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João Kléber defende Teste de Fidelidade: "já não sei o que é baixaria"

De volta à televisão brasileira após 8 anos, apresentador diz que, com atual violência exibida por telejornais, "programa podia passar na igreja"

25 jun 2013 - 10h50
(atualizado às 11h16)
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<p>Apresentador durante entrevista ao Terra no saguão do hotel onde atualmente vive, em SP</p>
Apresentador durante entrevista ao Terra no saguão do hotel onde atualmente vive, em SP
Foto: Fernando Borges / Terra

Os oito anos de ausência da televisão brasileira tornaram João Kléber um sujeito mais tranquilo. Antes ferrenho defensor da veracidade de suas atrações, o apresentador prefere hoje dar o benefício da dúvida a elas a discutir com seus detratores. E não foram poucos os ataques à credibilidade de seus programas. Desde que estreou o Teste de Fidelidade na RedeTV!, no início da década passada, o apresentador tem sido alvo de críticas de jornalistas e telespectadores, segundo as quais seu mais famoso quadro não seria nada além de uma armação – o que sempre negou enfaticamente. Mas isso deixou de ser um problema. Ao menos é esse o discurso adotado em 2013 por ele, novamente o principal representante da audiência da RedeTV!. "Se fosse há dez, 12 anos, eu ficaria muito preocupado, muito chateado com qualquer crítica. Hoje não", garante.

O encontro foi marcado para o final de uma manhã de quinta-feira, no saguão principal de um tradicional hotel em um bairro nobre da cidade de São Paulo. Após pouco mais de meia hora de espera, Kléber surge caminhando apressadamente, vestindo camisa xadrez e calças jeans, e cumprimentando com um aperto de mão seco e apressado a reportagem do Terra. "Passamos hoje dois minutos na frente da Record e colamos no SBT", comenta logo ao chegar, já acomodado em uma poltrona, enquanto olha freneticamente para o celular no qual acompanha dados de audiência em tempo real.

"Já não sei o que é baixaria", diz João Kléber:

Os números são do Você na TV, atração que comanda desde abril com o intuito de alavancar o público nas manhãs da emissora, no mesmo horário competindo com Encontro com Fátima Bernardes, da TV Globo, e Hoje em Dia, da Record. "Quando começamos, a média de audiência no horário era de 0,3, 0,4 pontos. Hoje damos média de 1,9, 1,6, 2,0", sorri, um pouco mais à vontade. "Na nossa concorrência todos os caras são feras. E o gostoso é ganhar desses caras. Chutar cachorro morto eu não quero. No domingo, também, eu tô bringando com quem? Todo mundo! Fantástico, Silvio Santos, Pânico, filme, Domingo Espetacular. Eu gosto é disso: dar quatro pontos, cinco pontos na RedeTV! contra gente grande."

O cotidiano de João Kléber é acelerado. Sem filhos e novamente solteiro após o fim de seu terceiro casamento, com a apresentadora lusitana Elsa Raposo, seu dia a dia é, aos 55 anos, inteiramente focado no trabalho. Atualmente diretor-geral e apresentador de duas atrações na RedeTV!, sendo uma delas diária – Você na TV – e outra exibida aos sábados e domingos – Teste de Fidelidade -, ele ainda sequer teve tempo de procurar um apartamento para morar em São Paulo, apesar de estar na cidade desde fevereiro. A casa que chama de lar segue firme em Lisboa, onde viveu por quase uma década, com todos os móveis e objetos pessoais aguardando por uma inevitável mudança. O tempo, escasso, é revezado entre o hotel onde provisoriamente mora e os corredores e estúdios da RedeTV!, em que grava todos os dias.

A volta de Kléber aos telespectadores em um programa próprio se deu repentinamente, na madrugada do dia 10 de fevereiro, no fim de semana pré-Carnaval. Na ocasião, para dar uma mãozinha ao Bastidores do Carnaval, exibido anualmente pela emissora, o apresentador promoveu um Teste de Fidelidade diferente, realizado ao vivo, direto do Sambódromo de São Paulo. "Amanhã isso vai estar em todos os jornais!", bradava a todo momento, enquanto exibia um tablet para teoricamente comprovar o fato de o quadro, no qual um suposto segurança traía a mulher com duas beldades, estar realmente sendo filmado durante os desfiles do Grupo Especial da capital paulista. O retorno em audiência foi tamanho que a atração ganhou destaque na grade de programação da RedeTV! duas vezes por semana - aos sábados e domingos.

Não deixa de ser curiosa essa volta. Em consequência de uma ação movida pelo Ministério Público em conjunto com nove ONGs, em 2005 os programas do apresentador levaram a RedeTV! a ser tirada do ar ao longo de 48h, tornando-o uma espécie de "mártir" da campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania, empenhada desde 2002 em receber denúncias de cidadãos a respeito de conteúdo de má qualidade na televisão brasileira. O episódio gerou prejuízo de milhões à empresa, que por dois dias não obteve faturamento publicitário, e arranhou sua imagem.

