele não tinha nenhuma ferramenta técnica para estabelecer um preço de compra e um preço de venda. Na compra, ele, com a anuência do vendedor, ficava postado ao lado do caixa por algumas horas, durante uma semana, acompanhando o movimento dos clientes. Mesmo sem saber o faturamento daquela semana, ele conseguia avaliar, apenas pelo fluxo de clientes, se o negócio era bom e se tinha futuro.

Certa vez, ele me revelou como tomava as decisões: voltava para sua padaria e pegava uma folha de papel no balcão, a mesma que era usada para embrulhar a mercadoria dos clientes – normalmente eram folhas cinzas, provavelmente de um papel de segunda categoria, mais barato.

Nessa folha de papel, ele fazia todas as anotações e contas relativas ao negócio que estava propenso a realizar.

Foi então que entendi o conceito. Na verdade, é uma simplificação do ato de fazer contas. Ou, como se dizia, uma conta de padaria.

Um plano de negócios como o do sr. Manoel

Lembro-me sempre desse sr. Manoel quando penso em um plano de negócios e, principalmente, quando vejo tanta gente abrindo empresas sem um mínimo de estudo, sem até mesmo um rascunho financeiro feito em papel de pão.

Tenho presenciado vários casos de fracasso. Às vezes, bastaria um pouco de atenção e o fracasso seria evitado.

Cito o caso a seguir, acontecido recentemente: Olga tinha um salão de beleza em área nobre de São Paulo, com clientela consolidada e ótima rentabilidade. Um dia, vagou um espaço em frente ao seu salão. Ela não teve dúvidas: decidiu abrir um salão infantil no local. Na mesma semana, correu para garantir a locação. Aqui, um erro. Quem se afoba negocia mal, já que, normalmente, o locador negocia melhor o aluguel quando o imóvel está fechado por muito tempo.

Ela conseguiu a locação e partiu para as reformas. Como era um salão infantil, havia a necessidade de ampla modificação e compra de cadeiras, brinquedos e jogos, tudo adequado às crianças.

Durou 60 dias seu sonho depois de aberto. E mais uns 24 meses para se livrar da encrenca.

Onde será que ela errou?

Primeiro, em não fazer contas. Segundo, em não avaliar se, só com crianças como clientes, ela conseguiria pagar a equipe, as despesas gerais e, principalmente, o aluguel, o item mais caro. E terceiro, o maior erro, em não se valer de especialistas, ou mesmo de um amigo experiente. Às vezes, uma observação de amigo pode nos livrar de muitas encrencas.

Como faria o sr. Manoel se estivesse à frente do negócio? Numa folha de papel de pão, ele colocaria todas as informações necessárias. Algo assim:

  • • Projeto Salão Infantil
  • • Número de cadeiras a serem instaladas: 5
  • • Abertura do salão: de terça a sábado, 22 dias por mês
  • • Valor a cobrar por um corte infantil: R$ 60,00
  • • Valor a pagar ao cabeleireiro contratado: 50% do valor do corte, portanto R$ 30,00
  • • Abertura do salão: 8 horas por dia

Custos:

  • • Aluguel, IPTU e luz: R$ 20.000,00
  • • Funcionários: recepcionista, faxineira, copeira etc.: R$ 7.000,00
  • • Outros custos: R$ 3.000,00
  • • Retirada de pró-labore: zero
  • • Custo mensal total: R$ 30.000,00

Faturamento:

  • • Número de cortes para pagar os custos fixos no mês: custo de R$ 30.000,00 dividido por R$ 30,00 (R$ 60,00 o corte, sendo R$ 30,00 do cabeleireiro) é igual a 1.000 cortes por mês.
  • • Portanto, 1.000 cortes em 22 dias seriam, em média, 45 cortes por dia.

Com 5 cadeiras, cada cabeleireiro teria potencial para cortar 9 cabelos por dia. Uma criança a cada pouco menos de uma hora.

O que o sr. Manoel acabou de fazer? O famoso business plan. Não o business completo, é claro, mas, para pequenos negócios e para pessoas com dificuldade de domínio da técnica de elaboração de um orçamento mais completo, esse formato já dá uma boa noção. Claro que não é recomendável essa simplificação. Um profissional de finanças pode fazer algo mais completo.

Business plan evitaria um prejuízo

O sr. Manoel, com esse business plan, mesmo precário, teria percebido que seria uma fria e nem conversaria com o proprietário do imóvel, já que conseguir cerca de 1.000 crianças todo mês seria um objetivo difícil de ser alcançado, considerando que se corta cabelo normalmente uma vez por mês.

Esse raciocínio serve para todo tipo de negócio, inclusive e especialmente comércio, o mais tentador. Pode ser consultoria, sorveteria, brigaderia, bolo da vovó, loja de roupas, cafeteria, bar, padaria etc.

Para os que têm muita dificuldade para fazer contas, ou não se interessam em ouvir terceiros, sugiro somar os dois maiores custos do empreendimento. Por exemplo, aluguel e salários. Isso já ajuda na percepção de quanto será necessário faturar para, pelo menos, pagar essas despesas.

Insisto: abrir um negócio, por menor que seja, exige um mínimo de preparo e aconselhamento de especialistas. As estatísticas mostram que quase 30% das empresas fecham no primeiro ano de funcionamento, e após cinco anos mais de 60% desaparecem. Os principais motivos do fracasso, segundo o Sebrae, são: 

  • • Comportamento empreendedor pouco desenvolvido, muitas vezes com total desconhecimento do negócio; 
  • • Falta de planejamento prévio; 
  • • Falta de gestão, especialmente gestão financeira; 
  • • Problemas pessoais entre os sócios.

Minha recomendação, ao propor um estudo, mesmo que preliminar, não tem objetivo de desestimular os empreendedores, mas sim de mostrar a eles que, com alguns cálculos básicos, sem a emoção que os cerca nesse momento de empreender, é possível evitar que um sonho se transforme em um pesadelo, com perdas financeiras e, principalmente, a sensação de fracasso, que deixa marcas por muito tempo.

(*) Antônio Lino Pinto é consultor de gestão e autor dos livros “Pequenas agências, grandes resultados” (2011), “Abri minha agência, e agora?” (2013), “Gestão em agências de propaganda” (2017) e “Gestão para empreendedores” (2022).

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