Protagonistas nem sempre emplacam e abrem espaço para os coadjuvantes
Início de novela é como começo de namoro: alguns casais emplacam e seguem adiante. Já outros, pela tão comentada "falta de química", caem no marasmo. E, quando isso acontece, a necessidade de fazer uma trama funcionar obriga o desenvolvimento de histórias e núcleos que, inicialmente, não ganhariam tanto espaço.
Glória Perez, autora de Caminho das Índias, da Globo, sempre afirma que faz questão de começar seus textos com várias possibilidades de desenvolvimento. E, aos poucos, define o que deve ser mais explorado e o que precisa de uma reformulação. "As minhas novelas não têm uma história só. São duas, uma no Brasil e outra fora. E, além delas, várias outras. Tenho troncos, como em uma árvore. Sempre com várias possibilidades", explica.
Amigo de Glória Perez, o autor Tiago Santiago também gosta de se prevenir e ter várias cartas na manga. Autor de Promessas de Amor, da Record - última parte da trilogia Caminhos do Coração - Santiago já criou casais que se saíram muito bem no ar. Mas, dessa vez, não é só na parte doce da trama que o romance convence. Bianca Castanho e Léo Rosa aproveitam as maldades de suas "crias" para apimentar a relação do par Amanda e Nestor, que não é calcada no amor. "É claro que existe algum sentimento, mas o que vale ali é o poder", analisa Bianca.
Benedito Ruy Barbosa segue uma linha mais tradicional em Paraíso, exibida às 18 horas pela Globo. Disposto a apostar em valores que, na opinião do autor, foram perdidos na dramaturgia, "ressuscitou" os mocinhos Zeca e Maria Rita, mais conhecidos como o Filho do Diabo e a Santinha da primeira versão, gravada em 1982.
E a combinação, que poderia ser vista como ultrapassada, emplacou. A audiência da trama tem sido crescente e deixa a emissora longe dos 16 pontos que a antecessora Negócio da China chegou a marcar. Atualmente, Paraíso atinge mais de 25 de média na maior parte dos capítulos.
Negócio da China não fez sucesso, mas também conseguiu ter seu casal de "pombinhos" inesperado no ar. Ainda mais depois da saída de Fábio Assunção, que interpretava o mocinho Heitor. Para ocupar o espaço vago, Miguel Falabella explorou mais a paixão do português João, encarnado por Ricardo Pereira, pela mocinha Lívia, de Grazi Massafera.
A estratégia funcionou tão bem que o médico Otávio, vivido por Dalton Vigh e escrito para ter função de antagonista, não colou. "Adoro o Fábio e senti muito a falta dele. Mas é claro que sua saída abriu um pouco o espaço para meu papel crescer", reconhece Ricardo, que soube aproveitar a oportunidade e garantiu um contrato de três anos no Brasil.
Em Caminho das Índias, o mocinho também deixou um buraco e não teve muita sorte com seu par inicial. Mas, enquanto Maya e Bahuan, de Juliana Paes e Márcio Garcia, não pegaram, outros pares ganharam a atenção dos telespectadores no ar.
A própria protagonista ganhou nova força ao se casar com Raj, de Rodrigo Lombardi, que ganhou peso de papel principal a partir daí. Além deles, os apaixonados Ravi e Camila, de Caio Blat e Ísis Valverde, ganham cada vez mais destaque e ajudam a manter os 40 pontos de audiência que a novela vem marcando. "Não acho que um casal seja mais importante que o outro. Cada história tem o seu momento e esse é o do Ravi e da Camila", analisa Caio.
Mas nem sempre o romance foi desfavorável a Márcio Garcia no ar. O galã arrancou suspiros das telespectadoras e foi contratado pela Record a "peso de ouro" depois de fazer sucesso na pele do michê Marcos, de Celebridade, par da "cachorra" Laura, de Cláudia Abreu. Entre tapas e beijos, os dois foram os principais destaques da trama de Gilberto Braga e Ricardo Linhares.
Assim como eles, Fernanda e Bruno, de Paloma Duarte e Marcelo Serrado, formam, de longe, a dupla mais inusitada de Poder Paralelo. A história explora os conflitos de uma amante que, além de não ter exclusividade sobre seu "escolhido", ainda leva uns "tapinhas" de vez em quando. "Ela tem o ódio e o amor com a mesma intensidade, com a mesma entrega. É uma história muito humana", resume Paloma.
Amor maduro
Quando Vidas Opostas entrou no ar, em 2007, pela Record, a expectativa era prender a atenção do público através das diferenças entre a vida do mocinho milionário Miguel, de Léo Rosa, e da batalhadora Joana, de Maitê Piragibe. Mas, para surpresa da equipe, o casal Ísis e Bóris, de Lucinha Lins e Nicola Siri, conseguiu barrar os conflitos melosos e ganhou força ao explorar um romance maduro, na faixa dos 50 anos.
"Cheguei a ficar preocupada porque tenho 10 anos a mais que o Nicola. Mas a relação dos dois imprimia naturalidade no vídeo", lembra a atriz, que depois desse êxito garantiu o papel da vilã Vilma em Chamas da Vida, na mesma emissora.
Glória Perez também viu uma de suas personagens experientes roubar a cena e ganhar, progressivamente, cada vez mais espaço para os conflitos amorosos. A divertida viúva Neuta, de Eliane Giardini, não só tapou o buraco deixado pelo insosso casal de protagonistas Tião e Sol, de Murilo Benício e Deborah Secco, como também garantiu o final feliz ao lado de um dos peões mais cobiçados da trama, o atrapalhado Dinho, de Murilo Rosa.
"Acho que a minha geração aprendeu a se cuidar mais. É natural que hoje as mulheres mais experientes tenham uma vida amorosa", analisa Eliane.
Instantâneas
# Em Por Amor, Carolina Ferraz e Eduardo Moscovis interpretaram o casal Milena e Edu, um dos mais entrosados e atraentes da novela.
# Em América, um dos casais inusitados que mais se destacou, passou a maior parte das cenas contido. Júnior e Zeca, de Bruno Gagliasso e Eron Cordeiro, chamaram a atenção do público e da crítica encarnando um par homossexual, mas tiveram o beijo do "final feliz" cortado na edição do último capítulo.
# Em Malhação, o casal Domingas e Fernandinho, de Carolinie Figueiredo e Johnny Massaro, se tornou o mais cômico da temporada de 2008 e inovou ao mostrar a relação de uma adolescente "cheinha" com um "nerd".
# Beatriz e Antônio, de Andreia Horta e Dado Dolabella, passaram boa parte de Chamas da Vida como o casal mais aprovado pelo público. Na trama, os aventureiros foram separados quando o "bad boy" morreu na história.