Mas ela tem fundamento. Desde que perdeu o Pânico para a concorrente Bandeirantes, a RedeTV! viu sua audiência geral - e, consequentemente, seu faturamento com ela -, despencar. A contratação daquele que tanto sucesso fez com suas polêmicas atrações uma década atrás é, portanto, uma tentativa de mudar essa realidade.

<p>Kléber abraçou com devoção rótulo de apresentador polêmico</p>
Kléber abraçou com devoção rótulo de apresentador polêmico
Foto: Fernando Borges / Terra

Ainda assim, não deixa de ser curioso o fato de a aposta ser feita com programas praticamente idênticos àqueles responsáveis por dar tanta dor de cabeça à emissora no início dos anos 2000. "Talvez o Teste de Fidelidade tenha virado um programa light perto das coisas que acontecem agora”, teoriza o apresentador, classificando a campanha contra a baixaria na TV de política, pois "parece impossível definir o que exatamente significa o termo nos dias atuais". 

"O que é baixaria? Corrupção é baixaria? As notícias dos telejornais, mostrando o cara tomando um tiro na cabeça, são baixaria? Eu já não sei o que é baixaria. É subjetivo", discursa, confiante. "Como fica um trauma de uma criança vendo aquele cara tomando um tiro? Quantas pessoas têm síndrome do pânico por não poderem sair na rua por medo de assalto? Já virou banal mostrar imagens de circuito de prédio de cara tomando tiro na cabeça, de criança sendo estuprada. Então o nosso programa a gente já pode fazer na igreja, porque não é nada perto do que a gente vê hoje."

O apresentador que dança de forma provocativa, gargalha e foge de um lado para o outro do palco de supostas vítimas de infidelidade no autoproclamado mais polêmico programa da televisão mundial é bem diferente do João Kléber de longe das telas. O olhar é sério, concentrado; os discursos, longos, repletos de divagações, dificilmente encontram uma exaltação no tom de voz; o sorriso fácil apresentado na televisão, a risada característica, o tradicional "para, para, para" parecem mais parte de um personagem que criou para os telespectadores do que características naturais daquele que na década de 1980 foi chamado por nomes como Chico Anysio e Jô Soares de uma das gratas revelações do humor brasileiro. Age, acima de tudo, como um profissional sério, com um discurso profundamente defensor de sua carreira e legado.

O Teste

“As pessoas falam muito do Teste de Fidelidade não pelo lance de mostrar isso ou não mostrar aquilo. É a palavra traição que pesa [...], porque a palavra é forte pra qualquer traição, seja de amizade, de marido e mulher, de pai e filho, de empregado e patrão”, teoriza Kléber sobre seu principal produto. “Depois que o Teste começou a ter aquele sucesso, várias revistas de renome colocaram na capa matérias sobre traição. E capas de revista de conceito mesmo, de peso. Acho que fui o primeiro a mostrar isso na televisão, então talvez eu tenha chocado no início.”

<p>Além de apresentar, Kléber é também diretor-geral de seus programas</p>
Além de apresentar, Kléber é também diretor-geral de seus programas
Foto: Fernando Borges / Terra

Desde sua estreia, em 2002, no finado Te Vi na TV, a premissa do Teste de Fidelidade é a mesma: no palco, o apresentador recebe um participante, homem ou mulher, com o intuito de assistir a um vídeo no qual o parceiro tem sua fidelidade colocada à prova por meio de provocações de um profissional, conhecido como o(a) sedutor(a). No início, os atores responsáveis pelo teste o faziam com o uso de perguntas indiscretas e sugestivas, não raramente em locais públicos. Foi exatamente nesta época que se popularizou o infame "para, para, para", bradado insistentemente pelo apresentador após cada uma das indagações dos atores contratados. Com o tempo, "o caminho natural para o Teste", como classifica Kléber, a principal tática passou a ser a sedução física, com corpos desnudos e amassos lambuzados em ambientes íntimos.

O apresentador garante que o site de inscrições do programa conta atualmente com 4 a 5 mil interessados em testar a fidelidade de seus parceiros, sendo que cada caso recebe atenção especial da produção, interessada em avaliar a veracidade de suas histórias e a convencer os infieis a expor seus tropeços na televisão. "Algumas relações ali já estão indo para o pinel e falta só um ponto para separar. Outras participantes entram falando que já sabem que o marido a traiu ou que uma amiga disse isso pra elas. Obviamente que a gente coloca umas sedutoras lindas para os testes porque a probabilidade de o cara trair é muito maior do que com uma pessoa comum. É um apelo", explica Kléber. “Mas a pessoa só entra realmente no palco com autorização. Eu já perdi testes no passado e recentemente [...] já aconteceu de o cara falar, 'não, não quero, e se puser (no ar) meto processo mesmo!' Ficamos desesperados, mas não colocamos."

Mas quem assiste ao Teste de Fidelidade dificilmente deixa escapar a impressão de que tudo soa extremamente artificial. E essa tem sido a principal crítica ao produto desde os seus primórdios. As vítimas de traição, por exemplo, costumam reagir às cenas de infidelidade do parceiro, acompanhadas em um VT, sempre com frieza e desinteresse. As ofensas desabafadas em meio à exibição das cenas -“safado; cachorro; vou te matar” - raramente são proferidas em tons condizentes à gravidade das situações. Da mesma forma, suas retaliações ao auditório, que comumente entoa gritos de "chifruda, chifruda”, ou mesmo a Kléber, que dança, provoca, corre pelos estúdios, são desinteressadas, sem fervor. Não raro, elas deixam escapar um sorriso em meio aos momentos de maior tensão.

Na fase atual, nem os seguranças que entram para supostamente evitar uma briga – ou uma tragédia - no palco se esforçam para convencer. Na verdade, os dois profissionais - um baixinho, sempre sorridente, assumidamente ator, e outro mais alto, um homem negro com proporções de um lutador de UFC - mais parecem saídos da trupe dos Três Patetas. Impossível levá-los a sério: escorregam no chão, correm de um lado para o outro, “brigam” para ver quem consegue se proteger atrás de quem da participante indignada. 

“Hoje o Teste tá mais para o humor”, defende-se Kléber. “Eu quis mostrar, principalmente no palco, situações mais engraçadas. As sedutoras atuais também ficam mais na conversa do que na sedução física. Pode notar. Mesmos que os caras tentem partir para cima, elas afastam daqui, afastam dali. Hoje o Teste tá mais, eu não diria light, mas tá mais próximo do formato que eu queria mesmo.”

<p>Apresentador é aposta da RedeTV! para alavancar audiência</p>
Apresentador é aposta da RedeTV! para alavancar audiência
Foto: Fernando Borges / Terra

Existem, no entanto, certas barreiras para o atual programa, desdobramentos dos processos que acabaram levando Kléber a Portugal, onde na época já apresentava a versão lusitana da atração, batizada no país de Fiel ou Infiel. A partir dali, a atração ficou proibida de colocar homens para testarem mulheres, decisão judicial que até hoje o apresentador tenta reverter. "Me senti tolhido, muito chateado com a situação. Imagina não ter a liberdade de fazer o meu trabalho no meu país e na Europa poder fazê-lo. Quer dizer, é um absurdo, né?", questiona, levemente incomodado, Kléber. Ele recorda a saída da RedeTV!, em 2005. "Tive que reformular o Teste de um dia para o outro. Como já estava em Portugal, e lá podia fazer (teste) de homem, mulher, de tudo, eu pensei, 'não vou mudar o formato agora, de última hora'. Fiz um acordo com a RedeTV! e resolvi mudar para lá de vez."

Kléber é enfático na defesa a seu principal produto. Mesmo dois fatos ocorridos recentemente, em abril - quando sua atração matinal teve a presença de uma mãe e uma filha que dias antes apareceram no SBT apresentando problemas diferentes de relacionamento – e em março - quando o Teste de Fidelidade recebeu um casal que também estivera no canal de Silvio Santos -, abalam a confiança no discurso. "Sim, mas é marido e mulher?", rebate. "Se você provar que eles não são marido e mulher ou que não são namorados de verdade, você me chama que eu processo eles", diz, enfático, batendo as mãos.

"Aí eu te pergunto, por que dá tanta audiência o Teste de Fidelidade? Então tem alguma coisa maluca, de ter audiência se é uma porcaria que não é verdade, né? O negócio é que tudo o que incomoda a audiência dos outros as pessoas arrumam um problema. Se não desse audiência ninguém falava nada, zero. Ninguém fala de cachorro morto. O Teste de Fidelidade foi sucesso no Brasil de 2002 até 2005, ficou na frente da Rede Globo, foi pra Europa como líder de audiência em todos os países em que foi exibido... Então todo mundo é maluco? Tá sendo enganado? O Brasil é enganado? Portugal é enganado? A Inglaterra é enganada? A Itália é enganada? A Rússia é enganada? A Romênia é enganada?", continua, um pouco mais exaltado. 

Foi justamente o enorme volume de críticas que levou Kléber a se tornar um sujeito mais maduro, menos preocupado com os ataques que sofre de parte do público e da imprensa especializada. Hoje, em suas entrevistas, opta por deixar um ponto de interrogação em relação à veracidade de seus programas. Cansou de discutir. Abraçou o humor. "Deixa falarem. Vou fazer o quê? Discutir com meio mundo? Eu faço entretenimento. Ponto. Acredita? Acredita. Não acredita? Não assiste. Faça o que quiser. Eu não vou pegar um mega-fone, subir no prédio mais alto de São Paulo e ficar falando", neste momento faz a voz de Paulo Maluf, imitação que tornou popular no início de sua carreira de humorista, "'olha, é verdade, é verdade!'". Ele sorri.

E volta a abraçar com vontade o personagem João Kléber, aquele que exalta diariamente sua transparência ao público: "se alguém dúvida, quer fazer o Teste? Eu faço. Quer testar o namorado, a mulher, contanto que não combine com a pessoa, é só fazer. Nós sabemos como fazer. E isso ninguém pode negar". Alguém se habilita?

Fonte: Terra
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